O que aconteceu em Honduras ao longo das últimas semanas tem nada de novo. Crises institucionais nas nações ibero-americanas seguem roteiro seboso, redigido em pergaminho. Contabilizam mortos, feridos e constituições inservíveis. Por quê? Com mínimas diferenças, nossos países adotam um sistema anacrônico em que o presidente comanda o Estado, o governo, a administração e 20% do PIB. É poder e grana demais para que os filhos de Adão não se atraquem – eis por quê. Quem senta na cadeira presidencial mete a faixa no peito e trata de passar o cadeado.
Nossos generais tinham cinco anos e Geisel aumentou para seis. Sarney herdou esses seis anos. A Constituinte ia cortar para quatro, mas no balcão do toma lá dá cá fechou por cinco. A revisão de 1993 retornou aos quatro. Fernando Henrique conseguiu a emenda da reeleição para fazer oito. Lula era contra, mas gostou e foi buscar os seus. Agora, no Congresso, tramita projeto que lhe permite voltar às urnas. Da janela para fora, ele discursa em favor das pretensões continuístas de seus companheiros e vizinhos do Foro de São Paulo. Quando se vira para dentro de casa, muda o tom e alega que isso não fica bem. Chávez alterou a constituição para assegurar-se um número ilimitado de reeleições. Rafael Correa, idem. Evo Morales já tentou mudar a regra boliviana. Não levou, mas continua querendo. Kirchner, impedido, passou a faixa para a patroa. E as questões mais verticais do Estado argentino são tratadas na horizontal. Até o colombiano Álvaro Uribe foi picado pela mosca azul.
Honduras? O constituinte hondurenho, escaldado, fechou essa porta. Criou uma norma estabelecendo que quem foi presidente “nunca poderá candidatar-se a novo mandato”. Achou pouco. Foi na jugular do continuísmo e estampou no artigo 239 da Carta que quem “quebrar esse preceito ou propuser sua reforma, bem como aqueles que o apoiem direta ou indiretamente, cessarão de imediato no desempenho dos respectivos cargos e ficarão inabilitados por dez anos para exercício de toda função pública”. E quem incorreu nisso? O próprio presidente Mel Zelaya. Enforcou-se com a corda constitucional. Não satisfeito, fez mais. Inspirado por Chávez, convocou plebiscito para reformar a Constituição (coisa que só o Parlamento poderia fazer). E quando a Suprema Corte lhe mostrou a Carta hondurenha, subiu no palanque e chutou o balde: – “Nós não vamos obedecer ao Supremo Tribunal!”. Mandou vir urnas e cédulas daquele perito em plebiscitos viciados, o companheiro Chávez. Destituiu o chefe do Estado Maior que lhe recusava as tropas para realizar a votação. E acordou preso, o golpista. Mas sua deposição, com apoio dos outros dois poderes também não foi um golpe? Sei lá! Desate esse embrulho quem souber. Mas assim como a democracia exige a existência de democratas, o Estado de Direito exige o respeito às leis. Que fazer quando o presidente não as cumpre?
O que a mim importa é que entre golpes e contragolpes ainda se sovam bananadas neste pobre continente e que 200 anos não bastaram para nos levar a um sistema que os evite. Então, eles persistem em toda parte, ora contra o Estado Democrático (busca não republicana de sucessivas reeleições), ora contra o Estado de Direito (atropelos aos ordenamentos constitucionais).
Existem sistemas que ajudam a resolver crises. Nós nos embananamos num que as excita. O hondurenho golpista deposto é o 15º presidente que, nos últimos 16 anos, em pleno período de “redemocratização” continental, não conclui seu mandato.
Existem sistemas que ajudam a resolver crises. Nós nos embananamos num que as excita
(Zero Hora – 19/07/2009)
Realmente, nosso sistema político latino-americano é uma verdadeira bananada, com recheio de marmelada elitista…mas quem mandou nós não seguirmos o modelo dos Estados Unidos da América? Ou será que seguimos?
Particularmente, no Brasil, cometemos nosso primeiro erro na ocasião da nossa Independência (1822), em que nossa elite preferiu continuar com o regime monárquico, seguindo o padrão da metrópole, herdando todos os “toma lá, dá cá” reais (um pequeno parêntesis: quem foi que derramou sangue por nossa independência? ah, as libras esterlinas, sei)…Na ruptura para a república (1889), nossa elite teve a chance de se redimir, mas acabou incorrendo no segundo erro, ao instalar os “Estados Unidos do Brasil”, mudando a penas a casca, mas contendo as mesmas bananas beneplácidas do regime anterior…(outro breve parêntesis: quem morreu por nossa república? ah, milhares de escravos no chaco paraguaio, sei)
Por medo do comunismo, cujos membros comiam e ainda comem criancinhas fêmeas de 15 anos pra lá, fomos agraciados com o apoio efetivo do irmão impoluto estadunidense num golpe de estado que durou 20 anos, mas, outra vez, nossa elite (sempre ela) resolveu continuar com o sistema vigente, mudando o poder apenas de mão…tudo em nome da Família, Tradição e Propriedade…(outro parentesinho: neste caso, morreram muitos..não sabemos ao certo quantos, pois ainda há desaparecidos)…
Ausente o perigo vermelho, veio a redemocratização, onde a elite (????) mais uma vez decidiu, por meio do Centrão, nosso sistema político, institucionalizando o “toma lá, dá cá”…nossa mazela eterna…
Não satisfeito, nosso guru supremo da intelectualidade bananeira, garboso como ele é, usou mais uma vez do “toma lá, dá cá”, e conseguiu uma famigerada emenda da reeleição, já que ele era o cara, tinha que continuar…e fez continuar as benesses da elite branca e de olhos azuis: Bancos Marka, Fontcindam, Salvatore Cacciola, Fundos de pensão, Daniel Dantas, etc, etc, etc…(graças a Deus, aqui não morreu ninguém…só alguns miseráveis que morrem de fome por causa do capitalismo selvagem, e alguns outros na violência das grandes cidades, só)
E assim caminhamos nós, sofrido povo brasileiro, mantendo as benesses dessa elite podre, mesquinha e nojenta…e branca, de lindos e sensuais olhos azuis…
Mas a verdade é uma só: o Estado foi concebido apenas e tão-somente para obter e manter os privilégios da elite que o fundou. E encontraram na democracia sua melhor forma de legitimar esses privilégios, ao contar com o inquestionável e irretratável consentimento popular.
Se qualquer governo democrático, fizer uma opção pelos pobres, ele será irremediavelmente banido do sistema pela elite local. Não há escapatória.
Foi o que Zelayla tentou fazer em Honduras, ao aumentar o salário-mínimo em 60%. Este é o motivo do golpe. O plebiscito foi apenas o pretexto. E todo o planejamento foi urdido nos refrigerados gabinetes da nossa pátria-mãe: EUA, pelos elíticos empresários locais e americanos, altamente empreendedores…
A opção pelos pobres (maioria) é o que intercessiona o Chavez, Rafael Correa, Evo Morales, Kirschner, Lugo e Lula, todos eles odiados pelas respectivas elites locais.
Lula ainda não caiu porque não restringiu os privilégios dessa elite faceira, apenas está tentando estender um pouco desses privilégios (míseros) aos pobres. O Chavez já caiu, mas se levantou…o Evo quase caiu…o Rafael está sob pressão, e o Lugo, sob pensão (hehehe)…a Kirschner já rebolou pra não cair…
Engraçado que o Álvaro Uribe é bem quisto e até defendido, pelas elites locais e vizinhas, mesmo desejando a reeleição…por que será?
Mas, e o nosso sistema político, não é igual ou, pelo menos, semelhantíssimo ao dos EUA? E por que lá funciona e aqui não? Sabe-se lá Deus porque…
Mas é isso…o eterno jogo do poder: da ELITE, pela ELITE epara a ELITE. Eis o que significa DEMOCRACIA.