Uma das maiores ameaças à estabilidade da operação de seguro é a violência. Não a violência das forças naturais, mas a violência humana. Violência que, em grande escala, seria representada pelas guerras, pelos conflitos armados que se sucedem desde que o homem desceu das árvores e passou a vagar em duas pernas pelas savanas africanas, e que, em pequena escala, seria o crime passional, os acidentes de trânsito, a briga de botequim, a agressão contra a mulher, o racismo, a intolerância, o vandalismo, a pichação, etc.
Seguro existe para proteger a sociedade, através da proteção ao cidadão e às empresas. Essa proteção é precificada com base na maior ou menor incidência dos eventos que possam causar danos. Num exemplo extremado, a garantia para terremoto na cidade de São Paulo vai custar muito barato. Não há expectativa para a ocorrência de um terremoto. Seja pela composição do solo ou pela experiência passada, um terremoto na cidade é bastante improvável, portanto, o preço de um seguro para garantir o risco será baixo.
Todavia, essa situação muda completamente de figura quando se pensa num seguro de acidentes pessoais para um jovem de até 25 anos de idade, residente no Rio de Janeiro. Ao contrário do que seria a lógica, o risco é muito alto, portanto, o seguro teria que custar caro. Quando, anualmente, um país apresenta 62 mil assassinatos e 45 mil mortes em acidentes de trânsito, a precificação do seguro deve descer a detalhes que interferirão no preço das apólices, em função da necessidade de equilibrar o mútuo, tendo por base o risco individual.
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As estatísticas apontam que o índice de homicídios por cem mil habitantes é mais alto no Rio de Janeiro do que em São Paulo, verdade que se aplica também aos mortos em acidentes de trânsito. Consequentemente, nada mais coerente do que o seguro de acidentes pessoais para jovens de até 25 anos de idade custar mais caro no Rio de Janeiro do que em São Paulo.
Diferenciação. Não teria sentido um seguro obrigatório com a função social do DPVAT (o seguro obrigatório de veículos) ter diferenciação de preço em função do estado do veículo no emplacamento, mas, se observarmos os seus preços, veremos que o seguro para motos custa muito mais caro do que o seguro para automóveis particulares.
A razão para isso é justamente a necessidade de equilíbrio entre as entradas e saídas de recursos das seguradoras. A sinistralidade dos acidentes de moto representa perto de 70% do total das indenizações pagas pelo DPVAT. Não teria sentido os proprietários de automóveis subsidiarem o seguro das motocicletas.
Mas a violência vai muito além dos ataques à vida. E se somarmos os valores envolvidos, veremos que a soma dos outros danos decorrentes dela é maior do que o total das indenizações pagas a título de acidentes pessoais.
Qual o custo do vandalismo que se espalha pelo País? Quantos milhões de reais são queimados em ônibus incendiados? Qual o prejuízo com as pichações de muros? Com as escolas destruídas pelos alunos? Com a quebra deliberada de equipamentos indispensáveis ao funcionamento dos hospitais?
Quanto custam as queimadas decorrentes de bitucas de cigarro atiradas pelas janelas dos veículos? Quanto custam os incêndios deliberadamente ateados por gente que não pensa nas consequências? Quanto custam os danos causados pelos balões?
Ficando apenas no transporte rodoviário de cargas, no ano passado, os roubos de mercadorias embarcadas ultrapassaram a casa de um bilhão meio de reais. Qual foi o prejuízo real da sociedade brasileira com o roubo e furto de veículos? Quanto os produtores rurais perderam, vítimas de assaltos às fazendas? Qual o prejuízo do comércio com roubos e furtos de todos os tipos? Quantos brasileiros foram vítimas da ação de bandidos?
Você conhece alguém que não tenha uma história de violência direta ou muito próxima? Pois é, a realidade é pior. Apenas não elenquei porque está diariamente nos noticiários. Enquanto não se adotarem políticas sociais que vão muito além de colocar polícia na rua não tem solução, o quadro só vai piorar.
Fonte: “Estadão”, 16/07/2018