Há muito se fala da importância de a educação considerar interesses e preferências dos alunos, mas pouco tem sido feito a respeito em escolas públicas no Brasil. Afinal, o ideal é considerar o que cada um prefere só depois que todos dominarem bem o feijão com arroz. Certo? Não, errado!
O país não tem tempo para sequencialmente implantar primeiro a escola do século 19 e depois a dos seguintes. Temos que cumprir diferentes tarefas ao mesmo tempo, sob pena de ficarmos para trás. E, em tempos de Copa do Mundo, há uma história interessante a contar que ilustra essa possibilidade.
Sabe-se que nos esportes de resultados se soma à precariedade da educação outra triste realidade: os clubes descobrem cedo atletas com potencial e, em muitos casos, afastam-nos não da matrícula, já que teriam a seu encalce o Ministério Público, mas tornam a frequência escolar e os estudos algo secundário.
Roubam-lhes assim seus direitos de aprendizagem e mesmo as chances de futuro, já que boa parte deles não vai se tornar atleta de renome e, mesmo que isso ocorra, o seu tempo de atuação é limitado.
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No Rio de Janeiro, um caso ganhou certa notoriedade local. Uma diretora de escola ousou enfrentar um técnico e não liberar um atleta muito jovem para competir, já que ele era constantemente tirado das aulas para participar de treinos.
Os telejornais locais abordaram a pretensa falta de sensibilidade da gestora, o que me fez, como secretária municipal de Educação à época, entrar no circuito e colocar os direitos do jovem em perspectiva.
Foi pensando nessa situação que criamos, pouco mais tarde, no fundamental dois, o Ginásio Experimental Olímpico, para atender atletas ou jovens com grande potencial para os esportes, num modelo de ensino academicamente forte e, ao mesmo tempo, com cerca de três horas de prática desportiva por dia.
Na proposta, os conteúdos a serem trabalhados em sala de aula nas diversas disciplinas associavam-se a conhecimentos importantes para o futuro atleta, como fisiologia dos esportes em ciências ou textos sobre futebol ou natação em português.
Além disso, uma exigência para garantir o sucesso acadêmico dos alunos: embora não houvesse prova para entrar na escola (a não ser a de aptidão esportiva), para continuar o aluno precisava atingir no mínimo média seis nas provas bimestrais.
No final de apenas um ano de funcionamento, o resultado surpreendeu a todos: o Ginásio ficou entre as três melhores escolas da cidade no fundamental dois.
Hoje, já são quatro Ginásios Olímpicos espalhados pela cidade. Afinal, todos, inclusive os atletas, precisam de escolas de qualidade.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 22/06/2018