Não é difícil entender por que o governo se viu obrigado a aumentar os impostos sobre combustíveis. Basta fazer as contas para perceber que o cumprimento da meta fiscal, um déficit de R$ 139 bilhões até dezembro, se tornou inviável.
A arrecadação subiu pouco no primeiro semestre deste ano, — 0,8%, para R$ 648,6 bilhões. A causa desse crescimento foram receitas extraordinárias, como royalties do petróleo, que andavam em baixa no ano passado. Descontadas elas, houve queda de 0,2%. Apenas em resultado disso, pode haver um buraco fiscal de até R$ 18 bilhões na meta.
Mas os problemas da Receita não param por aí. O Parlamento resiste a reonerar a folha de pagamento de empresas beneficiadas durante o governo Dilma, abrindo um buraco de mais R$ 2 bilhões. O atraso na privatização de estatais, como o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), abrirá outro de R$ 7 bilhões.
A segunda fase do programa de repatriação de recursos está aquém do esperado: até agora, a Receita recebeu apenas R$ 800 milhões de 836 contribuintes (o prazo se esgota em 15 dias), ante a expectativa inicial de R$ 6,7 bilhões — mais um buraco, de R$ 5,9 bilhões.
E, assim, de buraco em buraco, o governo vai abrindo um rombo gigantesco no Orçamento, que precisa ser coberto de alguma forma, sob pena de pôr em xeque a credibilidade da equipe econômica. Foram levantados apenas R$ 12 bilhões com receitas de precatórios atrasados — valor insuficiente para cumprir a meta fiscal.
O difícil é entender por que, para tapar o rombo, é preciso aumentar combustíveis, quando o Congresso está prestes a aprovar, por meio da Medida Provisória 783, um perdão para as dívidas das empresas que as dispensa de pagar 99% dos juros e multas relativos a atrasos nos impostos. É a segunda MP desfigurada na Câmara para atender aos interesses dos devedores. A primeira foi a 766, em março.
A expectativa inicial era arrecadar R$ 13,3 bilhões este ano com os pagamentos atrasados. Na forma como a MP passou na Comissão Mista do Congresso, serão apenas R$ 420 milhões. Uma reportagem do jornal “O Estado de S.Paulo” revelou ontem que parlamentares, cujas empresas devem R$ 533 milhões, também serão beneficiados.
Fora os parlamentares, outro grupo político beneficiado pelo governo são os funcionários públicos. No ano passado, o Executivo autorizou reajustes de 10,8% em dois anos nos salários do funcionalismo — para algumas carreiras, de até 53%. Neste ano, houve equiparação de outras carreiras não contempladas, com aumentos de vencimentos que chegam a 28% nos próximos quatro anos.
Eis, em síntese, a raiz das voltas que o Brasil vive a dar ao redor do abismo fiscal: quem tem poder ou exerce pressão — empresas, sindicatos do funcionalismo e, naturalmente, políticos — garante o seu. Para o cidadão comum — que não sonega, não tem apartamento não-declarado em Miami, não desfruta os privilégios legais do funcionalismo, nem ocupa assento no Congresso —, nada resta senão mais uma tunga no bolso.
O aumento de imposto, sobretudo no combustível, se refletirá nos índices inflacionários, além de ampliar a já assombrosa carga tributária que emperra a produtividade da economia brasileira e faz dos produtos vendidos os mais caros do mundo. Mesmo que seja um aumento pequeno, viola princípios pelos quais todo brasileiro deveria lutar, como o enxugamento do Estado, o fim do clientelismo e o corte de gastos públicos.
É intolerável que paguemos mais do que já pagamos. Como o Tea Party americano, a independência do Brasil também nasceu numa revolta contra impostos, a Inconfidência Mineira. Está na hora de fazer reviver os ideais dos inconfidentes, contra a derrama sorrateira que o governo não cessa de praticar contra a sociedade. Chega de impostos!
Fonte: G1, 20/07/2017.
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