Um dos principais defensores de que a reforma da Previdência seja válida também para estados e municípios, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), saiu na quarta-feira de uma reunião com governadores do Nordeste sem um acordo sobre a inclusão dos entes na proposta. Retirados do texto que tramita no Congresso, 12 estados e o Distrito Federal perderão a chance de cortar ao menos à metade o déficit previdenciário em uma década, mostram cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado. Dois deles (MT e PA) e o DF seriam capazes, inclusive, de tornar superavitários seus regimes próprios caso os estados fossem incluídos na reforma da União.
Maia voltou a destacar que, caso estados e municípios não sejam incluídos na proposta, o país terá problemas a curto prazo, com prejuízo à União, que teria de socorrer os entes da federação.
A leitura do texto final do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP) sobre a reforma da Previdência na comissão especial da Câmara que analisa a matéria corre o risco de ficar para a próxima semana . Segundo integrantes da comissão, há vários entraves que estão impedindo o andamento da proposta. Assim, também fica em risco o plano do governo de aprovar a reforma na Câmara antes do recesso parlamentar, marcado para o dia 18 de julho.
Se o texto da reforma for aprovado como está, caberá às assembleias legislativas lidar com um desequilíbrio financeiro que crescerá 4,7% ao ano até 2030 no conjunto de estados — tarefa que, segundo especialistas, esbarrará na fragmentação do debate e na pressão do funcionalismo local.
Risco de descumprir LRF
Responsável pelo estudo da IFI, o analista e consultor legislativo do Senado Josué Pellegrini considerou o impacto da reforma sobre o rombo previdenciário de cada estado registrado em 2017, já que não há dados disponíveis que projetem a evolução do déficit nos próximos anos sem a reforma.
— Com a reforma, o impacto seria considerado bom, já que dez anos não é um tempo relativamente curto para uma reforma desse tipo. A exceção são os estados do Sudeste, cujos déficits são muito elevados — afirmou Pellegrini.
No estudo, o analista observou que, mesmo entre os dez estados que teriam uma redução do déficit inferior a 50% no período, cinco teriam desempenho razoável: Goiás, Pernambuco, Espírito Santo, Rio Grande do Norte e Paraíba conseguiriam diminuí-lo em pelo menos 40%.
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O IMPACTO PERDIDO
Se o relatório da reforma da Previdência incluísse os estados, unidades da federação teriam um alívio substancial em suas contas na próxima década.
A economia só seria considerada “insatisfatória” nos principais estados das regiões Sudeste e Sul: São Paulo (redução de 31,8% do déficit em dez anos), Minas Gerais (29,8%), Rio (27,2%), Santa Catarina (20,6%) e Rio Grande do Sul (apenas 15,2%). Caso os governos regionais ainda sejam incluídos na reforma, esses estados economizariam R$ 151,8 bilhões em dez anos — ou 43% do poupado por todas as unidades da federação no período —, pois eles registram hoje desequilíbrio previdenciário mais dramático. Isso acontece porque contam com proporção elevada de aposentados e regras de aposentadoria mais generosas. Nesses casos, a reforma proposta pelo Executivo seria insuficiente para lidar com o déficit, exigindo medidas extras.
— O problema é que, como não vão aderir à reforma, aumentou em muito a probabilidade de que mais estados descumpram os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para gastos com pessoal (60%) e que aqueles que já a descumprem fiquem ainda mais pressionados. Nos últimos anos, o que tem sido feito é frear esse movimento, acomodar o gasto maior com aposentados, gastando menos com os servidores ativos. O problema é que uma hora isso impacta a qualidade do serviço público — disse Pellegrini.
Os únicos estados com superávit previdenciário são Roraima, Amapá, Tocantins e Rondônia, todos “novos”, criados na década de 80, com uma parcela maior de servidores na ativa — e, em dois deles, com parte do funcionalismo ainda paga pela União. Nestes casos, o efeito da reforma seria aumentar em R$ 16,1 bilhões o superávit somado em uma década.
Medidas para conter gasto
Outro pesquisador, o especialista em contas públicas Raul Velloso, calcula que a reforma da Previdência daria um alívio fiscal importante aos estados já a curto prazo. Se as mudanças aplicadas à União também fossem adotadas por eles, a economia total seria de R$ 26,2 bilhões apenas nos dois primeiros anos. O valor equivaleria a 37,2% do déficit orçamentário geral dos estados projetado para 2019 e 2020 somados, de R$ 70,4 bilhões, segundo Velloso:
— Os estados projetam um déficit total médio anual de R$ 35,2 bilhões em 2019 e 2020, dos quais as perdas previdenciárias são parte dominante. Isso é impossível de administrar. A introdução deles na reforma teria um impacto médio anual da ordem de R$ 33 bilhões, o que resolveria o problema, se não levarmos em consideração os cerca de R$ 100 bilhões em valores atrasados, herdados de administrações estaduais passadas.
Para tentar ajudar os governos regionais a lidarem com o desequilíbrio previdenciário, o relator Samuel Moreira (PSDB-SP) incluiu mudanças no texto que dão algum alívio aos estados. A principal é a proibição de incorporação de pagamento adicional por cargos comissionados nas aposentadorias. Esse impedimento já existe na esfera federal.
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Além disso, o relatório torna facultativa a adoção do abono-permanência, dado a servidores que atingem as condições para se aposentar e decidem permanecer na ativa. Quem já recebe o benefício teria o pagamento mantido.
Por outro lado, o relator incluiu uma medida que beneficia os servidores. Foi retirada a obrigatoriedade, prevista no texto original, de governadores e prefeitos criarem contribuições temporárias extraordinárias para solucionar o déficit de seus regimes. Também saiu da proposta a exigência para que os entes federativos com rombos nos planos de aposentadoria aumentem a alíquota de contribuição para o mínimo de 14% (mesmo percentual da União), em um prazo de 180 dias.
Fonte: “O Globo”