A informalidade no Brasil sempre foi muito elevada, fruto de um ambiente de negócios disfuncional. Depois de anos de aumento persistente, a informalidade no mercado de trabalho engatou uma trajetória de queda entre 2005 e meados de 2014, como resultado de ganhos de produtividade na economia e crescimento mais robusto.
Nos últimos anos, uma reversão de tendência. A informalidade atingiu 42% dos ocupados, somando os empregos sem carteira e empregadores/trabalhadores por conta própria sem CNPJ, ante 38% no pré-crise.
A elevação da informalidade é algo esperado na crise e no início da recuperação econômica. Afinal, incerteza elevada gera postura mais conservadora de empregadores e empreendedores. O que difere o momento atual é a duração do ciclo de alta. Já se vão 5 anos. Porém, isso não deveria ser surpresa, tendo em vista a própria natureza da crise econômica.
A recessão profunda e prolongada deixou sequelas. Primeiro, algo mais transitório: a frágil situação financeira de empresas e indivíduos limitou a capacidade de recuperação da economia, uma vez iniciado o ajuste da política econômica no governo anterior. Segundo, algo estrutural: o abalo na capacidade de crescimento do País, com a expressiva redução do investimento produtivo. Nesse quadro de fragilidade, é natural um aumento prolongado da informalidade.
Todos os setores da economia registram maior participação do emprego informal, ainda que com diferentes dinâmicas. Até mesmo a indústria, que é mais formalizada; não porque tenham aumentado as contratações sem carteira, mas porque houve expressiva demissão de trabalhadores com carteira (-18% entre 2014 e 3T2019), em um setor que encolhe. Fenômeno equivalente ocorreu na construção civil (-38%). O comércio, basicamente, trocou emprego formal pelo informal. Já serviços foi o setor que realmente puxou a informalidade para cima, respondendo por 77% do aumento das contratações sem carteira (+25% no emprego sem carteira e -2,3% no com carteira).
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Os serviços têm puxado a geração de vagas, apesar de sua produção estar 10% abaixo do patamar pré-crise. Isso significa queda de produtividade.
Duas perguntas surgem. Primeiro, haverá uma reversão em breve desse quadro, com a economia ganhando tração?
Como a informalidade não reflete apenas a cautela de empregadores (sendo que ainda há algum pessimismo entre empresários), mas também a baixa qualidade da mão de obra, que piorou com a crise prolongada, o cenário de informalidade elevada parece o mais provável, especialmente diante do baixo crescimento da indústria.
Pessoas desocupadas por muito tempo ficam obsoletas; o mesmo vale para jovens que não conseguem emprego na idade esperada. Isso implica trabalhadores pouco produtivos que enfrentarão dificuldades para conseguir emprego com carteira, este cada vez mais exigente e associado a tecnologias avançadas.
A segunda pergunta é o impacto da informalidade na produtividade das empresas e, portanto, no crescimento do País. A causalidade seria mais da baixa produtividade gerando informalidade do que o contrário. Empresas menos eficientes ou produtivas tendem a ser mais informais, pelo custo associado à formalização. É possível, porém, que a informalidade agrave o problema, pois o trabalhador sem carteira tem menor escolaridade e troca de emprego com maior frequência, o que dificulta seu aprendizado e treinamento.
Certamente, a informalidade precisa ser combatida com maior fiscalização. Quantos serviços utilizamos cotidianamente sem nos darmos conta da informalidade. Ela prejudica a arrecadação tributária e gera concorrência desleal. O fato é que o emprego sem carteira é a porta de saída do desemprego para muitos.
Não se pode perder de vista, pois, que não se trata apenas de combater os efeitos da informalidade, mas principalmente suas causas, mesmo que o benefício não seja para já.
Fonte: “O Estado de São Paulo”, 16/1/2020