Faz algum tempo, o jornalista Ancelmo Gois, do jornal “O Globo”, criou a expressão “Bolsa Miami”, para designar o benefício usufruído pela classe média com o dólar baratinho a facilitar as viagens. Seria a contrapartida do Bolsa Família.
Mas a verdade é que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está distribuindo muitas outras bolsas. Até 31 de março, por exemplo, tivemos o “Bolsa Carro” – o subsídio do imposto reduzido para baratear o preço dos automóveis. Clientela: as classes médias e ricas. Isso já foi dado.
No PAC 2, o governo dobrou a “Bolsa Casa Própria” – mais dois milhões de casas, a maior parte subsidiada para os mais pobres. Um pouco já financiado, o resto prometido.
Outra promessa é a “Bolsa Banda Larga”, a disposição anunciada de reconstituir a estatal Telebrás para fornecer internet barata aos mais pobres.
Existe também uma “Bolsa Empréstimo” – a determinação do governo para que os bancos públicos, Banco do Brasil (BB) e Caixa, especialmente, saiam em busca de clientes e tratem de emprestar dinheiro a juros menores.
Mas empresários também têm recebido seu quinhão – como a “Bolsa BNDES”, os empréstimos a juros subsidiados concedidos pelo banco. O Tesouro, por exemplo, tomou R$ 100 bilhões emprestados a juros de mercado, passou o dinheiro para o BNDES, que, por sua vez, empresta a companhias a juros menores.
De certo modo, há também variedades de “Bolsa Petrobrás”. A estatal privilegia empresas nacionais nas encomendas e, além disso, entrou de sócia em algumas grandes companhias, aportando precioso e barato capital.
Pode-se falar também de “Bolsa Fundo de Pensão”. Trata-se dos investimentos que os fundos de pensão estatais fazem nas maiores companhias privadas. Uma variante é a “Bolsa Fusão” – o apoio do governo, por meio de financiamentos e investimentos de fundos, para sustentar fusões e aquisições de grandes empresas privadas, como foi o caso da Oi.
E não se pode esquecer da “Bolsa Empreiteiras” – com esse amplo elenco de obras prometidas pelo governo. Reservadamente, executivos dizem saber que muita coisa não vai passar das intenções. Mas e daí? Algo sempre sai e é preciso disputar.
E assim o governo vai estendendo seus benefícios. Ora, dirão, não é isso mesmo que deveria fazer?
Observem. Primeiro, uma questão geral: o governo não tem dinheiro para beneficiar todo mundo. Assim, precisa escolher e aqui as coisas se complicam. Quem terá acesso aos financiamentos e investimentos públicos?
Não se trata de fazer acusações levianas, mas é evidente que essa situação abre espaço para ações não propriamente justas.
Além disso, é grande o risco de o governo apoiar empresas ineficientes, que só sobrevivem com o dinheiro e as encomendas do governo. Isso aumenta o custo Brasil.
Por outro lado, mesmo sendo o dinheiro limitado, quando o governo se encaixa na política de que o setor público é que comanda tudo, caso da gestão Lula, fatalmente gasta-se além da conta.
E a conta aparece. O Banco do Brasil já foi usado para a política de emprestar especialmente para os escolhidos do governo. Quebrou. E foi salvo pelo governo FHC que, em 1995, colocou R$ 9 bilhões, em dinheiro da época, para recapitalizar o banco.
Reparem, o banco estatal só quebrou depois de anos de maus negócios. Ou seja, se o BB da era Lula estiver emprestado equivocadamente, a conta vai aparecer lá na frente.
Enquanto isso, as bolsas dão a popularidade de Lula.
Agora, os juros.
Uma incerteza importante foi eliminada com a permanência de Henrique Meirelles na presidência do Banco Central (BC). A política monetária, com o regime de metas, que reduziu a inflação e a taxa média de juros, fica preservada.
E foi bom mesmo que Meirelles ficasse, porque tem uma “lambança”, com o perdão da palavra, a resolver.
Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), os oito diretores concordaram em que as expectativas de inflação estavam em alta. Poucos dias depois, o Relatório Trimestral de Inflação, importante documento no qual o BC dá uma geral na economia, observou que, mantida a atual taxa básica de juros, de 8,75% ao ano, a projeção de inflação para 2010 vai a 5,2% e a de 2011, a 4,9%, ambas acima da meta de 4,5%.
Ora, pelo regime de metas, se as expectativas e as projeções estão em alta, o Copom tem é que subir os juros básicos.
Por que não o fez?
As explicações técnicas não convenceram. Dizem que a maioria dos membros do Copom resolveu dar um tempo, esperar um pouco para iniciar o aperto dos juros. Ora, esperar por quê? Se todos concordam que os juros precisam subir, então o melhor é começar logo, para terminar mais cedo e subindo menos.
Assim, sobrou a explicação política. A reunião do Copom de março poderia ter sido a última presidida por Meirelles, então examinando eventuais candidaturas. Talvez já pensando nas repercussões eleitorais, Meirelles não quisesse deixar o posto com uma alta de juros. Ou, por outro lado, talvez tenha julgado melhor deixar que o ciclo de alta fosse iniciado pelo eventual novo presidente do BC.
Resolvida a permanência de Meirelles, o próximo lance lógico é a alta de juros na próxima reunião do Copom, no dia 28. Questão: a taxa sobe para 9,25% ou 9,5%?
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