O Brasil poderia ter cortado pela metade seu nível de endividamento se tivesse concedido menos benefícios fiscais na última década. Estudo do Ministério da Economia mostra que, entre 2009 e 2018, os chamados gastos tributários – dinheiro que o governo deixa de arrecadar por causa dos incentivos – somaram R$ 2,5 trilhões, em valores de 2018. Se todo esse dinheiro tivesse sido usado para abater a dívida pública, ela poderia ter encerrado em apenas 33,3% do PIB no ano passado, em vez de alcançar 76,7% do PIB, de acordo com dados do Banco Central.
O estudo mostra o efeito fiscal dos gastos tributários, que o governo quer reduzir nos próximos anos. Hoje, essa renúncia representa mais de 4% do PIB. Só neste ano, deixarão de ser arrecadados R$ 300 bilhões. O cenário em que toda essa bolada é direcionada para o abatimento da dívida é extremo. O levantamento lista 16 cenários, considerando duas variáveis: a redução do gasto tributário pode ser menor e nem todo o dinheiro poupado pode ir para o abatimento da dívida.
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Mesmo assim, teria sido possível reduzir o endividamento. Em um cenário mais moderado, em que os gastos tributários são reduzidos pela metade e metade dessa economia vai para abater a dívida, o estoque seria reduzido em 10,2 pontos percentuais. Ou seja, chegaria ao fim de 2018 em 66,5%.
Os dados devem ser mais usados pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para ilustrar o efeito dos gastos tributários sobre a economia. Guedes costuma dizer que o volume de incentivos é um sintoma de distorções como a alta carga tributária, que ultrapassa os 33% no país. O ministro também tem uma cruzada contra as despesas para pagar a dívida pública. Frequentemente, diz que o Brasil gasta um Plano Marshall por ano com esse financiamento, em referência ao dinheiro gasto para reconstruir a Europa após a Segunda Guerra Mundial. No ano passado, as despesas com juros chegaram a R$ 342 bilhões.
Na quarta-feira, em audiência pública na Comissão Especial da Reforma da Previdência na Câmara, o secretário de Previdência, Leonardo Rolim, também tocou no assunto dos gastos tributários. Ele apresentou estimativas que mostravam que as renúncias previdenciárias chegavam a R$ 64,1 bilhões. A maior parte da desoneração é referente ao Simples Nacional, regime tributário diferenciado para pequenas empresas. Rolim observou, no entanto, que o governo precisa avaliar também os benefícios da medida.
– O maior item é o Simples. Eu tenho muita dúvida se, se nós acabássemos com a desoneração do Simples, se a receita previdenciárias iam crescer. A gente sabe que o Simples trouxe um aumento de formalidade considerável — disse Rolim.
Para especialistas, a revisão dos incentivos é necessária, mas será preciso fazer um pente fino justamente para avaliar a relação custo-benefício de cada programa
— As renúncias foram muito atabalhoadas e concedidas em um momento em que estávamos muito próximos do pleno emprego. Talvez fosse melhor que esses recursos tivessem ficado com o governo, não com a iniciativa privada — pontua André Perfeito, economista-chefe da Necton.
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Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, acrescenta que o corte dos benefícios ajudaria o país a reduzir o déficit fiscal, o que por si só colocaria o país mais próximo de produzir superávit primário, a economia para pagar os juros da dívida pública. Desde 2014, o país não consegue poupar sequer um centavo para abater essa conta. Os sucessivos anos no vermelho estão por trás do aumento do endividamento.
– A argumentação era basicamente de que haveria a renúncia fiscal, mas vai gerar emprego e crescimento e a arrecadação mais do que compensaria a renúncia. Isso se mostrou uma quimera, boa parte dos setores incorporaram esses benefícios e a gente ficou com esse rombo. Mas tem coisas aí que são irrenunciáveis, porque não existe a mínima condição política de fazer isso, como Zona Franca de Manaus e Simples.
Fonte: “O Globo”