Socialistas e liberais querem a abolição da pobreza. Diferem dos métodos. Como nenhum país socialista até hoje enriqueceu, e vários capitalistas o fizeram, o balanço da história é favorável à economia de mercado. E esta não é senão o liberalismo aplicado no domínio econômico, da mesma forma que a democracia é o liberalismo aplicado no terreno político. Roberto Campos, 1993.
INTRODUÇÃO
As próximas poucas linhas e muitas imagens são uma tentativas de organizar numa unidade racionalmente coerente algumas impressões que venho acumulando durante os últimos anos e que tem crescido nas últimas semanas.
A pergunta básica é: quais dimensões econômicas e demográficas podem fazer-nos entender as eleições plebiscitárias que teremos no dia 07/10/2018 e, quem sabe, no final do mesmo mês ?
Haverá mais imagens do que textos. Isso é proposital, pois, creio, as imagens falam per si para quem as ouve, o que não deixa de ser uma divertida contradição.
Este texto será complementado por outro que publicarei após os resultados finais do pleito serem divulgados. Nele tentarei evidenciar uma determinada trajetória histórica baseada nas dimensões apresentadas aqui. Em frente.
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1- QUE PAÍS É ESSE ?
A figura 1 mostra que a maior parte de nossa população ainda localiza-se na região litorânea. A maior concentração está no sudeste e sul. Tais fatos são banais, o que faz com que suas implicações sejam muitas vezes secundarizadas.
Na Figura 2 é possível também perceber um movimento de interiorização que segue o processo de expansão da moderna indústria de produção de mercadorias de origem vegetal e animal (usarei este termo, pois agronegócio ou agrobusiness são palavras que não evidenciam o fato de tratar-se de indústria intensiva em conhecimento e tecnologia).
A tabela 1 apresenta uma fotografia (descrição) de diversas dimensões fundamentais de nossa sociedade. Dimensões estas que possibilitam inferências demográficas e econômicas importantíssimas. Um olhar atento a estas informações permite conhecer melhor a distribuição de nossa população em termos de sexo, urbanização, inserção na economia e o perfil etário.
Combinado com nossa fotografia apresentada acima, é importante evidenciar o fenômeno da Transição Demográfica de nossa população, apresentado na Gravura 1, abaixo. Este fenômeno é fundamental pois indica não apenas que estamos envelhecendo E tendo menos filhos. A nos permite ter mais pessoas com mais conhecimentos e experiências, mas também traz problemas, tais como aumento de custo da manutenção da saúde, pois doenças crônicas e degenerativas possuem prevenção e tratamento mais caros do que as agudas. Também possui impacto na economia e no atual sistema previdenciário público brasileiro, cujo modelo é de pirâmide financeira intergeracional, por exemplo. Interessante reparar que a maioria dos candidatos à chefia do poder executivo federal não toca em temas que envolvam demografia, como a Reforma da Previdência.
A figura 3 mostra o Produto Interno Bruto dos municípios brasileiros em 2015. Evidencia-se que, de fato, a economia real brasileira ocorre em menos de 800 municípios. Sendo que o peso da estrutura administrativa do governo federal possui peso significativo, pois o pagamento de salários e benefícios a servidores públicos coloca o Distrito Federal entre os SETE municípios que produziram 25% do PIB brasileiro no ano levantado. Lembremos que governos nada produzem além de regras e constrangimentos.
Setenta e cinco por cento (75%) do PIB é produzido na região centro-sul do Brasil, a mais industrializada e com infraestrutura menos pior do que as demais regiões. Ao todo, 3/4 de nossa produção ocorre em apenas 353 municípios (temos 5.570). Estes, de fato, trabalham para financiar os demais e a União. Isto é apenas mais uma prova de que nossa “federação”, na verdade, inexiste.
Saber onde bens e serviços são produzidos é fundamental – na opinião deste que escreve estas palavras – para entender o que vem ocorrendo com o Brasil desde a estabilização monetária conseguida nos anos 1990. Estabilização esta que permitiu uma certa “normalização” da dinâmica de nossa sociedade em relação aos demais países que possuem moedas fortes e governos não-populistas.
2 – E AS ATUAIS PREFERÊNCIAS ELEITORAIS DOS BRASILEIROS, QUAIS CONEXÕES HÁ COM O EXPOSTO ?
Com tudo isso, temos uma panorâmica do que é o Brasil. Onde é gerada a riqueza, por quem é gerada em termos de sexo e idade, etc. Vejamos o que o IBOPE nos mostra sobre os votos dos três principais concorrentes à chefia do poder executivo federal.
Os dados apresentados em todos gráficos desta seção correspondem à pesquisa divulgada na última semana de Setembro de 2018 (imagem à esquerda) e àquela apresentada em 01/10/2018 (imagem à direita).
A pesquisa da última semana de Setembro demonstrou que os brasileiros estamos pessimistas em relação ao futuro do país: 49% dizem-se pessimistas ou muito pessimistas. Das 1.319 mulheres entrevistas, 51% está pessimista ou muito pessimista; dos 1.187 homens, 48% estão pessimistas ou muito pessimistas.
Pessimismo construído pela trajetória histórica que vivenciamos até aqui. Mudar a trajetória é o desejo, mas as pessoas se sentem impotentes ou creem ser impotente o sistema político para comandar as mudanças necessárias.
O Gráfico 1 apresenta a distribuição das pretensões de votos por grandes regiões. O IBOPE agregou as regiões Norte e Centro-Oeste, apesar das enormes diferenças sociais, ambientais e econômicas entre elas. A distribuição demonstra a força que as oligarquias possuem no Nordeste, bem como as preferências das pessoas que habitam as regiões economicamente mais modernas.
O Gráfico 2 apresenta a distribuição de votos por faixa etária. Observa-se que o candidato Bolsonaro lidera as intenções de voto naquelas faixas etárias que concentram a maior parte da força de trabalho (População Economicamente Ativa – PEA), com preponderância das pessoas entre 25 e 44 anos.
O Gráfico 3 demonstra que o candidato Bolsonaro lidera as pretensões de voto entre as pessoas que possuem segundo ou terceiro grau. O candidato Haddad lidera entre as que possuem menor escolaridade. Do ponto-de-vista econômico, quão maior a escolaridade, maior produtividade, maior capacidade de manuseio ou criação de técnicas e tecnologias. A contradição aparente é que a quantidade de pessoas com escolarização de nível superior aumentou nos últimos 15 anos.
O Gráfico 4 apresenta a distribuição das pretensões de votos de acordo com o sexo. Neste recorte vê-se que, apesar da mobilização da comunidade feminista e da comunidade LGBT, o candidato Bolsonaro é destinatário da maioria das preferências das mulheres, o que pode ser entendido tendo como referência as mudanças demográficas e do papel econômico da mulher na sociedade brasileira concreta (ver Tabela 1).
3 – CONCLUSÃO DO EXERCÍCIO
Os dados apresentados pelas pesquisas do IBOPE, apesar do grande grau de agregação territorial, permite-nos pensar que há uma relação direta entre as preferências eleitorais e o contexto econômico concreto das regiões. No contexto econômico incluem-se as variáveis PIB (figura 3) e perfis demográfico e de escolarização.
Creio que os resultados finais das eleições deste ano seguirão o padrão apresentado na Figura 4, que apresenta a distribuição municipal de votos da eleição presidencial de 2014. A cor azul representa os votos obtidos pela candidatura de Aécio Neves e a cor vermelha representa os votos obtidos por Dilma Rousseff.
Parece que as escolhas políticas presidenciais têm tido uma preponderância relacionada à combinação de três dimensões: território, renda e escolarização; todas relacionadas, direta ou indiretamente, à produtividade ou regras diferenciadas de emprego (no DF, principalmente).
Creio que antes de um embate entre “ricos e pobres”, entre “liberais de costumes e conservadores de costumes” o que estamos (vi)vendo é o ápice eleitoral de um embate entre a economia do início do século XX e a economia do século XXI. A primeira baseando-se nas tradições mercantilistas ou oligárquicas, em monopólios ou oligopólios criados ou mantidos pelo Estado. A segunda fundada na inovação, nas TICs, no conhecimento (escolarização), exigindo menos Estado, menos impostos, menos burocracia e mais liberdade de ação (em particular as micro, pequenas e médias empresas).
Infelizmente, o político profissional está liderando as pesquisas e que ocupou este papel tipicamente liberal (ou liberista) segue aquele padrão do autoritarismo da burocracia latino-americana, combinado com uma retórica populista conservadora.
O processo de disputa entre o velho e o novo, entre os que querem mais direitos e os que querem mais provisões; entre um certo reacionarismo (ficar no início do século XX, com seu corporativismo) e a liberdade de um seguir em frente em busca de uma vida melhor (fundado na escolarização com boa base linguística e matemática), não se concluirá neste pleito de 2018. Hoje talvez vivamos o início de seu ápice.
Este é um processo econômico e social sem volta. É bom e ruim viver nestes tempos de mudança de padrões. Espero que o tensionamento político de hoje leve-nos a um novo equilíbrio dinâmico baseado numa visão de longo prazo que tenha como fundamento as liberdades individual, econômica e política, ou seja, numa sociedade mais madura e ativa, mais civilizada. Não será trivial chegarmos neste novo ponto de nossa trajetória.
Fonte: “Blog do Daniel Alvão”, 04/10/2018
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