Ex-presidente do Banco Central, Arminio Fraga avaliou que a aprovação de mandato duplo para o BC é perigoso e poderia transmitir a ilusão de que a instituição possui alguma mágica para o País crescer. Em entrevista ao “Estadão/Broadcast”, Arminio sugeriu a alternativa de incluir no projeto de lei de autonomia a preocupação com o ciclo econômico.
“O BC deve ter um mandato claro de estabilidade de preços, mas poderia também eventualmente colocar em lei o que ele já faz, que é a preocupação em suavizar o ciclo econômico”, disse ele. A proposta de autonomia do BC integra a agenda de projetos prioritários, lançada pelo governo após a retirada da reforma da Previdência da pauta de votação. O autor do projeto, senador Romero Jucá (MDB-RR), já antecipou que vai propor duplo mandato: um olho na inflação e outro no crescimento com geração de empregos.
A sugestão de Arminio vai ao encontro à proposta do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. “Acho que a redação (do projeto) tem que ser cuidadosa para evitar uma judicialização. Por exemplo, o BC toma uma decisão e alguém contesta na Justiça dizendo que o BC não obedeceu o segundo mandato, do emprego. Então, precisamos deixar muito claro que há precedência de combater a inflação”, afirmou Meirelles ao “Estadão/Broadcast”.
Segundo Arminio, o BC brasileiro e outros no mundo inteiro procuram suavizar o ciclo econômico na condução da política de juros, mas não têm uma varinha mágica para o crescimento. “O que os BCs têm é um poder de destruição tremendo de atrapalhar (o crescimento). O melhor que eles podem fazer é suavizar o ciclo.”
Pauta. Sócio da Gávea Investimento, Arminio Fraga disse que seria um grande avanço a aprovação do mandato e destacou que é ótimo que o projeto tenha entrado na pauta do Congresso. Ele ponderou que o foco mesmo da discussão deve ficar em torno dos objetivos do BC e não da definição de mandatos para o presidente e diretores. “A parte de mandato é clássica, é da essência da independência”, disse.
Na sua avaliação, o duplo mandato do Fed, o banco central dos Estados Unidos, é um “acidente” histórico. “As pessoas que passaram por lá fazem malabarismos verbais para se encaixar nisso. Mas ninguém acredita que o BC possa ajudar no crescimento. Salvo o que ele já faz para preservar a estabilidade”, explicou.
Arminio ressaltou que o crescimento depende de educação, investimento e de produtividade. “Isso é que faz a economia crescer e a nossa história de abuso do Banco Central mostra claramente que não é por aí. Nós, em particular, sabemos mais isso do que qualquer outro País”, disse.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”