Um estudo inédito publicado na revista científica “The Lancet”, nesta segunda-feira, mostra que o Brasil tem avançado mais que a maioria dos países latino-americanos no desenvolvimento de seu capital humano, quando considerados os investimentos em saúde e educação. No entanto, dentre uma lista com 195 países, aparece apenas na 71ª posição. Ficou logo atrás dos Emirados Árabes Unidos (70ª) e à frente da Tailândia (72ª). A Finlândia é a primeira do ranking. O estudo foi conduzido pelo Instituto de Métricas e Avaliação da Saúde (IHME) da Universidade de Washington, nos EUA, a pedido do Banco Mundial.
— Nossas descobertas mostram a associação entre investimentos em educação e saúde e melhoria do capital humano ao desempenho do PIB, e que formuladores de políticas públicas ignoram esse fato por sua própria conta e risco — observa Christopher Murray, diretor do IHME.
O capital humano é um importante determinante do crescimento econômico porque influencia a produtividade do trabalho. Os pesquisadores observaram que as nações com maiores melhorias no nível de seus profissionais também tendem a ter um avanço maior de seu Produto Interno Bruto (PIB). O Brasil, apesar de ter subido 20 posições no ranking desde 1990, ainda tem um desempenho longe do considerado ideal pelo Banco Mundial, o que, segundo os pesquisadores, pode comprometer seu desenvolvimento econômico em longo prazo.
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– A Finlândia tem um desempenho impressionante e o Brasil está melhorando. Isso significa que, para o Brasil, independentemente do progresso importante, será preciso mais tempo para melhorar o capital humano – avalia Rafael Lozano, diretor de área e professor do IHME.
O presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, define o capital humano como “a soma da saúde, habilidades, conhecimentos, experiência e hábitos de uma população”. É um conceito que reconhece que nem todo trabalho é igual, e que a qualidade dos trabalhadores pode ser aprimorada se receberem investimentos. Para determinar a posição de cada país, o estudo considerou o número de anos em que um indivíduo pode trabalhar no pico de produtividade, entre 20 e 64 anos, levando em conta a expectativa de vida ajustada ao estado de saúde e os anos de escolaridade ajustados à qualidade da aprendizagem na escola.
O Brasil ficou atrás de Cuba (41º), Chile (50°) e Argentina (66°), mas à frente da maioria dos países da América Latina e do Caribe: Uruguai (77°) e Paraguai (96°), Peru (103°), México (104°), El Salvador (106°), Trinidad e Tobago (107°), Bolívia (112°), Equador (113°), Nicarágua (122°), Belize (123°), Suriname (124°), entre outros.
No componente de saúde do estudo, o Brasil avançou, em grande parte, devido ao aumento da expectativa de vida. Os pesquisadores analisaram quantos anos entre as idades de 20 e 65 anos (quando as pessoas são mais ativas na força de trabalho) podem esperar viver. Em média, os brasileiros viviam 41 desses 45 anos. Ele avançou da posição 108 em 1990 para a 95 em 2016. O estado de saúde da força de trabalho brasileira se destaca na América Latina. A medida de saúde funcional do estudo, que calcula o impacto no trabalho de doenças como retardo de crescimento, perda auditiva e visão ou doenças infecciosas como malária ou tuberculose, colocou o Brasil no 53º lugar, subindo 27 posições desde 1990, um avanço superior a quase todos os países do mundo.
No quesito educação, no entanto, o Brasil cai posições. Os brasileiros ficam menos anos na escola do que vários países da região: 11,9 anos entre os 18 possíveis medidos no estudo. Os brasileiros passam menos tempo na escola do que os cubanos, venezuelanos e panamenhos, mas mais do que argentinos, chilenos, bolivianos, peruanos, paraguaios, uruguaios e mexicanos, entre outros países. Isso coloca o Brasil na 81ª posição do mundo em termos de conquistas educacionais. Em 1990 estava ainda mais atrás, em 100º lugar no ranking mundial.
– O Brasil está indo muito bem no quesito saúde funcional, bem em nível educacional e pobre em aprendizagem – disse Lozano.
Este panorama é mantido se a qualidade dessa educação for analisada. O estudo mostra que o Brasil ficou em 98º lugar em 2016 no quesito aprendizado, superado por Cuba (26), Chile (65), Costa Rica (73), Trinidad (77) e Uruguai (79), mas destacando-se acima do México (89), Bahamas (101), Jamaica (102), Argentina (103) e muitos outros países. O Brasil avançou desde 1990, quando ficou em 105º lugar no mundo. O aprendizado é medido pela pontuação média dos alunos em testes internacionalmente comparáveis.
– Melhoramos muito no acesso a educação, temos menos analfabetos, aumentamos os anos de estudo, mas no quesito qualidade, nosso desempenho é muito ruim. Isso compromete nossa capacidade de inovação, de aumentar a produtividade. Pois é impossível falar dessas duas questões quando as pessoas desconhecem ciência e tecnologia e não sabem fazer contas – avalia Fernanda de Negri, pesquisadora do Ipea e especialista em Inovação.
Kim afirmou que medir e classificar os países pelo seu capital humano permitirá comparações ao longo do tempo, fornecendo aos governos e investidores indicações sobre onde é necessário investir.
Os destaques mais negativos do ranking foram os EUA, por ter caído do 6° lugar em 1990 para o 27º em 2016, pois teve progresso mínimo na maior parte dos itens avaliados e caiu nos anos médios de estudo, de 13 para 12 anos; além de o continente africano como um todo, que ocupa as dez piores posições do ranking.
Fonte: “O Globo”