Em artigo para a “Folha de S. Paulo” publicado em 26/08, Luciano Coutinho, presidente do BNDES, argumenta que: “Entre outros objetivos, a atuação do BNDES é crucial para viabilizar um patamar de investimentos mais alto do que ocorreria em sua ausência, o que aumenta a capacidade produtiva e a produtividade e, assim, amplia o potencial de crescimento do país”. Será?
Primeiramente, desde que o BNDES passou a atuar de forma mais agressiva nos mercados de crédito – a partir de 2006, com a política de “campeões nacionais”, encerrada em 2013, e durante a crise global de 2008-2010, como eixo de sustentação do crédito –, a taxa de investimento no Brasil praticamente não se alterou, como diversos economistas têm apontado ao longo dos últimos anos.
De fato, após alcançar pico em torno de 20% do PIB em 2010/2011, a taxa de investimento brasileira caiu para perto de 17,5%, enquanto o período 2010-2014 foi testemunha de forte expansão da carteira do BNDES, com vultosos repasses do Tesouro – mais de R$ 400 bilhões, ou 10% do PIB brasileiro. Como pode o argumento de que o BNDES promove mais investimentos estar correto perante essas evidências?
Em segundo lugar, tenho argumentado em diversos artigos recentes que o BNDES é uma das principais causas para as taxas de juros excessivamente elevadas que se observam no país.
[su_quote]O efeito do BNDES sobre a produtividade total dos fatores da economia do Brasil é nulo ou negativo[/su_quote]
De um lado porque anula parte da ação do Banco Central ao fornecer crédito subsidiado que não responde às taxas de juros praticadas pela autoridade monetária. De outro, por servir primordialmente às grandes empresas do país – 70% da carteira do banco está representada por empresas com faturamento acima de R$ 130 bilhões.
Isso significa que empresas de grande porte, com capacidade de se financiar nos mercados, recorrem ao dinheiro barato do BNDES enquanto as firmas menores e de maior risco de crédito não gozam de igual benefício. Essas empresas, que recebem parcela bem menor de recursos subsidiados do BNDES, são obrigadas a recorrer ao setor privado, que, reconhecendo nelas o maior risco de crédito, cobra taxas mais altas. Esse é o chamado problema de seleção adversa.
Ora, se as operações do BNDES aumentam a seleção adversa, provocando a elevação dos “spreads” bancários, e ao mesmo tempo pressionam diretamente os juros ao entupir os canais de transmissão da política monetária, a instituição está aumentando o custo do capital, ao contrário do que diz.
Ao elevar o custo do capital, o banco desincentiva o investimento, reduz a produtividade da economia e prende o país numa armadilha perversa em que as políticas fiscal, monetária e creditícia tornam-se emaranhado para lá de pernicioso.
A literatura acadêmica recente sobre o BNDES não identifica nenhum ganho de produtividade para as empresas beneficiadas por esses empréstimos. Documentação extensa dos efeitos e não efeitos do BNDES pode ser encontrada em texto recente de Sérgio Lazzarini, Aldo Musacchio, Rodrigo Bandeira de Melo e Rosilene Marcon para a “World development”. Estudo de minha autoria, prestes a ser publicado pelo Peterson Institute for International Economics, mostra que o efeito do BNDES sobre a produtividade total dos fatores da economia brasileira é nulo ou negativo.
Está, portanto, mais do que na hora de o BNDES encontrar a sua verdadeira vocação para atender às necessidades do Brasil do século 21, em vez de apegar-se a argumentos para os quais não há comprovação inequívoca.
Fonte: Folha de S. Paulo, 3/9/2015
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