O governo já articula sua estratégia para lidar com a ofensiva dos políticos que planejam desidratar a reforma da Previdência na Comissão Especial , que começa a analisar o mérito da matéria no Congresso . Já está pronto um conjunto de emendas que serão encampadas e apresentadas por deputados que apoiam o governo com o objetivo de fazer frente aos intentos de reduzir o impacto fiscal do novo sistema.
Elas foram elaboradas por especialistas a partir do levantamento de pontos que geraram críticas à proposta já conhecidos no Congresso.
Entre eles, as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e deficientes de baixa renda, na aposentadoria de trabalhadores rurais, professores, policiais federais, servidores dos estados e municípios, além da criação de um novo regime previdenciário de capitalização, no qual os trabalhadores contribuem para sua própria aposentadoria.
Em entrevista ao SBT na noite de ontem, o presidente Jair Bolsonaro disse acreditar que tem maioria no Congresso para aprovar a reforma. Ainda assim, a estratégia das emendas visa a reduzir resistências na Casa. Segundo fontes do governo, essas emendas têm o apoio de governadores e prefeitos e não afetam a economia projetada com a reforma de R$ 1 trilhão em dez anos. A busca de soluções alternativas é justamente para preservar o ganho fiscal, explicou um técnico.
Combate a fraudes
De acordo com os dados detalhados sobre a economia projetada com a reforma, o efeito das mudanças nas regras para os trabalhadores rurais será de R$ 92,4 bilhões. No caso do BPC, de R$ 34,8 bilhões. Já para os professores, R$ 21,4 bilhões.
Ainda que o governo abrisse mão desses três pontos na reforma numa demonstração de boa vontade política, o ganho fiscal estimado não seria afetado. Ou seja, poderia ser uma alternativa viável politicamente sem penalizar a parte fiscal.
Contudo, o governo decidiu que vai insistir na manutenção desses pontos, sob o argumento de que é preciso inibir fraudes nas aposentadorias no campo — há hoje um número de benefícios concedidos superior àquele de trabalhadores que se autodeclaram rurais.
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Já no caso do BCP, a justificativa do governo para manter o plano de mudança é tornar o sistema mais justo, pois os beneficiários recebem a mesma quantia daqueles que passaram a vida toda contribuindo para o regime, sem nunca terem recolhido.
O prazo para apresentação de emendas, de 13 sessões (do plenário da Câmara) já está correndo. Ao final, todas serão analisadas pelo relator da reforma da comissão especial, o deputado Samuel Moreira (PSDB-SP). A previsão é que o parecer seja apresentado antes do fim de junho para que possa ser votado pelo plenário da Câmara ainda no primeiro semestre.
Moreira disse que vai estudar todas as emendas e conversar com líderes dos partidos e bancadas para elaborar o relatório.
— Vou analisar tudo. Elas serão sistematizadas em artigos, temas e impacto fiscal —afirmou o relator, acrescentando que, em sua avaliação, visará a conciliar a economia esperada com a reforma e o impacto social, no intuito de não permitir medidas mais severas aos mais pobres.
A comissão se reúne amanhã, quando será apresentado o cronograma de trabalho para análise do projeto.
Entenda a estratégia do governo:
Benefício a idoso de baixa renda
Hoje, o chamado Benefício de Prestação Continuada (BPC) corresponde a um salário mínimo e é pago a idosos a partir dos 65 anos e deficientes de baixa renda. No texto original da reforma, o auxílio seria antecipado aos 60 anos no valor de R$ 400. Mas as pessoas teriam de esperar por dez anos para receber o benefício completo. Foi um dos pontos de maior resistência entre parlamentares. A alternativa que será proposta é criar uma escadinha para elevar o valor do auxílio, que começaria em R$ 400 aos 62 anos, subindo R$ 100 a cada dois anos, de modo que, aos 68 anos, o beneficiário tenha acesso a um salário mínimo integral.
Aposentadoria rural e de professores
O texto da reforma propõe idade mínima de 60 anos para professores e trabalhadores rurais, independentemente do sexo. Houve resistência especialmente no caso das trabalhadoras do campo, que hoje se aposentam aos 55. A ideia do governo, agora, é que elas e as professoras se aposentem aos 59 e os homens do campo e professores, aos 62. Assim, a idade mínima continua ria inferior à exigida para a maior parte das categorias ( 62 para mulheres e 65 para homens). O governo também avalia flexibilizar o tempo de contribuição dos trabalhadores rurais: em vez de subir de 15 para 20 anos logo após a aprovação da reforma, o aumento seria gradual, ao longo de uma década.
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Capitalização
Para conseguir aprovar o regime de capitalização — a principal aposta do ministro da Economia, Paulo Guedes, para resolver de forma definitiva o déficit da Previdência — uma das emendas que deverão ser propostas torna compulsória a contribuição patronal. Os valores recolhidos mensalmente pelos empregadores se somarão à parcela dos trabalhadores, formando uma poupança para a aposentadoria no futuro, o que permitiria que os trabalhadores enquadrados no novo sistema recebam ao menos um salário mínimo. Assim, quem não atingir uma renda mínima pela capitalização, receberia uma complementação. No texto original, a fonte das contribuições não era detalhada.
Estados e municípios
Em resposta a um movimento crescente do Congresso para retirar da reforma mudanças nas aposentadorias dos servidores estaduais e municipais, o governo avalia incluir no texto a definição das alíquotas extraordinárias para cobrir o rombo dos regimes previdenciários desses entes. Elas entrariam em vigor imediatamente, atendendo a governadores que ainda resistem em apoiar a reforma de forma contundente, como os dos estados do Nordeste. Pela proposta original, eles teriam prazo de 180 dias para aprovar essas contribuições em suas assembleias.
Fonte: “O Globo”