Tudo virou em algumas semanas. Depois de um primeiro trimestre traumático, quando vários foram os sinais desencontrados do governo, embates no Congresso, risco país em alta, câmbio próximo a R$ 3,30, futuro de juro pressionado, inflação nos 12 meses acima de 8%, iniciamos abril numa calmaria momentânea. Isto se refletiu no comportamento dos ativos.
A bolsa de valores, depois de “flertar” com 46 mil pontos no primeiro trimestre, beirou os 55 mil por estes dias, sinalizando poder chegar a 56 mil no curto prazo; o dólar recuou forte nas últimas semanas, no dia 16, negociado em torno de R$ 3,00; já o “risco País” (EMBI, Emerging Market Bond Índex), depois de ir a 360 pontos básicos em março, recuou nos últimos dias (-22 pontos no mês até o dia 16) negociado agora em torno de 300, após recuar a 280 pontos.
[su_quote]Merece destaque também o voto de confiança das agências de rating[/su_quote]
Sobre o saldo cambial, também observamos alguma melhora, mesmo com os investidores estrangeiros mais focados no carry trade, ou seja, no spread entre juro interno e externo, 12,75% contra próximo a zero. Em abril, pelo BACEN, o saldo cambial chegou a US$ 969 milhões até o dia 10 e no ano a US$ 5,73 bilhões, bem melhor do que o saldo líquido de US$ 29 milhões no mesmo período de 2014. Na bolsa de valores, o volume de ingresso externo foi ainda maior. No ano, o fluxo de capitais externos na bolsa era positivo em US$ 13,43 bilhões até o dia 10 de abril, com o ingresso neste mês chegando a US$ 3,56 bilhões, segundo a BMF Bovespa.
Esta virada parece ter sido causada por alguns fatores que merecem destaque. Vejamos.
Dentre os favoráveis, no mercado interno, a nomeação de Michel Temer para a articulação política, o que pode ajudar a aparar as arestas na complicada relação entre Executivo e Legislativo, entre Dilma Roussef, e Eduardo Cunha e Renan Calheiros, lideranças da Câmara e do Senado. Soma-se a isto, Joaquim Levy assumindo a articulação para a aprovação das medidas fiscais. No encontro do FMI em Washington foi elogiado publicamente pela diretora presidente da instituição, Christine Lagarde, que considerou o ajuste fiscal crível, achando que a economia, embora parada, deve começar a melhorar nos próximos meses, conforme este ajuste mostre resultado.
Em paralelo a isto, as lideranças do Congresso têm se mostrado mais cooperativas com o ajuste fiscal, embora não descartando mudanças. Parece certo que a Medida Provisória dos benefícios trabalhistas e previdenciários sofrerá alterações. Centrais sindicais e alguns setores dos partidos de esquerda rejeitam o prazo de carência de 180 dias para o abono salarial, assim como os 18 meses do seguro-desemprego, passando a carência para 12 meses. Na verdade, o que o governo tenta com isto é uma readequação dos mecanismos de concessão, dadas as distorções passadas.
Em 10 anos, entre 2004 e 2014, as despesas com segundo desemprego triplicaram de R$ 11,8 bilhões para R$ 35,5 bilhões e o abono salarial passou de R$ 3,7 bilhões para R$ 15,8 bilhões. Eram inúmeros os casos citados de pessoas de baixa qualificação, pelo mercado de trabalho aquecido no passado, que viviam trocando de emprego, para receber o seguro-desemprego, dado o curto prazo de seis meses. Algo teria que ser feito para corrigir estas distorções.
Merece destaque também o voto de confiança das agências de rating, o que deve dar um prazo ao Ministro Levy, pelo menos até o final do ano, para fazer os acertos e tocar o ajuste fiscal. A Fitch, no entanto, depois de colocar nossa perspectiva de estável para negativa, afirmou que se a recessão se aprofundar (ou se prolongar) será inevitável o rebaixamento do País pela baixa arrecadação e piora da dívida pública.
Sobre o desempenho dos indicadores econômicos, o PIB de 2014 acabou melhor do que o esperado, crescendo 0,2%, e o IBC-Br também surpreendeu em fevereiro, crescendo 0,36% contra o mês anterior. Isto, no entanto, não afasta a possibilidade, cada vez mais concreta, de recessão neste ano, mas talvez mais amena ou durando menos, desde que tenhamos o bom curso e a rapidez do ajuste fiscal. Muitos no governo acreditam ser possível uma retomada no último trimestre deste ano, se consolidando em 2016, desde que este ajuste apareça. Além disto, a economia brasileira, crescendo menos, representará uma demanda menor por energia elétrica, o que deve dar uma folga sobre o risco, ainda considerável, de racionamento. Este, por ora, não será necessário já que não estaremos crescendo.
Devemos também destacar para esta virada de humor doméstico, o anúncio, finalmente, agora no dia 22 em reunião do Conselho, de que será apresentado o balanço auditado da Petrobras.
No front inflacionário as notícias também são alvissareiras. Os IPCs estão em desaceleração, assim como os IGPs, mesmo “contaminados” no início da cadeia produtiva pelo câmbio depreciado, repassado para os preços agrícolas. O choque de oferta, ocorrido no primeiro trimestre, com os reajustes de tarifas de energia elétrica, deve ser menor nos próximos meses. Novos choques nos aguardam, como mais reajustes de energia elétrica, mas estes devem ser menores do que os realizados até o momento.
Por fim, no cenário externo acabou repercutindo favoravelmente a sinalização do Fed de adiar o início do “ciclo de elevação de juro”, dada a economia norte-americana ainda mostrando alguns dados contraditórios na retomada. A primeira elevação de juro deve ocorrer em setembro, no final do ano ou mesmo no primeiro trimestre de 2016. Tudo dependerá do comportamento da economia norte-americana, tendo-se em destaque o ritmo da atividade, o mercado de trabalho e a inflação, teimosamente em baixa, devido ao recuo do custo da energia.
Mesmo com esta “boa maré momentânea” nos mercados, não dá para baixar a guarda. A crise ainda não foi superada. Ainda existe uma série de fatores de risco no horizonte. Podemos destacar a economia em recessão, neste ano, segundo o FMI devendo recuar 1%, mesma projeção desta Consultoria, e ainda cercada de incertezas em 2016. Para que este cenário se desanuvie, algumas medidas fiscais precisam se mostrar efetivas e não podem sair do Congresso tão retalhadas, o que obrigará o ministro Levy a adotar novo “saquinho de maldades”. Neste caso, novas alíquotas acabarão criadas, piorando ainda mais a possibilidade de recuperação da economia.
Salientamos também a agenda do Congresso, com a Medida Provisória de terceirização em debate, os desdobramentos imprevisíveis da Operação Lava-Jato, com o tesoureiro Vaccari agora preso, o que deve causar danos ao governo e ao PT, caso ele se sinta isolado. Atenção também para os próximos indicadores fiscais e externos, assim como os níveis de confiança dos agentes, que podem ser revertidos caso os primeiros se recuperem bem.
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