O empreendedor Fabio Rodrigues trabalhou durante 14 anos como executivo numa multinacional. Saiu e criou uma empresa. Depois vieram outros negócios que ficaram pelo meio do caminho. Com experiência de sobra, ele acaba de escrever o livro Na dúvida, não empreenda, voltado especialmente para executivos que sonham com o negócio próprio. A seguir trechos da entrevista:
O que o motivou a escrever o livro?
Alguns amigos da empresa onde trabalhava começaram a me procurar querendo saber como era empreender e se eu já estava rico. Na percepção deles, eu tinha mais qualidade de vida e não corria mais o risco de perder o emprego. Na realidade, eu ganhava menos do que quando era diretor, afinal tinha acabado de abrir a empresa, e trabalhava muito mais. Podia ir buscar meu filho na escola, mas às 10 horas da noite tinha de fazer planilhas ou alguma apresentação. E todos os dias eu acordava e tinha de ir atrás do meu salário. Comecei a perceber que as pessoas queriam empreender por medo de perder o emprego. E essa não é razão para empreender.
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Quais as dicas para quem quer um plano B?
Primeiro é saber muito bem o que vai fazer. A melhor empresa para abrir é aquela que está dentro da sua zona de conforto. Empreender sozinho já é muito confuso. Então a grande dica é fazer algo que você tenha conhecimento, que vai melhorar um processo, serviço ou produto de algo que já vivencia e o incomoda. Resolva um problema real. O preparo para abrir uma empresa tem de ser grande e adequado. Tem de ter backup financeiro. Um erro é achar que para abrir a empresa precisa ter só o dinheiro da empresa. Mas e o dinheiro que você precisa para viver enquanto a empresa não dá lucro? Tudo isso deve entrar na conta de empreender. Se não você vai falir pessoalmente antes da empresa.
No fundo, você não está dizendo para não empreender, mas estudar e se preparar antes.
Sou um entusiasta do empreendedorismo. Abri quatro empresas depois que saí do grupo onde trabalhava. Uma delas acabou se transformando numa que hoje está bem. A primeira era de eventos corporativos e demandava muito fluxo de caixa e não tinha grande diferencial no mercado. Migrei para o negócio de multiplicação de artes de marketing para grandes empresas. Toda grande empresa tem uma agência de marketing.
Como saber a hora de empreender?
O frio na barriga sempre vai ter. Mas é preciso ter certeza do que se está fazendo, se está empreendendo só por medo de ficar desempregado ou porque assistiu a três palestras e achou que é o momento ou porque todo mundo fala em empreender. Essas não são razões para empreender, mas para trocar de emprego. Empreender é a coisa mais séria que você pode fazer com o seu dinheiro. É preciso um planejamento da vida. É preciso se perguntar: ‘Eu tenho dinheiro, tenho vocação, aguento a ansiedade de não ter um salário ou de não ter um sobrenome famoso (da empresa), aguento não ter uma rotina’.
Quais cuidados?
Imagina pegar todo o dinheiro aplicado no banco e colocar num negócio sem estar preparado. Pode-se perder todo o dinheiro e ter de começar do zero para reconstruir o patrimônio. Quando falo ‘Na dúvida, não empreenda’ quero dizer: Pisa no freio, avalia de verdade se você pode começar sozinho um negócio e se consegue se sustentar enquanto a empresa não dá lucro. Se não, procura outro emprego, espere um pouco mais e tente mais tarde. E até mais que isso: a chance de quebrar no primeiro negócio é grande. Não tem problema, desde que você não quebre tão forte que não possa fazer de novo. É que nem emprego, a gente pode ser demitido e conseguir outro.
Qual o lado negativo de ter uma empresa?
Na época como executivo, quando entregava um pedido grande, eu não acompanhava que aquele dinheiro da venda virava logística, compra de peças, pagamento de salários e um monte de coisa que eu não tinha acesso. Quando você vira patrão, tudo cai na sua cabeça. Se caiu a internet, você que tem de ligar para resolver; demitir, contratar, aumentar salário, comprar cadeira, marcar reunião, tudo é você que faz.
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O maior erro é a falta de planejamento?
Sim, o planejamento está em tudo. Uma coisa muito comum é que as pessoas começam a ficar incomodadas com o emprego, com o chefe e a chance de ser demitido e se junta com um amigo do próprio departamento para montar uma empresa. São duas pessoas do marketing, por exemplo. Daqui a um ano a empresa vai ter dois diretores de marketing e nenhum diretor de logística. As pessoas se juntam por afinidades. Mas para você ter um sócio é preciso complementaridade. Não basta ser amigo.
Há também modismos.
Tem a moda e tem a ‘glamourizada’. Hoje ficaria mais feliz de ser dono de 30 carrocinhas de cachorro-quente pela cidade em vez de um food truck. Um food truck sozinho custa R$ 80 mil só o veículo. Para atuar, tem de ter a licença do local. Na carrocinha, é possível vender em qualquer lugar. Mesmo com as licenças, é uma forma mais lucrativa de fazer a mesma coisa só que sem glamour. Além disso, as pessoas abrem negócios iguais, com mercado saturado, apenas por modismo.
Fonte: “Estadão”