Acabou o carnaval. É hora de pensar no Brasil. Na história recente, o Brasil nunca foi confrontado por tantos problemas de natureza tão distinta. São eles as lideranças da sociedade civil e as instituições ao longo de 2016. Algumas dessas questões produzirão impacto transformador o funcionamento da política e da economia. Para facilitar o entendimento desse quadro consequências.
Na economia, o país caminha para um ano de uma perversa combinação de aumento da dívida pública e queda na arrecadação tributária. O pior dos mundos para a população é constatar quadro desolador e sentir que o governo não encaminha soluções consideradas consistentes pelos agentes econômicos e pela mídia. Sem a criação de um horizonte positivo, continuaremos em estado de letargia, à espera do fato novo positivo que teima em não vir.
As medidas que poderiam alterar tais expectativas dizem respeito a cortes orçamentários dramáticos (que são improváveis) e à aprovação de medidas de elevação de arrecadação (CPMF), além de corte de despesas (Reforma Previdenciária). Entretanto, falta convicção no Executivo para promover os cortes e apoio político para aprovar medidas amargas no Congresso. Existe ânimo e competência para tratar de tais desafios?
No curto prazo, o cenário para a retomada não é ainda claro. A única certeza é a de que a Operação Lava-Jato está provocando uma transformação no capitalismo brasileiro. Com entre o setor público e o empresariado vão mudar. Ambos produzirão grande impacto. Como sairemos desse imbroglio?
No campo político, a pauta está superlotada de dúvidas de extrema importância para o desenvolvimento do ano. Eduardo Cunha (PMDB-RJ) será afastado da presidência da Câmara? Quando? Pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ou pela ação do Conselho de Ética? Quando a comissão de exame do impeachment da Câmara começará a trabalhar? Março? Abril? Basta ler a contestação da Câmara para ver o problema criado pelo STF.
A liderança do PMDB será neutra, pró ou contra o impeachment quando indicar os membros da comissão sobre o tema? A única certeza é a de que o PMDB vai estar rachado. Independente de quem seja o novo líder.
O vice-presidente da República, Michel Temer, será reeleito presidente do PMDB? Tudo indica que sim. Após a escolha do novo presidente do partido, será que vai prosseguir a divisão do PMDB em três núcleos (Temer, Cunha e Renan Calheiros, presidente do Senado), que se combatem e se conciliam de acordo com as agendas? Tudo indica que Temer será reeleito. Porém, os conflitos no partido não vão acabar.
As investigações da Operação Lava-Jato vão prosseguir afetando o mundo político de forma grave? Quantos mais serão envolvidos? Como Lula e sua base de apoio reagirão a um eventual indiciamento do ex-presidente na Operação Zelotes ou na Lava-Jato? Qual é o efeito da degradação da imagem de Lula na cena política?
A judicialização da política, com as constantes interferências do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), vai continuar? Aparentemente, sim. Quais as consequências? Qual é o timing das decisões que afetarão os políticos e os partidos? Afinal quem restará viável para a construção de um novo modelo político?
No campo social, os desafios estão centrados nos efeitos que o desarranjo econômico impacta no ambiente político: popularidade da presidente, aprovação do governo e ressurgimento de manifestações contra a presidente Dilma Rousseff nas ruas. A intensidade da degradação pode ser o gatilho para manifestações intensas e tensões entre a base sindical e o governo.
No capítulo internacional, o desempenho econômico da China e o preço do petróleo são assuntos que preocupam o Brasil. A desvalorização do real transforma as empresas brasileiras em alvo de multinacionais que acreditam que o Brasil é “ too big to fail”. Porém, aqui também se acumulam mais dúvidas? Quando a economia vai começar a se recuperar de forma a compensar o risco dos investidores ampliarem sua exposição em um país tão cheio de incertezas?
Diante desse cenário, constata-se que o Brasil pós-carnaval começa o ano com dúvidas e sérias certezas: a economia ainda vai permanecer ruim por algum relação ao impeachment; as eleições municipais (sem doações empresariais) serão diferentes; e o capitalismo tupiniquim jamais será o mesmo depois da Operação Lava-Jato. Não será um ano fácil.
Fonte: O Globo, 11/02/2016.
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