O País estava se livrando da recessão, mas de repente parou. Parou por quê? Em economês, tudo indica que está faltando demanda agregada de investimento. O que precisamos fazer? É curioso que os pré-candidatos coloquem o foco dos seus discursos em temas-problema requentados e atemporais, tipo reforma disso ou daquilo, e não nas saídas que têm de ser trilhadas para recolocar o País na rota do crescimento no período do seu mandato, objetivo óbvio de qualquer país que se prezasse e com tantos problemas urgentes por resolver. Há, assim, uma chocante inversão da ordem correta dos fatores. É preciso começar pelo que é desejável, porque motivo não se materializa, e, finalmente, o que cada um cogita fazer para chegar lá antes de que seu mandato acabe. Se não, o tempo passa e, como se diz na gíria, “babau”…
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A bola da vez é a infraestrutura
Nesse contexto, não custa repisar a importância do investimento em infraestrutura em qualquer lugar, que serve para ampliar a capacidade de gerar certos serviços críticos e é um fator básico para o tão exigido aumento da produtividade geral, que no Brasil vem desabando desde os anos 80, principalmente num país como o nosso, com tamanha precariedade em uma área crítica como essa. (Em todas as avaliações sobre o posicionamento dos países nos rankings sobre infraestrutura que conheço, o Brasil está sempre muito lá atrás.)
Há vários problemas a equacionar, destacando-se o esgotamento das fontes de financiamento público (importantíssimo, quando se considera que em muitas subáreas o setor privado não tem como entrar) e o viés antiprivado que existe em nosso País ou, dito de outra forma, a baixa atratividade dos investimentos privados em infraestrutura. Sem dinheiro o primeiro não ocorre, sem atratividade o segundo também não surgirá. E lá vamos nós abrindo mão de um caminho claro para retomar o crescimento.
Tratei dos problemas que travam as concessões privadas na minha coluna de 10 de maio, sob os limites de um artigo da dimensão dos que aqui escrevo regularmente. Voltarei ainda ao tema com maiores detalhes. Aqui, concentrar-me-ei na parcela pública, em que uma rápida garimpada em estudos disponíveis mostra que dos anos 70 até o ano passado o investimento público total caiu – pasmem – de 10,6% para 1,8% do PIB. Chocante.
Uma consequência natural disso é a desabada do valor do estoque de ativos na infraestrutura de transportes e a escalada dos nossos custos logísticos, que alcançam também os piores valores na comparação mundial.
Vejo hoje que a Constituição de 1988 transferiu, “de mentirinha”, a competência de investir em infraestrutura para os Estados, dando-lhes a base de incidência dos à época extintos “impostos únicos”, que passaria a ser tributada pelo antigo ICM. Só que: 1) do início dos anos 90 para cá, a participação dos Estados nas receitas totais disponíveis caiu 5 pontos porcentuais, mantendo-se o quinhão da União e aumentando o dos municípios na mesma proporção da perda estadual, o que resultou de várias mudanças ocorridas ao longo do tempo, além do mero ajuste dos coeficientes de distribuição do bolo tributário; e 2) a despesa corrente explodiu em todas as esferas, ficando o investimento, sem uma vinculação de receitas equivalente à dos antigos impostos únicos, com as migalhas.
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Sem dados mais antigos, notem que o gasto com a Previdência dos servidores públicos estaduais praticamente dobrou, em termos reais, em apenas 11 anos, de 2006 a 2017, enquanto o PIB crescia somente 23,5% acima da inflação. Ou seja, numa palavra, era como se, grosso modo, estivéssemos trocando infraestrutura por Previdência pública, sendo esta uma das mais injustas do mundo.
Por isso mesmo é que venho defendendo o ajuste da Previdência pública, claro, sem calote puro e simples em ninguém, mas mediante a instituição de fundos de pensão equacionados atuarialmente, a exemplo do que já se fez em entes públicos de peso, como o Banco do Brasil, onde se criou a relativamente bem administrada Previ. (Vejam mais sobre o assunto em www.inae.org.br.)
Fonte: “Estadão”, 12/07/2018