O Brasil tem a segunda menor corrente de comércio dentre 141 países que tiveram o dado divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU). A entidade mede o tamanho da corrente de comércio – a soma das importações e exportações – em relação ao Produto Interno Bruto (PIB).
Na classificação em ordem crescente da corrente de comércio em 2017, o Brasil ficou em segundo, com relação de 24,1% do PIB, atrás do Sudão, com 21,5%, e seguido por Argentina e Paquistão, com 25% e 25,8%, respectivamente. Para representantes de entidades de classe, o dado mostra a necessidade de que o próximo governo estabeleça uma política de Estado na área de comércio exterior.
O dado mostra o quão ainda é fechada a economia brasileira, diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Para ele, mudar isso requer o estabelecimento de uma política de Estado para o comércio exterior. “Hoje não existe uma política no setor externo. Se ela existir, o Mdic [Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços], por exemplo, passa a ter força para criar uma diretriz aos órgãos dos demais ministérios. Hoje esses órgãos atuam de forma descoordenada, com exigências que criam burocracia”, diz ele. “É preciso também estabelecer metas que envolvam todos os órgãos.”
Leia mais:
Fabio Giambiagi: “Está na hora de encarar o desafio fiscal que temos pela frente”
Jorge Gerdau e Claudio Gastal: Importância da economia digital para o Brasil
Marcos Cintra: Pensamento tributário parou no tempo
Isso, diz Castro, ajudaria a criar uma cultura voltada ao comércio exterior entre as empresas. “As empresas brasileiras em sua maioria produzem para o mercado doméstico. Com exceção de poucas, elas só olham para fora quando há crise no Brasil.”
“O dado da ONU mostra uma anomalia”, diz José Pio Borges, presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). Ele defende uma mudança na política comercial brasileira, com medidas de liberalização do comércio que aumentariam a eficiência da economia, com melhora na produtividade e na competitividade.
O Cebri defende uma reforma das tarifas de importação como elemento central para um política de abertura comercial. A reforma, defende a entidade, daria maior racionalidade à estrutura de proteção da indústria. A mudança seria anunciada com antecedência e implementada gradualmente no decorrer de quatro anos. Ou seja, no período de um mandato presidencial. A proposta de reforma faz parte das sugestões para uma política de comércio exterior que o Cebri tem apresentado às equipes econômicas dos principais candidatos à Presidência, diz Borges.
A proposta do Cebri para a reforma inclui redução de tarifas de importação, com alíquota máxima de 15%, simplificação da estrutura de cobrança, redução de custo das importações de bens de capital e intermediários com impactos relevantes na produtividade.
Borges diz que há mais de 20 anos o Brasil aguarda um processo de abertura comercial com redução de tarifas condicionado a uma abertura multilateral, por meio da Organização Mundial do Comércio (OMC). “E todos nós sabemos o que está acontecendo com a OMC, sobretudo com Trump [Donald Trump, presidente dos Estados Unidos] se posicionando contra. O argumento de multilateralismo virou um álibi de setores protecionistas que não querem a abertura. Eles dizem que a abertura não pode ser orquestrada enquanto os acordos multilaterais não andarem. Isso não acontecerá nunca, e os maiores prejudicados somos nós mesmos.”
O Brasil, defende Borges, deve fazer uma abertura autônoma, com processo gradativo de redução de tarifas. Com isso, diz ele, pode se iniciar uma negociação com todos os parceiros comerciais em busca de contrapartidas. Com a China, exemplifica, a redução de tarifas poderia ser negociada em troca de um aumento na cota de exportação pelo Brasil de carnes. A política de abertura, porém, defende, não deve ser precondicionada a isso.
A redução de tarifas é assunto polêmico. Castro, da AEB, diz que essa iniciativa é importante, mas só poderia ser aplicada após medidas que elevem a competitividade brasileira. Nesse sentido, diz, reformas estruturais, como a tributária, e a melhora da infraestrutura são essenciais.
As entidades convergem para a necessidade de se estabelecer uma política de Estado para o comércio exterior. Isso, avalia Borges, nunca foi tão importante para a retomada do crescimento e dos ganhos de produtividade no país. O momento, diz, é mais do que oportuno. As relações com a China e com o restante da Ásia, acredita ele, devem ser fortalecida em razão do grande potencial de crescimento da região nos próximos anos.
“A guerra comercial da China com os Estados Unidos não é bem-vinda e já nos prejudicou com o caso do aço e do alumínio, mas cria outras oportunidades”, diz Borges. Para ele, o quadro favorece o aumento de exportação de soja e de petróleo, por exemplo.
Fonte: “Valor Econômico”