Grandes contas a pagar esperam o novo governo francês e essa deve ser uma das primeiras preocupações do recém-eleito François Hollande. A economia francesa deve crescer 0,5% neste ano e 1% no próximo, segundo projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI). Para manter os livros em dia, o governo precisará do equivalente a 18,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2012. Será o indispensável para cobrir os vencimentos do ano e o buraco do orçamento. Para 2013, a necessidade estimada é de 19,5%. Hollande conquistou a presidência prometendo mais crescimento, menos arrocho e uma revisão do pacto fiscal assinado por 25 dos 27 governos da União Europeia. Falta explicar como vai cumprir as promessas e, naturalmente, convencer os credores. Para isso precisará de um entendimento com o governo alemão.
A primeira-ministra alemã, Angela Merkel, também enfrenta descontentamento e riscos eleitorais, mas seus problemas econômicos são muito menores. O crescimento previsto para este ano, 0,6%, é pouco maior que o projetado para a França, mas talvez seja preciso elevar a estimativa. A produção industrial cresceu 2,8% de fevereiro para março, descontados os fatores sazonais, e ficou 1,6% acima do nível de um ano antes. A fabricação de bens de consumo aumentou 3% no mês e a de bens de capital, 2%. A situação fiscal também é muito mais confortável. O Tesouro alemão precisará captar o equivalente a 8,9% do PIB em 2012 e 8,5% em 2013, se as projeções do FMI se confirmarem. Se a expansão econômica for maior, o acerto das contas será mais fácil.
A eleição francesa foi interpretada – e saudada por muitos – como o fim da era Merkozy e o provável começo de uma revisão das políticas da zona do euro. Pode ser, mas o governo alemão, apoiado numa economia bem mais saudável que a dos parceiros, poderá negociar duramente cada proposta de mudança. Por enquanto, a chanceler Angela Merkel descarta uma revisão do pacto fiscal e dos compromissos de curto prazo assumidos pelos governos mais dependentes de ajuda.
Se os critérios forem afrouxados – este foi o primeiro argumento -, os gregos vão cobrar uma revisão do acordo com a União Europeia, o Banco Central Europeu (BCE) e o FMI. Nesta terça-feira, no entanto, os gregos não dispunham sequer de um governo para cuidar da economia nem para conversar com os credores. Ao longo do dia, os mercados refletiram as preocupações com a indefinição política grega.
A Grécia, segundo havia dito na véspera um funcionário citado pela Dow Jones, tem dinheiro para se manter até julho. Mas não há nada tranquilizador nessa informação. O país deve receber neste mês pouco mais de 5 bilhões do segundo pacote de ajuda, mas quem vai assinar o papel? Dois dias depois da eleição parlamentar, ainda não havia uma resposta. A eleição havia desmontado um governo, mas sem arranjar um substituto e reforçando as dúvidas quanto à permanência do país na zona do euro.
A crise grega pode preocupar e reacender o temor de um ou mais calotes, mas François Hollande vai depender de si mesmo, e não de uma parceria com os gregos, para impor um novo padrão de ajuste à França e à zona do euro – porque não poderá desconhecer os compromissos do bloco. Infinitamente mais importante será um entendimento com o presidente do BCE, Mario Draghi, favorável à criação de um mercado comum para os títulos da zona do euro.
Analistas têm lembrado a longa relação de governos derrubados por eleitores descontentes com a austeridade, mas parecem esquecer um detalhe: nenhum novo governo anunciou uma reviravolta na política econômica. O atual governo português segue uma política tão dura quanto a defendida pelo antecessor. O espanhol reafirmou os compromissos de arrumação orçamentária e continua discutindo a reforma dos bancos. Pior que isso: nesta terça-feira os mercados ainda avaliavam a hipótese de uma ajuda oficial ao Bankia, terceiro maior grupo financeiro espanhol. Em resumo: todos os novos governantes se enquadraram. O de maior prestígio, o primeiro-ministro Mario Monti, da Itália, tem reforçado o discurso a favor de mais crescimento, mas sua primeira providência foi negociar um severo pacote de ajuste fiscal e de reformas.
Na prática, ninguém foi adiante da agenda proposta pelo FMI e reafirmada por sua diretora-gerente, Christine Lagarde, num discurso na segunda-feira: combinar um programa de ajuste de médio prazo, sério e confiável, com medidas para aceleração do crescimento. Isso é mais do que os alemães têm aceitado discutir, mas a influência do Fundo pode pesar nas decisões. Credibilidade continua sendo essencial, exceto se os governos se dispuserem a encarar o mercado e ver quem pisca primeiro. Será um espetáculo interessantíssimo.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 09/05/2012
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