Em obra clássica do direito político brasileiro, a inteligência superior de Afonso Arinos escreveu que “o partido é o lar cívico que deve existir sempre ao lado do lar doméstico”. Passados mais de 45 anos dessas linhas, resta evidenciado o quão distante a beleza teórica ficou da realidade da vida. Infelizmente, os partidos políticos brasileiros fracassaram; são institucionalmente falidos e praticamente nulos. Na verdade, Arinos acertou pela metade: os partidos viraram realmente um lar, albergando muitos corruptos, gatunos, mequetrefes que, ao invés de pensarem o bem do Brasil, apenas exaltam o que há de pior na política nacional.
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Objetivamente, o famigerado “mensalão” e a respectiva decadência petista selaram o fim de uma triste quadra partidária brasileira. Com a redemocratização, espaços de apelo popular foram preenchidos por diversas e plurais forças políticas de alta representatividade: Tancredo, Ulysses, Brossard, Montoro, Passarinho, Covas, Brizola, FHC, Lula, ACM, enfim, líderes não faltavam, embora qualitativamente distintos. Ou seja, individualidades as tínhamos, mas nos faltaram partidos autênticos e verdadeiros. Sim, a Constituição de 1988 falhou no regramento e diretrizes da atividade partidária. É preciso admitir o erro político-constitucional para, ato contínuo, repensarmos a estrutura do tecido institucional da democracia brasileira.
Não há dúvida de que o chamado Partido Novo e o embrionário Aliança pelo Brasil podem nascer e crescer com ambições e práticas mais altas. Todavia, a dinâmica do sistema eleitoral não é favorável, servindo para frustrar o eleitor. Primeiro, não há rigor na prestação de contas de campanha; segundo, a forma de distribuição dos fundos eleitorais não é justa nem transparente, formando autênticas valas de parasitismo e cartéis de dominação partidária; terceiro, ao invés de serem fontes de pedagogia e preparação à vida pública responsável, os partidos viraram fúteis empresas eleitorais.
Por tudo, a desordem estabelecida compromete a crença do povo nos compromissos da democracia, aviltando o poder transformacional da política e sua necessária capacidade de bem governar a complexa sociedade contemporânea. Aqui chegando, está chegada a hora de acabar com o monopólio partidário; permitir candidaturas independentes ou por representação autônoma de classe; instituir um sistema de financiamento honesto e, por fim, impor séria prestação de contas políticas, acabando com o cassino eleitoral que faz de Brasília a Las Vegas tupiniquim.
Fonte: “Jornal do Comércio”, 13/2/2020