Com citações da análise do historiador Jorge Caldeira e de um estudo do IPEA, além de sua experiência no campo da gestão pública, o economista Claudio Porto, fundador da consultoria Macroplan, especializada em planejamento e gestão, montou três cenários para o governo de Jair Bolsonaro que ora se inicia.
Para tanto, considerou o jogo de interesses de três grandes grupos de atores no país: os agentes econômicos, que demandam equilíbrio fiscal, crescimento sustentável e competitividade; as corporações, que reivindicam a manutenção de direitos especiais, privilégios e proteções; e a população, que hoje exige segurança, integridade, políticas e serviços públicos de qualidade e oportunidades de trabalho.
Porto alerta que não é possível superar o enorme passivo de problemas e desafios estruturais do Brasil em apenas quatro anos. Lembra que, como desataca o historiador Jorge Caldeira, na década de 1970, Brasil e China adotaram estratégias opostas de crescimento econômico.
O Brasil “mirou a economia interna e … previu construir, ao mesmo tempo, tudo o que faltava para o país virar uma grande potência… apostou no (mercado interno) e no Estado como o centro da economia … Já a China, país milenarmente isolado, anunciou que se atiraria aos negócios globais”.
A história é conhecida: em dezembro passado, a China celebrou os 40 anos das reformas econômicas que transformaram o país na segunda maior economia do planeta, com uma extraordinária redução de pobreza.
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O Brasil desde os anos de 1980 cresce menos que a média mundial (Brasil 2,4% x mundo 2,9%). A China criou um setor privado exuberante, que aproveitou as oportunidades da globalização. Citando Caldeira, Claudio Porto ressalta que as empresas globais chinesas compram empresas brasileiras em penca.
Agora, Porto vê o otimismo brasileiro ressurgindo, prenunciando que uma mudança disruptiva pode estar em curso no país. Os gargalos fiscais e financeiros destruíram as margens de manobra, e será necessário, segundo sua análise, ao menos o triplo deste tempo para construir uma saída para o crescimento sustentável.
Por isso, a Macroplan projeta três cenários para o país para o horizonte 2019-2030: (1) globalização econômica inclusiva; (2) crescimento com desigualdade; ou (3) pacto da mediocridade.
Este jogo leva a um trilema que envolve um conflito distributivo: o País terá de fazer uma escolha entre as três opções, das quais apenas duas podem ser conciliadas simultaneamente, pois, na visão de Porto, não há margem de manobra para acomodações no curto e médio prazos.
O melhor cenário antecipa uma mudança radical do Brasil: uma aposta firme e continuada na globalização econômica inclusiva. 40 anos depois da China, as principais forças políticas, econômicas e sociais brasileiras escolhem apostar na inserção global de nossa economia e conjugar o atendimento das demandas dos agentes econômicos competitivos com as da população em detrimento das corporações.
Nesse ambiente, o país empreende sucessivos ciclos de reformas macro e microeconômicas com uma abertura progressiva e expressiva da economia. Forte ajuste fiscal estrutural, redução e focalização do gasto público, desregulamentação, desestatização e parcerias público-privadas.
Um ambiente de negócios previsível e seguro estimula a concorrência e atrai capital externo de qualidade. Estado compacto, com função empresarial reduzida e mais intenso como regulador e provedor de segurança nacional e jurídica. Além da segurança pública, a agenda social privilegia educação básica, proteção social aos mais vulneráveis, e política trabalhista que estimula o emprego.
Com essas medidas, a economia acelera o crescimento. Mas são previsíveis fortes resistências e pressões contrárias, especialmente nos anos iniciais. O rendimento médio de servidores públicos e aposentados sofre perdas significativas. E vários segmentos da indústria, comércio e serviços desaparecem ou são absorvidos por cadeias globais.
Do ponto de vista econômico, este cenário se aproxima do “cenário transformador” de Cavalcanti & Souza Júnior, publicado na Nota Técnica 41 do IPEA (4º trimestre de 2018), que estima taxas de crescimento médias do PIB e do PIB per capita de 4,0% e 3,4% ao ano, respectivamente. (Amanhã, o perigo da mediocridade)
Fonte: “O Globo”, 12/01/2019