Não há tanto assim a celebrar com a queda da cotação do dólar em Reais dos últimos meses. Isso porque boa parte do comportamento da taxa de câmbio é ditada pelo ambiente externo, que permanece muito incerto. Pode haver reversão de tendência da taxa de câmbio a qualquer momento.
O risco parece assimétrico, de enfraquecimento do Real, e não o contrário. Isso porque o dólar está historicamente bastante fraco, o que pode não se sustentar devido à tendência de alta da taxa de juros pelo Federal Reserve no próximo ano, num contexto de ganhos de produtividade da economia americana. A economia mais competitiva leva a uma valorização da moeda no médio/longo prazo.
Nesse sentido, a valorização do Real recente não pode ser considerada como fruto de estratégia do Banco Central para conter a inflação. Nem pode ser interpretada como sinal efetivo de melhora do humor dos estrangeiros em relação ao Brasil, ainda que aparentemente haja sinais nesse sentido, como sugerido pelo melhor desempenho relativo da Bolsa recentemente. Em outras palavras, em um quadro de possível mudança da dinâmica externa, não haverá gatilho doméstico forte o suficiente para causar um descolamento duradouro do Real em relação ao dólar.
Há estreita relação entre os movimentos do Real e do dólar, este último ponderado por uma cesta de moedas; no caso, com sentido contrário: fortalecimento do dólar significa enfraquecimento do Real, e vice-versa. Desde 1999, com a implantação do regime de câmbio (quase) flutuante no Brasil, os ciclos das duas moedas têm sido bastante semelhantes; com exceção de 2002, quando o dramático quadro político pesou no mercado cambial doméstico.
O papel dos fatores domésticos se dá mais pela influência sobre a volatilidade da taxa de câmbio. O diferencial entre as taxas de juros doméstica e externa bem como o diferencial de crescimento podem influenciar o comportamento da taxa de câmbio, mas não parecem relevantes para explicar inversões de ciclo. Muito menos o déficit em transações correntes, que é consequência e não causa do ciclo cambial. Notícias no campo eleitoral, ainda que relevantes, tampouco devem causar reviravoltas na taxa de câmbio.
Apesar de controlar a taxa de câmbio ser o sonho de muitos, nossa história mostra que esta não é uma opção disponível para o país. Esse é um privilégio para poucos que contam com elevada taxa de poupança doméstica, o que é exatamente o oposto do caso brasileiro. Além disso, seria uma estratégia arriscada. Como determinar o nível ideal do câmbio? A taxa de câmbio é um preço relativo importante que causa transferência de renda entre setores. Câmbio fraco pode significar indústria (ou parte dela) feliz, mas em detrimento de consumidores infelizes, e vice-versa.
Aceitar o destino não significa, no entanto, total resignação. É importante que as ações do governo contribuam para uma menor volatilidade cambial. Maiores oscilações cambiais acabam reduzindo o bem-estar da sociedade e prejudicando as decisões de investimento.
Para além das intervenções do Banco Central para conter a volatilidade cambial, cuja eficácia é questionável mesmo no curto prazo, é importante perseguir políticas econômicas responsáveis para que a volatilidade do câmbio seja moderada.
Países com regimes fiscal e monetário mais sólidos e com ações consistentes, que por sua vez se traduzem em melhores fundamentos e inflação mais baixa, tendem a apresentar menor volatilidade cambial.
Há outro ganho advindo da estabilidade macroeconômica: o efeito da inflação sobre a taxa real de câmbio. Vale lembrar que, para a rentabilidade da indústria, o que importa é o comportamento da taxa real efetiva de câmbio, que é aquela que leva em consideração a flutuação do Real contra um cesta de moedas corrigida pelos diferenciais de inflação entre os países. A apreciação cambial em termos nominais é potencializada em termos reais com a inflação mais elevada. Da mesma forma, os eventuais ganhos da depreciação sobre a rentabilidade de exportadores tendem a ser corroídos se acompanhados de inflação mais elevada.
Já para consumidores, a variação do câmbio nominal é o que importa, pois sua variação tem implicações sobre a taxa de inflação e o poder de compra do salário. A depreciação cambial será ruim para consumidores, ao pressionar a inflação, mas talvez não seja tão positiva para as empresas por conta do efeito da inflação mais alta sobre a taxa real de câmbio.
Ao governo, cautela e conservadorismo na condução da política econômica para colher os frutos de uma menor volatilidade cambial. Caldo de galinha, digo, inflação baixa continua sendo excelente remédio, senão para todos os males, para muitos deles.
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