Dezenovo de dezembro de 2018. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, cassa liminar concedida horas antes pelo também Ministro do STF Marco Aurélio de Mello que libertava presos em execução provisória da pena devido a confirmação de sua condenação em segunda instância. Com esta decisão, Toffoli mantém encarcerado o detento mais famoso do país, Luis Inácio Lula da Silva, e em poucas horas vira herói para boa parte da população brasileira nas redes sociais.
Dois de fevereiro de 2019. Às 3h45 da manhã, Dias Toffoli determina a nulidade da votação ocorrida na tarde de sexta-feira no Senado Federal e determina a ocorrência de votação secreta para a presidência da Câmara Alta do Congresso Nacional. De novo, mas agora em sentido oposto, em poucas horas Toffoli se torna o vilão nacional para boa parte da população brasileira nas redes sociais, fazendo com que até mesmo seu “impeachement” entre em pauta. Dois fatos jurídicos. Duas decisões onde a população tinha sentimentos opostos em relação aos resultados delas. Uma única fundamentação.
Em ambas as decisões, Toffoli se respaldou em um princípio básico no controle de constitucionalidade: o princípio da reserva de plenário. No caso da prisão em segunda instância [execução provisória da pena], foi o plenário do Supremo que decidiu pela constitucionalidade, e, apenas o plenário pode alterar esta decisão. Não cabe a um ministro, de forma monocrática, decidir o contrário, ainda mais em sede de “Habeas Corpus”.
No caso da votação para presidência do Senado, o Regimento Interno do Senado é uma resolução, proposta, votada em plenário, promulgada, e, publicada no Diário Oficial da União, portanto, lei para todos os fins. Mesmo que ela preveja a situação de modificações de ritos em seu corpo, esta deve ser obedecida rigidamente, em especial no que se refere a princípios constitucionais. Todavia, esta é uma regra interna do Senado (“interna corporis”), e, apenas o pleno do STF tem poderes de declarar a inconstitucionalidade de uma lei, mesmo uma resolução, isto porque a lei tem presunção de constitucionalidade. E, o art. 1º de nossa Constituição consagra o princípio da separação de Poderes, logo, andou bem o presidente do STF em sua decisão.
Preservar o princípio da reserva de plenário é de fundamental importância, pois preserva a segurança jurídica do país. Isso garante que não surja um parlamentar e decida legislar sozinho em matérias essenciais, pois estas devem passar pelo plenário de ambas as casas do Congresso Nacional. Da mesma forma, no STF. Evita que ministros decidam mudar sozinhos a jurisprudência da Casa.
Já no que se refere a população, temos que entender que as instituições importam, e, que elas não devem fazer apenas o que nos agrada. Tenho visto gente preparada chamando de golpe tudo que contraria suas ideias e de lindo tudo que lhes apoia. Felizmente, o Estado de Direito não funciona desta forma. Como disse, a população deve compreender que instituições não são boas apenas quando fazem o que você quer. Políticos devem entender que são transitórios, as instituições não.
A Presidência da República é maior que seu ocupante, o Congresso é maior que seus membros, e, o STF é maior que seus ministros. Eles estão nos cargos, não são os cargos. Existem vários Presidentes da República lembrados até hoje por boas razões, vários parlamentares lembrados por bons motivos e vários ministros históricos do STF. Tornaram-se imortais pelas suas obras, pelos seus feitos. Os ocupantes de hoje desejam ser lembrados pelo que? Devem lembrar que são servidores públicos e como tal devem servir ao público e não se servir do público. Apenas quando compreendermos a importância da estabilidade das instituições é que podemos esperar que nosso país se torne grande de fato. Até lá, infelizmente, temo que fique mais como esperança mesmo.