O Tribunal de Contas do Município (TCM) concluiu que a prefeitura ultrapassou o limite, estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 54% de despesas com pessoal em cima da arrecadação, no ano passado. Segundo o TCM, as despesas chegaram a 54,32%, e foram impulsionadas, em parte, pela necessidade de o Executivo cobrir rombos do Fundo de Previdência do Município (Funprevi), que paga aposentadorias e pensões.
Pela LRF, as despesas têm que ser adequadas ao limite em dois quadrimestres — como o prazo é contado a partir de janeiro, vai até agosto. Caso contrário, o prefeito Marcelo Crivella pode responder por crime de improbidade, por se tratar de ano eleitoral.
A avaliação da corte contradiz um documento divulgado pela prefeitura. Em fevereiro, o município publicou um balanço indicando que suas despesas corresponderam a 51,97% da arrecadação em 2019. Mas o relatório também aponta que o Rio fechou o ano com um rombo de pelo menos 2,42 bilhões em caixa, o que deixou a gestão de Crivella sem recursos para pagar despesas assumidas.
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Pelo cálculo do TCM, o total de despesas com pessoal que ultrapassou o limite da LRF chega a R$ 532 milhões. Procurada ontem para comentar o assunto, a prefeitura se limitou a informar que a Controladoria-Geral do Município vai estudar o parecer do tribunal.
Momento complicado
O estouro das despesas com pessoal foi antecipado pela coluna de Berenice Seara no “Extra” e ocorre num momento em que a prefeitura pode ser obrigada a aumentar os gastos na saúde, inclusive com pessoal, para enfrentar o coronavírus:
— A pandemia vai ser um desafio a mais. Ele (Crivella) até pode abrir uma exceção e contratar pessoal para a saúde, mas terá de compensar com cortes em outras áreas. Esse é o problema de gestões que vivem no limite do gasto, ficam sem margem para situações de emergência — diz o economista André Luiz Marques, coordenador do programa de gestão de políticas públicas do Insper.
De acordo com as regras da LRF, pelo menos um terço do percentual que excedeu o limite de despesas com pessoal tem de ser zerado no primeiro quadrimestre (até abril) e o restante, nos quatro meses seguintes. Segundo especialistas, as maiores possibilidades de cortes são de gastos com gratificações e cargos comissionados.
A diferença entre as contas da prefeitura e do TCM ocorre porque, ao calcular as despesas com pessoal, o município deixou de incluir, em seus cálculos, aportes no Funprevi a título de antecipação de receitas de royalties do petróleo, para cobrir rombos da previdência. Esse valor, de acordo com o TCM, deveria ter sido considerado gasto com pessoal.
As divergências em relação aos cálculos se arrastam desde dezembro de 2018. Na época, Crivella fez seu primeiro aporte de antecipação de royalties para cobrir o rombo do Funprevi. Desde então, o TCM emitiu quatro alertas sobre as despesas com pessoal da prefeitura, incluindo ressalvas às contas de dois anos atrás, que acabaram recebendo um parecer favorável. Ao recebê-los, o município apresentou um recurso, questionando a metodologia empregada por técnicos do tribunal. Todos, porém, foram rejeitados.
— Não importa se são recursos antecipados de royalties, estamos falando de aportes do tesouro. Logo, teriam que ser computados como gastos com pessoal — diz o coordenador de autoria do TCM, Roberto Chapiro.
Ainda mais gastos
Apesar do rombo nas contas, a prefeitura tomou, recentemente, medidas que podem ter elevado os gastos com pessoal. Uma delas, no entanto, foi sepultada pela Câmara Municipal, na semana passada. O Executivo pretendia transformar 2,4 mil funcionários celetistas da Comlurb, admitidos sem concurso público antes da Constituição de 1988, em estatutários. Isso resultaria numa despesa de mais de R$ 400 milhões por ano para o Funprevi.
+ Os caminhos para as reformas
— O fundo perdeu R$ 4 bilhões por medidas tomadas ao longo de vários governos. Em vez de aumentar despesas, a prefeitura deveria tentar recuperar o que o Rio já perdeu — diz Luiz Antônio Barreto, presidente do Sindicato Carioca dos Fiscais de Renda.
Crivella ainda tenta aprovar um plano de cargos e salários para aumentar os vencimentos de cerca de 8 mil agentes administrativos da prefeitura. O reajuste, no entanto, só seria aplicado depois que o município estivesse abaixo do chamado limite prudencial da LRF — correspondente a 51,3% da arrecadação.
A presidente da Comissão de Orçamento e Finanças da Câmara Municipal, Rosa Fernandes (DEM), convocou para a próxima quarta-feira uma reunião com representantes da Controladoria-Geral do Município e do TCM para debater os cálculos.
— A situação das contas da prefeitura é preocupante e precisa ser esclarecida — afirma a vereadora.
Fonte: “O Globo”