Moeda, ativo, meio de pagamento ou reserva de valor? O bitcoin consegue ser tudo isso – e também pode evoluir para algo diferente. A conclusão dos especialistas presentes no evento “O Valor da Criptomoeda”, organizado pelo “Valor”, em São Paulo, oferece um vislumbre da dificuldade de se enquadrar esses produtos virtuais em algum arcabouço regulatório já existente.
Segundo Oliver Cunningham, integrante do comitê de inovação aberta da KPMG, no momento, as pessoas têm se interessado, basicamente, pelo bitcoin como forma de investimento. De acordo com o especialista, no Brasil já há 1 milhão de pessoas que compram e vendem bitcoins, segundo dados das corretoras de criptomoedas, contra 600 mil indivíduos cadastrados na B3, a bolsa de valores do país.
Veja também:
Marcos Cintra: A ameaça das criptomoedas
Monica de Bolle: O que é moeda?
Terraço Econômico: CFA está certo: criptomoedas estão aí para ficar
Na visão de Diego Velasques, CEO da corretora e plataforma de negociação de criptomoedas e-Juno, que também participou do evento, o perfil e as características do ativo têm grande apelo para a geração de investidores mais jovens. “A maioria dos investidores em criptomoedas está na faixa etária entre 18 e 30 anos, são pessoas que estão buscando novas tecnologias e formas de aplicação”, ponderou.
Conforme Velasques, especialmente para a geração dos “millennials”, ou seja, aqueles nascidos entre os anos 80 e 90, existe muita atratividade no conceito de descentralização e desintermediação inerente às moedas virtuais. “Os mais jovens querem investimento que não dependa, por exemplo, do presidente da empresa ou do governo [para ter retorno]. É uma descentralização do poder [financeiro].”
Já os reguladores têm se voltado mais para a tecnologia por trás das criptomoedas, o chamado “blockchain”. Mardilson Fernandes Queiroz, chefe adjunto do Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Banco Central, enxerga no blockchain uma grande transformação para os meios de pagamentos e a transferência de valores.
“O token criptográfico [forma de representação digital de valores por meio do blockchain] é uma nova tecnologia que será matadora com o tempo”, disse o regulador. Queiroz explicou que o token criptográfico permite digitalizar ativos ou contratos. “Em poucos anos você vai ter em mãos uma ação da Petrobras tokenizada, uma debênture, um título federal e talvez até outra moeda tokenizada”, disse o chefe adjunto de regulação do BC.
+ “Cerca de 39% da população economicamente ativa está envolvida em um empreendimento”
O representante da autoridade lembrou ainda que, uma vez que esses ativos sejam atrelados ao blockchain, você poderá, de maneira simples, transferir esses tokens de forma segura e imutável. A nova tecnologia será uma espécie de nova roupagem para um ativo tradicional, ou seja, “que respeita os modelos de negócios existentes”.
Nesse sentido, o BC, segundo Queiroz, prefere usar os termos “criptoativos” ou “criptoassets” para se referir ao bitcoin e outras criptomoedas. “É uma questão de tempo até a tecnologia amadurecer e encontrar seus padrões mínimos de confiabilidade.”
Na visão de Romero Rodrigues, sócio do fundo de venture capital Redpoint eVentures, o bitcoin ainda tem muitos problemas a serem resolvidos antes de se tornar uma forma de pagamento viável. Conforme o gestor, as transações ainda são caras e lentas na comparação com os sistemas atuais. “Uma rede da Visa ou da Mastercard, por exemplo, faz uma transação em 20 milisegundos, mas transferir valores com o bitcoin demora 10 minutos. Quando a rede está congestionada, já levou até 18 horas para completar a operação”, disse.
Rodrigues não enxerga o bitcoin como uma moeda. “É uma moeda? Hoje ainda não”, afirmou. A criptomoeda tem sido mais usada como meio de troca, unidade de conta e reserva de valor. Na opinião do sócio da Redpoint, no momento, o melhor uso do bitcoin é como reserva de valor.
Mesmo sem ter regulação específica, as transações com criptomoedas são tributadas. De acordo com a Receita, a pessoa que tem criptomoeda deve declarar no Imposto de Renda (IR) e apurar ganho de capital. As alíquotas variam de 15% a 22%, conforme o ganho. O imposto tem de ser recolhido por carnê-leão no mês da operação. Lucro até R$ 35 mil está isento de IR para pessoa física.
Fonte: “Valor Econômico”