Mal terminou a votação em primeiro turno da reforma da Previdência, e já começa a batalha da reforma tributária. Assim como na Previdência, não se discute a necessidade de mudanças nessa área, mas a escolha das mais adequadas. Há pelo menos cinco propostas na praça. E, embora se fale numa “conciliação”, o que se vê é uma troca de farpas entre seus autores, sobre as virtudes e os pecados de cada uma. Prenúncio de mais um capítulo da disputa de protagonismo entre o Congresso e o Planalto no encaminhamento da pauta econômica.
Em comum, as cinco propostas trazem o rótulo da simplificação. O que é perfeitamente compreensível, num sistema tributário intrincado e disfuncional como o brasileiro, que reúne mais de 90 impostos, contribuições e taxas, submetendo os contribuintes a um verdadeiro tormento simplesmente para cumprir suas obrigações. Trata-se também de um sistema altamente injusto, que prioriza a cobrança de impostos indiretos sobre os diretos e, por isso, acaba pesando mais no bolso dos pobres. Sem contar a falta de contrapartida em serviços públicos de qualidade para o tanto que se cobra da população – uma carga tributária superior a um terço do PIB.
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Mais do que necessária, a meta de simplificação pode, contudo, induzir a soluções distorcidas. Especialmente ao “ideal” do imposto único. A alternativa, há três décadas na cabeça do secretário da Receita, Marcos Cintra, aparece agora nas propostas de empresários bolsonaristas e do deputado Luciano Bivar (PSL). A ilusão é que o imposto único, uma espécie de super-CPMF, não só facilitaria a vida dos contribuintes como recairia mais sobre os “ricos” – já que seria cobrado sobre transações financeiras – e, de quebra, ainda permitiria economizar recursos com o desmonte da máquina da arrecadação de tributos.
Especialistas advertem, porém, que esse tributo incide em cascata sobre as operações financeiras, concentra a receita na União e, para ser eficiente, exige uma alíquota muito alta. Enquanto o imposto único puro “distrai” a plateia, cresce o embate entre os defensores da proposta do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), baseada nas teses de Bernard Appy, e a do governo, embora ainda não detalhada.
Na primeira, o chamado Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) substituiria cinco tributos atuais – PIS, Cofins e IPI (federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal) – e a receita seria repartida entre União, Estados e municípios. Na proposta do governo, a fusão também seria de cinco tributos, mas todos federais: PIS, Cofins, IPI, Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL) e IOF. E seria criada a Contribuição sobre Pagamentos (CP), que recairia sobre transações financeiras, nas duas pontas.
Corre ainda no Senado, sob o patrocínio do presidente da Casa Davi Alcolumbre (DEM-AP), uma proposta resgatada do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, que põe numa mesma cesta oito tributos federais, mais o ICMS (estadual) e o ISS (municipal) e prevê, em troca, dois grandes impostos – um estadual, sobre valor agregado, e outro federal, sobre operações com bens e serviços específicos.
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Para especialistas, se a reforma garantir a simplificação, e ainda acabar com a guerra fiscal, já fará um enorme serviço. Para o público em geral, no entanto, são duas as perguntas que mais interessam. Os impostos vão baixar? Vai ter imposto novo? Não é à toa que, na mais recente pesquisa CNI/Ibope sobre o governo Bolsonaro, a área de impostos foi a que teve a pior avaliação, com 61% de reprovação.
O governo vem fazendo acenos nessa linha, ao anunciar uma reformulação do Imposto de Renda (IR), que ampliaria a faixa de contribuintes isentos e reduziria a alíquota máxima para pessoas físicas e empresas. Mais: o próprio Bolsonaro tem dado sua palavra de que a CPMF, vista como símbolo da sangria fiscal, não vai voltar. Ou melhor, que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. A tal CP parece a CPMF, na sua forma de cobrança, mas não é um novo imposto – apenas substitui os existentes. Vai dar trabalho convencer o Congresso e a população.
Fonte: “Estadão”