Vai jorrar petróleo no Brasil, mas os brasileiros continuarão pagando caro pela gasolina. Foi o que disse o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, em depoimento no Congresso.
Até faz sentido. O petróleo do pré-sal vai sair caro, exige pesados investimentos, de modo que a Petrobrás e as demais companhias envolvidas no processo precisarão ser bem remuneradas. Mas o ministro usou outro argumento. Disse que a gasolina é até barata na refinaria. O que a torna mais cara, na bomba, são os impostos. Também é verdade, mas a história passa a ser outra.
Os impostos não remuneram nem a Petrobrás nem as outras companhias envolvidas na produção e distribuição de combustíveis. Portanto, uma redução de impostos não afetaria a rentabilidade do negócio petróleo. Logo, pode-se reduzir? Não, porque o governo precisa da arrecadação para financiar seus gastos. Como lembrou o ministro.
Mas cabe uma outra abordagem: se as pessoas pagarem menos pelo combustível que colocam nos seus carros, terão mais dinheiro para poupança e outros tipos de consumo. Ou, ainda, poderão consumir mais combustível, o que seria bom para as produtoras e distribuidoras.
Além disso, as pessoas comprarão mais carros, o que é excelente para uma importante indústria – tão importante que mereceu tratamento especialmente favorecido do governo nesta crise.
Também as empresas, gastando menos com o combustível no transporte de seus insumos e suas mercadorias, serão mais eficientes, mais produtivas e poderão, por exemplo, gerar mais empregos.
Assim, o que é melhor para o País, mandar mais dinheiro para o governo ou deixar com as pessoas e empresas?
É verdade que combustível barato estimula o uso de veículos, multiplica o tráfego e, pois, causa congestionamentos e poluição. O ministro também lembrou isso, mas aí é outra questão. A sociedade brasileira, por razões ambientais, pode perfeitamente tomar a decisão de restringir o uso de derivados de petróleo e forçar uma mudança para combustíveis alternativos. Como estes são mais caros, o instrumento dessa política é aumentar impostos sobre os derivados de petróleo, com dois objetivos: desestimular o uso e juntar recursos para financiar a introdução de novos combustíveis.
Mas, se esse é o caminho – e muita gente acha que é -, lança-se uma enorme dúvida sobre as riqueza do pré-sal. Como disse o ex-ministro Delfim Netto, citado na coluna de Cláudia Safatle, no Valor Econômico de sexta-feira (11): “Obama tem um único objetivo por trás de tudo: reconquistar a autonomia energética dos Estados Unidos. Eles vão fazer uma nova revolução industrial com novas fontes de energia. Alguém disse que a Idade da Pedra não acabou por falta de pedra. A Idade do Petróleo também não vai acabar por falta de petróleo.”
Muita gente ainda acha que, por muitas décadas, nada substituirá o óleo. Mas também é verdade que no mundo todo se gasta muito dinheiro na pesquisa e no desenvolvimento de novas fontes de energia. Conhecendo a capacidade das tecnologias atuais…
O governo Lula pensou nisso? Aparentemente, não. Foi, por exemplo, um pedido de última hora do ministro Carlos Minc que acrescentou o meio ambiente entre as finalidades de gasto dos recursos do fundo a ser formado com o dinheiro do pré-sal. Também a oposição não falou nada disso. Estão todos disputando um dinheiro que está bem enterrado.
Uma grande indústria – Mas o governo não quer apenas retirar e exportar petróleo. Pretende criar uma grande indústria nacional em torno desse negócio, o que inclui desde a produção, aqui, de navios e sondas até a instalação de novas refinarias e petroquímicas. Ou seja, uma completa indústria naval, de equipamentos e de produção de óleo e derivados.
Essa indústria já existe, em países como Japão, Cingapura, Coreia do Sul, Taiwan, China, etc. Agora, produzir aqui é mais complicado. Os fabricantes pagam muito mais impostos e têm acesso limitado a financiamentos, pelos quais ainda pagam juros mais altos. Acrescente-se a isso o resto do custo Brasil – burocracias, custos trabalhistas, dificuldades na obtenção das licenças ambientais, insegurança jurídica. Feito esse diagnóstico, com o qual todos concordam, faz-se o quê?
Membros importantes da administração Lula têm dito que o governo vai mobilizar seu arsenal de recursos para apoiar a formação dessa nova indústria nacional. Apoiar como?
Dando a ela um tratamento fiscal especial – ou seja, redução da carga tributária para companhias selecionadas pelo governo -, financiamento pelos bancos públicos, a juros subsidiados, e mercado cativo e fechado só para elas, sem competição.
Já se fez isso no passado, deu errado, de modo que se conhecem os riscos.
Primeiro, custa muito dinheiro. Se para a exploração do pré-sal já se fala em mais de R$ 100 bilhões só para começar, quanto mais seria necessário para financiar a instalação de toda uma indústria nacional?
Segundo, não havendo esse dinheiro aqui, será preciso tomar emprestado lá fora. Isso vai aumentar o endividamento e desequilibrar as contas externas.
Terceiro, será menos eficiente e mais caro produzir aqui – mesmo dando tudo certo -, de modo que será preciso cobrar caro pelo produto final, os combustíveis.
Quarto, será demorado. Ou seja, a produção do óleo do pré-sal terá de se adequar ao tempo de instalação dessa nova indústria de apoio. Vai para quando? Para quando os EUA tiverem descoberto as novas fontes?
Quinto, vai ser uma enorme expansão do gasto público, o que exigirá mais impostos para todo mundo, menos para os escolhidos do governo.
Há outros caminhos? É o nosso próximo tema.
(O Estado de S. Paulo – 14/09/2009)
Sardenberg: Até onde vai a Idade do Petróleo? http://bit.ly/12YT9i