Intraempreendedorismo é a palavra do momento. Entregar um projeto da empresa nas mãos de um funcionário apaixonado pela ideia, capaz de cuidar dela como se fosse gestor de uma pequena empresa, tem ganhado força como forma de estimular a inovação. Outro apelo é pegar emprestado das startups o modelo ágil de trabalhar, em pequenas células formadas por profissionais de várias áreas do negócio. A Yunus Social Business, organização com foco em negócios sociais, defende as vantagens de unir essa tendência a outra medida que promete aumentar o engajamento dos funcionários: a responsabilidade social.
A Yunus estudou iniciativas de intraempreendedorismo social em empresas na Europa e nos Estados Unidos, a fim de avaliar o resultado para o negócio das companhias. A pesquisa foi feita em parceria com a Porticus, a Schwab Foundation e o Institute for Business and Society, do Insead. Os resultados foram divulgados em janeiro, no Fórum Econômico Mundial.
O levantamento entrevistou gestores em mais de 50 empresas com iniciativas de intraempreendedorismo social, como IKEA, Allianz, BASF, Renault e SAP. Entre elas, 77% disseram que os projetos aumentaram o engajamento dos funcionários, satisfação no trabalho e atração de talentos. Esse, segundo Daniel Nowack, diretor de gestão da Yunus Social Business, era o impacto mais esperado. “As pessoas querem colocar a sua força de trabalho e o tempo em um propósito”, diz.
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Entretanto, o estudo apontou outras vantagens. Das empresas entrevistadas, 61% disseram que as iniciativas de intraempreendedorismo social contribuíram para a mudança de mentalidade e cultura dentro das organizações e 50% afirmaram ter visto ganhos com inovação. Para 39%, o intraempreendedorismo social ajudou a companhia a alcançar novos mercados e consumidores. A melhora na imagem da empresa foi citada por 32% dos entrevistados.
Mentalidade e inovação
A Yunus já tinha evidências de que o intraempreendedorismo social incentiva os processos de inovação, e o levantamento veio a confirmar isso. “Quando você se propõe a resolver um problema social, precisa olhar para as coisas de forma diferente – afinal, o problema só existe porque ninguém conseguiu resolver ainda. Para ter o máximo de foco no problema, é preciso criar coisas novas, integrar áreas da empresa”, diz Daniel.
O projeto de Muhammad Yunus — que dá nome à organização — na Danone da Índia é exemplo disso, lembra Daniel. Em uma joint venture com o Grameen Group, fundado por Yunus, a empresa francesa de laticínios se comprometeu a criar uma linha de iogurtes capaz de dispensar refrigeração. O objetivo era ajudar a combater a desnutrição entre as crianças indianas. Segundo o executivo, no desenvolvimento da fórmula, o iogurte ficava com um gosto metálico. Para solucionar isso, a empresa se viu forçada a criar um novo componente, que acabou sendo usado em outros produtos da marca Danone.
Outro exemplo de inovação vem da brasileira Ambev, lembra Túlio Notini, diretor da Yunus Negócios Sociais no Brasil. Com o projeto Ama, que vende água mineral e destina o lucro a projetos de acesso à água potável na região do semiárido, a empresa de bebidas lançou a primeira água em lata do país.
Intraempreendedorismo social como meio para um futuro mais sustentável
No estudo, a Yunus alerta para a importância dessas iniciativas para que consigamos alcançar as metas de desenvolvimento sustentável estipuladas pela ONU até 2030. “Não vamos resolver os problemas que enfrentamos hoje só com a ação de governos e ONGs”, diz Daniel. “Precisamos usar a experiência das empresas, que são uma grande força da nossa economia”, afirma.
O intraempreendedorismo social, diz Daniel, não é um fenômeno novo. Entre as empresas que fizeram parte da pesquisa, um terço das iniciativas têm mais de 10 anos. “A ideia de que criar valor para o acionista não é suficiente já é discutida há muitos anos, várias empresas já estão convencidas, mas não sabem como fazer diferente. Outras já começaram a mudança e colhem os frutos agora”, diz Daniel.
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Esse, inclusive, é um ponto importante para entender os projetos de intraempreendedorismo social: os resultados, muitas vezes, demoram. “Os intraempreendedores precisam saber usar as estruturas corporativas a seu favor. O impacto de um negócio social demora de três a cinco anos para aparecer, e mesmo assim, pode não chegar a competir em rentabilidade com outros produtos da empresa”, afirma Daniel. Para convencer os executivos da importância dos projetos, é preciso encontrar métricas que demonstrem o valor da iniciativa.
Como os resultados demoram, essas iniciativas correm risco permanente de ser cortadas. Para isso não acontecer, as empresas precisam entender que esses são investimentos de longo prazo, e que a tendência por mais sustentabilidade não vai mudar. “Os consumidores vão ficar cada vez mais engajados, e a sobrevivência do negócio no longo prazo depende disso. Uma empresa de energia que só foca em combustíveis fósseis não vai se sustentar nos próximos 20, quem sabe nem nos próximos 10 anos”, diz Daniel.
Túlio afirma que as empresas brasileiras começaram a mudar de mentalidade quanto ao investimento em negócios sociais. “Antes, era comum recebermos empresas cujo foco era melhorar a imagem corporativa. Hoje, vejo que olham mais para o negócio, a inovação e o engajamento dos funcionários. O social washing não se sustenta, e pode até a vir a prejudicar a empresa no longo prazo”.
Outro ponto crucial para que os negócios sociais dentro de uma empresa sejam um sucesso é o apoio da alta diretoria. “O CEO precisa estar envolvido e convencido, o intraempreendedor precisa ter acesso e autoridade sobre o projeto”, afirma Daniel. “Isso precisa vir do C-level. A média gerência das empresas normalmente está acostumada a fazer as coisas sempre do mesmo jeito, com foco em conseguir lucro no curto prazo”.
Fonte: “Época Negócios”