As contas do governo encerraram o ano de 2019 com um rombo de R$ 95 bilhões no Orçamento. O número representa uma diferença de cerca de R$ 44 bilhões em relação ao previsto inicialmente, graças a receitas extraordinárias, como o megaleilão do pré-sal, ocorrido em novembro.
Os números foram divulgados nesta quarta-feira pelo Tesouro Nacional. O governo estava autorizado, pelo Congresso, a ter um rombo de até R$ 139 bilhões no ano passado.
Mesmo negativo, o número de 2019 é o melhor resultado das contas públicas desde 2014, quando o rombo registrado foi de pouco mais de R$ 30 bilhões. Esse valor abriu uma sequência de déficits no Orçamento federal, que só deve entrar no azul a partir de 2023, pelas contas do governo. Em 2018, o déficit somou R$ 120 bilhões.
— Não é um resultado para se alegrar e soltar fogos. A situação fiscal do Brasil ainda é muito frágil. O Brasil ainda tem as contas no vermelho. O ajuste fiscal ainda está sendo feito — disse o secretario do Tesouro, Mansueto Almeida.
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O ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu, durante a campanha eleitoral do então candidato Jair Bolsonaro, em 2018, zerar o déficit público no primeiro ano de governo, o que não ocorreu.
Guedes chegou a dizer, no ano passado, que o déficit de 2019 seria ainda menor, na casa de R$ 70 bilhões. Esse número também acabou não se confirmando. O governo gastou mais que o previsto em dezembro com, por exemplo, com a injeação de R$ 10 bilhões em estatais. Foi o caso da capitalização de R$ 7,6 bilhões numa empresa da Marinha para construçao de corvetas.
Para este ano, a expectativa é de um rombo de R$ 124 bilhões.
Para conseguir chegar ao resultado melhor em 2019, o governo contou principalmente com a arrecadação extra dos leilões de petróleo. Apenas com o megaleilão do excedente da cessão onerosa, a União teve uma receita líquida de R$ 23,6 bilhões — já descontadas as transferências para Petrobras, estados e municípios.
Também aliviou a conta uma receita melhor com Imposto de Renda e com antecipação de dividendos de estatais. Do lado da despesa, o governo gastou menos que o autorizado por conta de um fenômeno chamado de empoçamento. Isso ocorre devido ao excesso de vinculações de despesas e à evolução mais lenta de projetos. Com isso, os valores são autorizados, mas acabam não sendo gastos. Em 2019, o empoçamento foi de R$ 17,4 bilhões.
Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), afirma que o resultado veio em linha com as estimativas do órgão e, sem os leilões de petróleo, o déficit seria ainda de três dígitos.
— Há que se observar que, mesmo sob efeito de receitas atípicas, o resultado é significativamente melhor que o de 2018 (R$ 120,2 bilhões). No entanto, o desafio fiscal segue sendo muito complexo. Um nó difícil de se desatar sem mudanças estruturais no gasto obrigatório. A recuperação das receitas ligadas à atividade ainda não veio com força. Espera-se que o crescimento maior do PIB para 2020 ajude nisso — disse ele.
O resultado do ano passado foi puxado pelo déficit do Regime Geral da Previdência Social, que paga as aposentadorias do INSS. O rombo subiu de R$ 195 bilhões em 2018 para R$ 213 bilhões, uma alta de 5,3% acima da inflação. Tesouro e Banco Central, que compõem a conta, tiveram superávit de R$ 118 bilhões em 2019. O rombo na Previdência dos servidores civis e militares foi de R$ 100,4 bilhões.
As receitas totais do governo federal somaram R$ 1,346 trilhão, alta real de 5,6%, na comparação com 2018. Enquanto as despesas chegaram a R$ 1,441 trilhão, avanço de 2,7%.
Teto de gastos
Apesar do governo ter conseguido cumprir a meta fiscal com folga, 2019 foi marcado por uma sequência de bloqueios no Orçamento, que chegaram a R$ 34 bilhões ao longo do ano, ameaçando uma série de serviços públicos. Esse valor acabou sendo todo descontingenciado no fim do ano, por conta das receitas extras.
No auge do contingenciamento, integrantes da ala política do governo pediram mudanças na regra do teto de gastos — que limita o aumento das despesas da União à inflação do ano anterior —, para liberar mais dinheiro para os ministérios, o que acabou não ocorrendo.
Em 2019, todos os poderes da União cumpriram o teto de gastos. O Poder Executivo consumiu 97,6% do permitido. O Legislativo, 95,4%. E o Judiciário, 98,7%. O limite para o ano passado era de R$ 1,407 trilhão, mais que o total de R$ 1,373 trilhão dos gastos.
— O fato é que o paciente ainda agoniza. Tratar a doença vai exigir uma combinação de terapias. Teto de gastos, sozinho, não resolve. Mas ruim com ele, pior sem ele — disse Salto.
+ João Luiz Mauad: Bem-vindo seja o “rombo”
Orçamento engessado
O Tesouro destacou que um dos maiores problemas no Orçamento é a rigidez das contas. No ano passado, os gastos obrigatórios alcançaram 91% das despesas totais. Assim, as chamadas despesas discricionárias, aquelas que o governo tem liberdade para gastar, retornaram ao patamar de fevereiro de 2010, segundo o Tesouro. Isso significa que sobrou pouco espaço para investir ou custear a máquina pública.
Com isso, os investimentos se mantiveram em patamar baixo, na comparação com o tamanho da economia: apenas 0,78% do PIB, uma leve alta em relação ao 0,77% de 2018, mas ainda abaixo do nível de 2007, quando a categoria de despesa estava em 0,8% do PIB. Em 2014, para efeito de comparação, esse percentual chegou a 1,34%, mas passou a cair nos anos seguintes.
A maior parte das categorias de despesas aumentaram em relação ao ano passado. O governo gastou R$ 18,6 bilhões a mais com o pagamento de benefícios previdenciários, enquanto o custo com pessoal e encargos sociais subiu R$ 3,9 bilhões. Já o pagamento de subsídios caiu R$ 5 bilhões.
Fonte: “O Globo”