A maioria dos jovens brasileiros acredita que as pequenas ações podem mudar a sociedade, mas é baixa a porcentagem que crê nos partidos políticos. Para Bolívar Lamounier esse quadro é preocupante, mas não significa uma total descrença na capacidade de mudança. Ele indica uma forma diferente de buscar as transformações sociais. “Vejo nisso um enriquecimento da participação, uma reação, de certa forma, realista ao que se pode esperar da política”, diz.
Lamounier é cientista político e especialista do Instituto Millenium. Ele integra o Conselho Consultivo do Interamerican Dialogue e é autor dos livros “A classe média brasileira: ambições, valores e projetos de sociedade”, escrito em parceria com Amaury Souza (Campus /Elsevier, 2010), e “A democracia brasileira no limiar do século 21″ (Fundação Konrad-Adenauer, 1995), entre outros títulos.
Instituto Millenium – Pesquisa divulgada em junho revelou que 59% dos jovens brasileiros (com idades entre 18 e 24 anos) não têm preferência por um partido político, mas, por outro lado, 92% consideram que pequenas ações podem mudar a sociedade. Esses números indicam descrença no processo político ou mudança na forma de se atuar politicamente? Esse afastamento tem conseqüências para o sistema político?
Bolívar Lamounier – De fato, o momento que estamos vivendo contém muita perplexidade e descrença. Em parte, isso deve explicar os resultados da pesquisa. Devemos também observar que é bem baixo, atualmente, o grau de identificação da sociedade com os partidos – aqui estou me referindo a todos eles em conjunto: ao sistema partidário. O alto percentual de jovens que acredita em pequenas ações chama a atenção, sem dúvida. Para mim, esse fato não significa necessariamente que os jovens tenham sucumbido a uma descrença total. Vejo nisso um enriquecimento da participação, uma reação de certa forma realista ao que se pode esperar da política. Quer esteja funcionando bem ou mal, o sistema político não tem como processar todos os problemas e aspirações que surgem na sociedade. É, pois, natural que muitas pessoas estejam querendo ver o que se passa à sua volta e tentando encontrar formas de participar nesse nível.
Instituto Millenium – Qual é o impacto da corrupção para a relação do jovem com a política? A lentidão e a falta de punição pela Justiça, mesmo em casos de grande visibilidade, aumenta a descrença?
Bolívar Lamounier – Aumenta, sem dúvida, e não é para menos. Neste aspecto, nem dá para considerar os jovens como uma categoria em separado. A avalanche de corrupção que está ocorrendo é ressentida pelos cidadãos de todas as idades e grupos sociais. É uma coisa altamente desmoralizante, sem nenhuma dúvida.
Instituto Millenium – Os recursos tecnológicos foram fundamentais para o movimento 15M na Espanha, como para outros movimentos pelo mundo. Qual é o impacto desses novos recursos, tão bem dominados pelos jovens? No Brasil, o índice de pessoas com acesso à internet aumenta, mas não se vê grandes movimentos dessa natureza. A tecnologia é só um meio que necessita de uma juventude politizada para funcionar politicamente? O senhor identifica alguma especificidade na juventude brasileira?
Bolívar Lamounier – Claro, as novas tecnologias são um meio poderoso, mas são só um meio. Movimentos de protesto – todas as formas de participação, na verdade- dependem de um grau relativamente alto de politização. Mas dependem também de muitas outras condições, sendo a situação econômica quase sempre uma das mais importantes. A situação brasileira tem estado confortável desde os anos 90, com a inflação controlada e índices razoáveis de crescimento. Em comparação com a Espanha, onde o desemprego está em níveis extremamente altos, o Brasil está bem. Comparando com os países árabes, muitos dos quais vivem uma situação econômica complicada e têm regimes políticos autoritários, pode-se dizer que estamos muito bem. Tudo isso ajuda a compreender por que não temos tido movimentos populares de grande expressão.
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