22 de fevereiro de 2010, fim do horário de verão. Como não tinha nenhuma garantia de que estaria acordado à meia-noite, atrasei meus relógios antes.
Este ano, temos uma novidade: talvez tenhamos que atrasar nossos calendários, ainda não sabemos em quantos anos. O Congresso Nacional do PT oficializou a pré-candidatura de Ministra Dilma Rousseff à Presidência. Até agora não se sabia o que a ministra pensava. Ela era famosa como burocrata.
Agora está falando e não soa tranquilizador: mais estado, estado empresário. Toda a poeira que estávamos sacudindo desde 1993, parece que subiu e grudou toda de novo.
Os principais pontos programáticos do PT anunciados durante o Congresso não são nada animadores. Todos significam mais poder para o estado, às custas da liberdade de ação dos indivíduos. Glorificam a chamada “sociedade civil organizada,” que ignora a “sociedade civil desorganizada”: todos aqueles que não queremos submeter-nos a algum grupo renunciando a, pelo menos, algumas de nossas crenças, em nome de “posições coletivas” que invariavelmente sacrificam valores individuais.
O problema é mais complicado ainda porque o Presidente Lula introduziu uma cacofonia no discurso ao afirmar que o fato de o PT incluir estes temas estatizantes e autoritários em seu programa não significa que eles serão implementados.
Estamos todos confusos. Afinal, vale o que diz o Presidente ou vale o que diz a militância do partido que quer se perpetuar no poder? Ao levar ambos os discursos a sério, estamos naquele momento que precede os concertos sinfônicos, quando os músicos afinam seus instrumentos e quem está na platéia ouve um sem número de sons que não fazem parte de nenhuma partitura. São apenas sons que os músicos produzem para terem certeza de que seus instrumentos estarão afinados na hora da sinfonia.
O pior da história é que com o programa do PT e no meio desta cacofonia poderemos ter uma Sinfonia da Liberdade ou uma Sinfonia do Autoritarismo. Qual das duas prevalecerá?
Parece que a militância foi obrigada a engolir os compromissos liberais de Lula em política econômica em 2002, na falta de melhor alternativa, mas, fiel à crença esquerdista de que a história estava a seu favor, resolveu esperar e botar as manguinhas de fora oito anos depois.
Estamos entrando no mato sem cachorro. A cidadania (entendida aqui como o conjunto de cidadãos) caminha gostando da liberdade, saboreando o consumo (que é ótimo — se não fosse, não adeririam tantas pessoas a ele), a estabilidade econômica, o crédito fácil e aquilo que sempre quisemos: não impedir que a nobreza tivesse meias de seda, mas podermos todos ter acesso a elas.
O partido que agora parece mais forte para a próxima eleição marcha em direção contrária a tudo isso, na direção de crescimento da burocracia, centralização do poder e menos meias de seda para todos.
O pior: a oposição sem lenço, nem documento, nem programa, nem candidato.
Não é fácil fazer campanha contra o governo de Lula. A maior parte das pessoas não quer mudanças porque, afinal de contas, todos estão melhores do que estavam há 7 anos. Se está bom querem continuar, e que seja melhor ainda.
Não sabemos o que vai acontecer.
A única candidata diz pouco e o que diz soa ruim. E ninguém consegue dizer nada diferente. A oposição está muda de tanto ouvir.
Eu tinha dez anos quando se discutia se o petróleo era nosso ou era deles. Pensei que estivesse livre de ver esse filme de novo.
Já atrasei meu relógio. Espero não ter que atrasar meu calendário, mas não sei como farei isso. Você, leitor, sabe? Se souber me avise. Preciso de ajuda.
(Publicado em “OrdemLivre.org”)
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