Os dados sobre o relatório final do compromisso Educação para Todos, firmado em 2000 por 164 países integrantes da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), foram interpretados de forma diferente pela entidade e pelo governo brasileiro. De um lado, a Unesco considerou que o país atingiu apenas duas das seis metas do pacto internacional com vigência até 2015. Do outro lado, o Brasil ressalta que cumpriu todos os compromissos.
Entre as metas consideradas não cumpridas pela Unesco, estão a expansão do ensino na primeira infância, a oferta de aprendizagem de habilidades a jovens e adultos, a alfabetização de adultos e a qualidade da educação, em termos gerais. Os quesitos, ainda na avaliação da entidade, atendidos pelo Brasil foram a universalização do ensino fundamental e a garantia de equidade de gênero nas escolas.
Para Chico Soares, presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), autarquia do Ministério da Educação (MEC), as metas não traziam quantitativos a serem alcançados e, dessa forma, é errado considerar que o país não as atingiu.
— Temos que nos ater ao texto da meta. A primeira, por exemplo, falava em expandir e melhorar educação e cuidados na primeira infância. Em 2002, tínhamos 13 mil creches públicas, hoje temos 35 mil. Como não atingimos a meta? — questiona Soares. — Nós vamos apresentar os dados amanhã à comunidade internacional, no evento (sobre o pacto), com muita tranquilidade.
Mesmo em relação à única meta que tinha um dado quantitativo — elevar em 50% a alfabetização de adultos de 2000 a 2015 —, o presidente do Inep ressalta que o Brasil a atingiu em todas as faixas etárias, com exceção da população com mais de 50 anos. Em termos globais, segundo os dados oficiais, 8,5% das pessoas com 15 anos ou mais não sabem ler nem escrever no Brasil, índice que era de 12,4% em 2001.
Rebeca Otero, coordenadora de Educação da Unesco no Brasil, explicou que, para avaliar o avanço nas metas, foram consideradas variáveis relacionadas ao tema. Ela diz que a situação do Brasil “é muito preocupante”, assim como a do mundo, que também não atingiu todas os compromissos na avaliação da entidade. Rebeca não deixou, porém, de destacar melhorias consideráveis implementadas no período analisado.
— Acho que agora, com o esforço de um Brasil como Pátria Educadora, a gente conseguirá avançar mais. Não podemos esquecer que o Brasil é um país complexo, com um número elevado de escolas, com uma população de crianças e jovens muito grande, com um número expressivo de professores. É um país continental, que tem condições de cumprir os desafios que acordaremos para o próximo período — diz Rebeca.
Ela destacou que, entre outros pontos, pesou contra o Brasil a falta de creches para crianças de zero a 3 anos e de pré-escolas para as de 4 a 5 anos, na análise da meta relacionada à primeira infância. Dados oficiais mostram que cerca de 85% das crianças de 4 a 5 anos estão matriculadas. No caso das que têm até 3 anos, o índice não chega a 30%.
Na etapa seguinte, da educação primária, considerada pela Unesco os primeiros anos do ensino fundamental, o Brasil atingiu a universalização, representada pela taxa de aproximadamente 97% de matriculados (incluindo os anos finais). Apesar de os 3% restantes serem um índice residual, Rebeca afirma que é necessário buscar esses alunos, que são, sobretudo, indígenas, ribeirinhos, quilombolas e crianças pertencentes a outros grupos vulneráveis.
No caso da educação dos jovens, ainda na avaliação da Unesco, o Brasil não conseguiu demonstrar avanços nos pontos avaliados, tais como a oferta de cursos para habilidades técnicas. Os dados do ensino médio, que registram alta evasão escolar e distorção idade-série, também prejudicaram o país, segundo a entidade. Dos jovens de 15 a 17 anos, menos de 60% cursam o ensino médio, que é a fase adequada para a faixa etária.
Sobre a qualidade da educação, pontuações ainda distantes do considerado adequado em avaliações oficiais, bem como a necessidade de avançar na qualificação dos professores e na infraestrutura das escolas, colaboraram para deixar o Brasil fora dos países que atingiram a meta, de acordo com a representante da Unesco no Brasil.
Não foi incluída nenhuma meta sobre financiamento da educação no pacto liderado pela Unesco. Mas o relatório destacou o Brasil, ao lado de Etiópia e Nepal, como nações pobres que destinaram recursos consideráveis para o ensino. O Brasil cumpre o que é preconizado pela entidade: aplicação de 4% a 6% do PIB na área ou 20% do orçamento. Hoje, o país investe cerca de 6,5% do PIB.
O mundo, de forma geral, não atingiu as metas do Educação para Todos, afirma Rebeca Otero. Somente um terço alcançou todos os objetivos do pacto. E metade conseguiu chegar à meta mais visada: o acesso universal à educação primária.
— Houve uma diminuição considerável, quase pela metade, no número de crianças e adolescentes fora da escola, desde 2000. Incluímos, mundialmente falando, 34 milhões de crianças. Mas ainda temos 58 milhões sem acesso — destaca Rebeca.
Nem todos os países informam os dados requeridos para medir o avanço. Portanto, o relatório evita fazer comparações entre os países. O documento será discutido Fórum Mundial de Educação, em Incheon, na Coreia do Sul, de 19 a 22 de maio.
A ideia é firmar um novo compromisso, para valer nos próximos 15 anos. O custo da melhoria almejada já foi estimado. “São necessários US$ 22 bilhões anuais extras para garantir que alcancemos as novas metas educacionais que estão sendo agora estabelecidas para serem atingidas até 2030”, diz o relatório.
Metas
1 – Educação e cuidados na primeira infância (não cumprida, segundo a Unesco)
Expandir e melhorar a educação e os cuidados na primeira infância, garantindo, além de condições de saúde, acesso à pré-escola.
2 – Universalização da educação primária (cumprida, segundo a Unesco)
Garantir que, até 2015, todas as crianças tenham acesso à educação primária completa, que no Brasil corresponde aos anos iniciais do ensino fundamental.
3 – Habilidades para jovens e adultos (não cumprida, segundo a Unesco)
Garantir o acesso equitativo a uma aprendizagem adequada para habilidades laborais e técnicas.
4 – Alfabetização de adultos (não cumprida, segundo a Unesco)
Alcançar, até 2015, aumento de 50% no nível de alfabetização de adultos.
5 – Igualdade de gênero (cumprida, segundo a Unesco)
Eliminar as disparidades de gênero na educação primária e secundária até 2015.
6 – Qualidade da educação (não cumprida, segundo a Unesco)
Melhorar a qualidade para que resultados de aprendizagem mensuráveis e reconhecidos sejam alcançados por todos.
Fonte: Extra.
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