Por Henrique Meirelles.
O ministro da Economia argentino fez em Nova York a declaração inusitada de que seu país está à beira do abismo. Não foi, porém, uma crítica à política econômica argentina, mas uma estratégia, até aqui sem sucesso, para influenciar a Justiça dos EUA a liberar o país da obrigação de pagamento integral a credores que não aceitaram o acordo de reestruturação da dívida assinado há alguns anos.
O tribunal americano determinou o pagamento do valor integral da dívida a um grande credor que acionou a Justiça dos EUA, decisão que pode se estender a credores que aceitaram a reestruturação com desconto expressivo.
O drama argentino é mais um exemplo acabado do que políticas intervencionistas e estatizantes provocam na economia. São medidas que podem parecer positivas no curto prazo, mas ao longo do tempo revelam-se desastrosas, como apontou o próprio ministro argentino.
Essas dinâmicas econômicas se manifestam em diferentes intensidades em todas as regiões do mundo, a Argentina é só um caso extremado.
A Europa oferece comparativos interessantes. A Alemanha, que sempre manteve austeridade fiscal e monetária, atravessou de maneira serena a crise e lidera a recuperação do continente. A Espanha, que adotou austeridade após crise profunda, dá sinais de recuperação. No Reino Unido, o desemprego recua e a economia ganha força sob um governo conservador eleito pregando austeridade e que tem feito duros ajustes. Já a França -e até certo ponto a Itália-, que ficou no meio termo entre a produtividade/austeridade alemã e a prodigalidade pré-crise do sul da Europa, não consegue crescer e volta a flertar com estímulos fiscais que causaram os problemas enfrentados hoje.
É preciso notar como certas visões de políticas econômicas não se deixam alterar pelos fatos, vistos como meros aborrecimentos no meio do caminho. Nesses casos, ideias preconcebidas de que um Estado pródigo e interventor é o melhor condutor do crescimento predominam sobre resultados concretos e a experiência histórica.
A crise argentina é clássica na medida em que o governo interveio diretamente na economia, procurando ditar o comportamento de empresas e consumidores. A experiência histórica mostra que finanças públicas desequilibradas, incerteza regulatória e distorções nos sistemas de preços criadas pelo governo são os maiores causadores de baixa produtividade, decadência econômica e crises.
O exemplo da nação vizinha deve servir como eloquente prevenção contra a tentação da excessiva intervenção do governo no funcionamento da economia. Aprofundar medidas equivocadas para resolver problemas só aumenta aqueles que se quer resolver.
Fonte: Folha de S.Paulo, 29/06/2014.
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