São duas realidades diferentes. Nos EUA, a economia segue “rodando” num bom ritmo, o que deve levar o Fed a elevar o juro em algum momento entre o final deste ano e o início do próximo. No Brasil, o contrário acontece, com a economia estagnada, depois de vários estímulos de crédito anunciados, mas sem efeitos no curto prazo.
Claramente, o que se observa são políticas econômicas que seguem caminhos diferentes. Nos EUA, pela sua autonomia formal e transparência, o Fed possui credibilidade suficiente para operar os instrumentos de política monetária e balizar as expectativas dos agentes. No Brasil, o BACEN não parece ter tanta independência assim, subordinado a um governo, em ano eleitoral, que carece de credibilidade, devido às várias decisões equivocadas nos últimos tempos. Resultante disto, a inflação segue em patamar preocupante (em 12 meses no teto da meta, 6,5%), a confiança dos vários agentes da economia se encontra na “bacia das almas”, a taxa de câmbio ameaça passar de R$ 2,30 (nossa projeção é de R$ 2,40 ao fim deste ano) e a taxa de juros se encontra nas alturas, 11% anualizados. Ou seja, são vários “preços desequilibrados”, sintomas de uma economia desbalanceada.
Sobre o PIB dos EUA, o crescimento acabou maior do que o esperado, 4,2% em termos anualizados, acumulando no primeiro semestre 1,0%, sendo que no primeiro trimestre o recuo foi de 2,1%, em função de fatores climáticos. No bom desempenho do segundo trimestre, decisivos foram o aumento dos investimentos em 8,3% e do consumo das famílias em 2,5%, além da redução dos estoques e o crescimento das construções. Ou seja, o PIB norte-americano segue sustentado e balanceado pelos investimentos, pelo consumo, pelas inovações e pelos ganhos de produtividade. Ao final deste ano, deve crescer em torno de 2% e no ano que vem passar de 3%, desde que o ciclo de juros, a se iniciar “em breve”, seja neutro o suficiente para evitar uma reversão.
No Brasil, o contrário acontece. A retração do segundo trimestre foi de 0,6% contra o anterior e de 0,9% contra o mesmo trimestre do ano passado. No ano, o crescimento foi de 0,5% e em 12 meses de 1,4%. No primeiro trimestre deste ano houve revisão do PIB, que passou de 0,2% para -0,2%. Com isto, tecnicamente, estas duas taxas negativas configuraram uma recessão, mesmo que muitos, como a FGV e alguns grandes bancos privados, prefiram chamar de estagnação.
Claramente o que se observa nesta breve comparação, é que os EUA adota políticas mais balanceadas, mais market friendly e menos intervencionistas, deixando que a capacidade empresarial, as inovações e o consumo direcionem a economia norte-americana. Por aqui, excesso de intervenções, voluntarismos e improvisos, colocam a economia brasileira no atoleiro atual, com crescimento medíocre e baixa perspectiva de reversão (pelo menos no curto prazo).
Analisemos então com maior profundidade os indicadores do PIB brasileiro até o segundo trimestre e possíveis perspectivas para este ano e o próximo.
Pelo lado da oferta– O maior tombo coube ao PIB industrial, recuando 1,5% contra o trimestre anterior e 3,4% contra o mesmo do ano passado. Por subsetores, o da Construção Civil acabou com o pior desempenho, recuando 2,9% e 8,7%, respectivamente, seguido pela Indústria de Transformação, recuando 2,4% e 5,5%. No último, a maior queda aconteceu no setor automotivo, impactado pela demanda retraída internamente e a crise cambial argentina. Este fraco desempenho do segmento automotivo, inclusive, acabou afetando os bens duráveis e também os de capital, devido à menor produção de caminhões, com reflexo nos investimentos. Ainda sobre o fraco desempenho da indústria, houve menor produção de máquinas e equipamentos, mobiliário, aparelhos elétricos e metalurgia. Em contrapartida houve maior produção de alimentos e bebidas, perfumaria e indústria farmacêutica. Isto nos leva a crer que boa parte do fraco desempenho se deveu à Copa do Mundo, com paralisações por dois meses, em função dos cortes de dias úteis.
Em outros segmentos, o PIB da Indústria Extrativa Mineral cresceu 8% contra o mesmo trimestre do ano passado, em função dos bons desempenhos das extrações de petróleo e de minério de ferro. O PIB Agropecuário sustentou um pouco o PIB, crescendo 0,2% contra o trimestre anterior e se mantendo estável contra o mesmo trimestre do ano passado. Já o PIB de Serviços, geralmente imune a fortes oscilações, acusou o golpe da Indústria parada, recuando 0,5% contra o trimestre anterior e crescendo 0,2% contra o mesmo do ano passado.
Pelo lado da demanda– O pior desempenho ficou com a Formação Bruta de Capital Fixo, recuando 5,3% contra o primeiro trimestre e 11,2% contra o mesmo do ano passado. Já o Consumo das Famílias avançou 0,3% e 1,2%, respectivamente, decorrente da massa salarial crescendo 4,3% e do saldo de operações de crédito (+6,0%).
Pelo lado dos investimentos, reforçamos o quadro de estagnação da economia, com os empresários adiando suas decisões de investimento, deixando o animal spirit keynesiano de lado, dada as incertezas regulatórias e institucionais, além da proximidade das eleições. No caso do Consumo das Famílias, segundo a CNC, 60% delas estão endividadas, comprometendo 30% das suas rendas. Mesmo assim, o desemprego em patamar baixo e a renda preservada, de certa forma, serviram para manter o consumo em alta neste primeiro semestre de 2014. A taxa de investimentos, neste contexto de engavetamento de projetos, foi a 16,5% do PIB neste segundo trimestre, depois de registrar 18,3% ao final de 2013.
Investimento e poupança– Completando nossa análise, esta estratégia do governo, baseada nos estímulos ao consumo, acabou trazendo mais problemas para a economia brasileira. No acumulado em 12 meses, o crescimento do Consumo das Famílias chegou a 2,1%, contra o período anterior, e o do Governo a 2,2%, com os investimentos recuando 0,7%. Já as exportações avançaram 3,4% e as importações de bens e serviços 4,2%.
O problema é que este excesso de consumo não se refletiu em mais investimentos, com este aumento da Absorção Interna gerando piora nas contas externas. A necessidade de financiamento externo aumentou R$ 5,7 bilhões no segundo trimestre e o saldo externo negativo passou de US$ 24,5 bilhões para US$ 27,3 bilhões no ano. Sendo assim, os excessos de consumo interno (das famílias e do governo) acabaram reduzindo a poupança interna, se refletindo no aumento da externa, com o déficit em conta corrente do país em US$ 80 bilhões.
Perspectivas futuras– Difícil delinear como deve desempenhar a economia brasileira no restante deste ano e no próximo. Tudo leva a crer que o crescimento deva variar entre 0,5% e 0,7%, com a taxa de investimento parada nos 16% do PIB e a poupança em 14%. A hipótese de uma retomada da economia só deve se materializar em 2015 se o pacote de reformas (independente do governo eleito) for crível o suficiente para reverter a perda de confiança dos últimos meses. Se for um ajuste moderado, nada muda. Continuaremos empacados na mediocridade atual. Caso contrário, se forem definidas prioridades, se as reformas forem consistentes e transparentes, será possível uma retomada mais rápida, talvez ao fim de 2015.
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