Existe no Brasil uma certa confusão entre os poderes da República. Pelo bem da democracia, ela deveria ser resolvida o quanto antes, sob pena de vermos as instituições andar em círculos – sem conseguir resolver o que é de sua responsabilidade por se meter a fazer o que é da seara alheia.
O Legislativo quase não legisla. Mas estufa o peito e canta alto toda vez que se encarrega de mostrar a cara numa CPI mais rumorosa.
Investigar deveria ser, por princípio, tarefa de órgãos específicos do Poder Executivo (a Polícia Federal) e do Judiciário (Ministério Público). Mas o Legislativo adora investigar tanto quanto o Executivo gosta de legislar.
Sim. O governo resolve tudo o que pode por Medida Provisória, tomando para si uma atribuição do legislativo.
O Judiciário é o mais centrado dos poderes. Mesmo assim, algumas de suas sentenças muitas vezes se confundem com o papel do legislador – sem falar dos momentos em que avança sobre prerrogativas do Executivo.
É o que acontece, por exemplo, quando os juízes se atribuem o poder de estabelecer os salários e os gastos dos magistrados sem dizer de onde sairá o dinheiro. Até mesmo a imprensa, que se orgulha da condição de “quarto poder”, tem esquecido com frequência assustadora o seu papel principal.
A função primária da imprensa não é investigar com a profundidade que se exige da autoridade policial; não é acusar malfeitores com a fundamentação que se espera do Ministério Público e muito menos sentenciar com o equilíbrio próprio do Judiciário. A missão primária da imprensa é apenas uma: informar.
Informar da maneira mais clara e abalizada possível os fatos que a sociedade deve saber. Nesse papel, os jornais até podem influenciar a sociedade e estimulá-la a cobrar dos três poderes alguma decisão sobre algum tema especial.
Mas o papel da imprensa é informar. Tentar fazer mais do que isso é leviandade. Pretender fazer menos é omissão.
O pior de tudo é que, muitas vezes, estimulada ou não pela imprensa, a própria sociedade dirige a uma instituição uma cobrança que deveria ter outro endereço.
Exemplo disso é a campanha para que a presidente da República vete o Código Florestal aprovado pela Câmara dos Deputados no último 25 de abril. Nesse caso, algumas entidades querem que a chefe do executivo legisle.
Atenção! Ninguém discute, aqui, o mérito da reivindicação nem a prerrogativa da presidente. Se Dilma entender que deve vetar, está no seu papel e ponto final.
A questão é outra: por que os ambientalistas não fizeram sobre os deputados uma pressão igual à que fazem sobre a presidente? Algo parece fora do lugar, não parece?
Muita gente, da mesma forma, cobra dos parlamentares dessa CPI que investiga as ações do bicheiro Carlos Cachoeira ações de investigação, que ela não tem competência para fazer, e ações de justiça, que ela não tem poder de fazer.
Os próprios deputados e senadores, o que é pior, agem como se tivessem o poder de substituir as outras instituições.
O país ganhará muito no dia em que o legislativo se empenhar em fazer leis, que o executivo se limitar a governar, que o judiciário apenas interpretar e a aplicar as leis e que a imprensa cumprir o papel fundamental de informar sobre o que se passa. É preciso por tudo em seu devido lugar: cada um no seu quadrado, como diz a música.
Fonte: Brasil Econômico, 14/05/2012
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