Em 1995, o professor de Administração da Universidade de Harvard Clayton Christensen , guru de gerações de executivos, cunhou pela primeira vez o conceito de “ inovação disruptiva ”, uma forma radical de criar produtos, serviços ou processos capazes de garantir a uma empresa vantagem competitiva suficiente para ditar as regras nos mercados em que atuam. De lá pra cá, o termo se popularizou e virou uma espécie de mantra em muitas companhias ao redor do planeta. Pelo menos entre as dispostas a sobreviver ao avanço cada vez mais veloz da tecnologia ou mesmo criar novos mercados do zero.
A melhor demonstração da validade do conceito de Christensen é o crescente protagonismo das start-ups. Muitas já se tornaram gigantes bilionárias, deixando marcas tradicionais comendo poeira. Sob essa pressão, executivos do mundo inteiro intensificam a revisão de seus portfólios numa busca incessante de novas ideias. É o que mostra a última edição do Barômetro da Confiança do Capital Global , pesquisa realizada anualmente pela consultoria EY. Dos 2,9 mil executivos de empresas com faturamento superior a US$ 250 milhões ouvidos em 47 países este ano, 41% disseram mudar produtos e serviços a cada três meses para tentar acompanhar o ritmo das mudanças em seus mercados. Em 2018, só 3% tinham essa frequência.
A fatia dos que mexem só uma vez por ano no cardápio caiu de 64% no ano passado para 22% agora. A pesquisa também mostra maior disposição para unir forças com outras empresas se isso significar não perder o bonde da tal “disrupção”. Em 2019, 59% dos entrevistados demonstraram interesse em fusões e aquisições nos próximos doze meses, o maior nível em seis anos. Mesmo no Brasil, que deve ter mais um ano de economia estagnada, 47% dos entrevistados estão abertos a esse tipo de negociação.
O principal motivo citado é o interesse em absorver o conhecimentos de start-ups.
Os resultados da pesquisa foram apresentados no início de junho no World Entrepreneur of the Year, uma premiação realizada desde 2001 em Mônaco para escolher o empreendedor do ano em sete aspectos — um deles, a capacidade de promover a “disrupção” em suas áreas. Em 2019, o escolhido foi o americano Brad Keywell, fundador da Uptake, empresa de inteligência artificial para manutenção de fábricas. Conheça abaixo a história do negócio dele e de outros que se destacaram este ano na busca de soluções “disruptivas” em seus mercados.
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Sensores podem ver nas máquinas problemas que ainda não existem
O negócio do americano Brad Keywell é prever problemas numa linha de produção antes mesmo de eles surgirem. Em 2014, ele fundou a Uptake nos EUA para desenvolver softwares e sensores que monitoram equipamentos como um médico examina um paciente.
Com dados como consumo de energia ou o estado do motor, a empresa prevê quando uma máquina vai perder eficiência ou quebrar. A indústria ganha consertando antes. Após cinco anos, a empresa vale US$ 2,3 bilhões.
— O poder dos dados para promover a “disrupção” em indústrias mundo afora só começou —diz Keywell.
Duzentos navios despachados por dia com produtos ‘Made in Japan’
A japonesa Daiso faz algo considerado ultrapassado: vende itens baratos em lojas físicas. Faz US$ 4 bilhões por ano em 5 mil lojas em 27 países, 33 no Brasil. Cada uma tem 70 mil produtos, 40% mais que um supermercado. A inovação está no estoque.
A reposição vem de 8 armazéns robotizados em Hiroshima. A cada dia, 200 navios saem do Japão com produtos Daiso. Ao contrário das varejistas globais, que têm fornecedores locais, o fundador Hirotake Yano valoriza poder ver o que vende mais e fazer mudanças imediatas nas lojas, sem depender de ninguém:
—Enviamos 800 novos produtos às lojas por mês.
Automóveis limpos e velozes num país sem montadoras
A primeira inovação de Mate Rimac foi criar a primeira montadora de veículos do seu país, a Croácia, rompendo a tradição do setor de perseguir cadeias de fornecimento de autopeças. Mas não surpreendeu apenas do ponto de vista geográfico.
A Rimac Automobili fabrica carros elétricos de alta potência. Um deles, o Concept Two, promete chegar a 100 km/h em 2 segundos graças a uma técnica de resfriamento do motor que permite altas rotações sem superaquecer a máquina. A inovação atraiu a atenção de concorrentes: em maio, a Rimac recebeu aporte de € 80 milhões das montadoras asiáticas Hyundai e Kia.
Fusão de equipes e rede de start-ups para mudar a gestão interna
Na Kroton, maior rede privada de educação do Brasil, decisões importantes são tomadas misturando gente de vários departamentos, do comercial ao acadêmico, há dois anos. A ideia é superar juntos problemas até então insolúveis às “patotinhas” que toda empresa tem.
— Abandonamos a lógica de ter equipes só para criação ou só para vendas —conta Rodrigo Galindo, presidente da Kroton.
Nas mesma lógica, a Kroton resolveu buscar conselhos vindos de fora. No Cubo, hub de start-ups em São Paulo, já trocou ideias com 250 delas e incorporou novidades para acelerar processos internos.
No mar de escritórios sem paredes, uma ilha de sossego
Nas últimas décadas, empresas mundo afora, em especial as de tecnologia, derrubaram paredes de seus escritórios para estimular a troca de ideias entre funcionários e catapultar a produtividade. O finlandês Samu Hällfors acha isso uma bobagem:
— Falatório reduz concentração e vontade de trabalhar.
+ Guilherme Fiuza: A caixa preta é transparente
Em 2010, ele criou a Framery, que fabrica cabines com isolamento acústico para o empregado trabalhar em paz, sem ouvir conversa de colega nem ter que usar fones para se concentrar. Em 2018, a empresa faturou US$ 180 milhões. Entre os clientes, as mesmas empresas de tecnologia, como Google e Microsoft.
Em busca de alimentos que possam substituir remédios
Desde 2001, a Bioceres produz sementes geneticamente modificadas de acordo com a vontade do cliente. A empresa argentina cria enzimas que protegem trigo e soja de intempéries ou pragas. Uma alternativa aos agrotóxicos, a indústria bilionária que é alvo de críticas crescentes de consumidores em busca de comida saudável.
A Bioceres quer ir além para agradá-los. Está testando enzimas para melhorar a digestão de alimentos e, quem sabe, atacar doenças.
—Tomamos remédio para tratar a ansiedade. Por que não consumir alimentos que evitem esse mal? —diz Federico Trucco, líder da Bioceres.
Fonte: “O Globo”