Em última instância, todas as empresas de saúde existem para gerar engajamento. Entre médicos e pacientes, entre pacientes e programas de cuidados de saúde, entre pacientes e medicação. Por meio de engajamentos bem-sucedidos, podemos evitar que as pessoas adoeçam, podemos curar, reduzir custos sem sacrificar qualidade e podemos controlar doenças crônicas para uma vida melhor e mais feliz.
Acredito que o que irá diferenciar as organizações de saúde modernas não é apenas a capacidade de adotar tecnologia, que já virou uma commodity, mas a capacidade de superar seus pares em como facilitar a construção de conexões pessoais e de alto valor para usuários e médicos. Isso é o que realmente importa.
Como reduzir custos com saúde, como ser assertivo, como fornecer respostas mais rápidas e, no final das contas, como construir conexões pessoais e verdadeiras de forma sustentável. Imagino que essas sejam as questões que os melhores líderes de saúde discutem com suas equipes todos os dias.
E quando penso nisso, e em como entregar resultados superiores, acho que inteligência artificial (AI, na sigla em inglês) terá um papel central.
E o que é inteligência artificial? Para Costas Boussios, um cientista de dados baseado nos Estados Unidos, AI é uma dimensão da ciência de dados, um conjunto de métodos usados por cientistas de dados para criar novas ferramentas e soluções. O que precede AI, ele aponta, é a análise de dados, ou a utilização de modelos matemáticos para estudar conjuntos de dados, a fim de se formarem novas ideias. A conexão entre a análise de dados e a ciência de dados são os códigos ou algoritmos que viabilizam uma ideia em solução, em uma ferramenta que produzirá resultados para o negócio.
Tenho a impressão que a maioria dos líderes das empresas ainda vê AI como uma caixa-preta. Como um domínio exclusivo de alguns engenheiros ou matemáticos especializados, que trabalham, independentemente, em produtos secretos. Pode ser o caso para a maioria das empresas.
Os melhores líderes serão aqueles capazes de abrir a caixa-preta. E conseguirão oferecer AI como um serviço rotineiro e em escala para todas as pessoas de todas as áreas de uma empresa, para que possam resolver problemas de forma mais eficiente e eficaz em seus setores específicos.
E as empresas que conseguirem fazer isso serão aquelas que superarão seus concorrentes, oferecendo mais valor a seus usuários. E vencerão.
AI como serviço é igual ao Excel, por exemplo. Ainda me lembro de quando trabalhava em banco, e os analistas mais bem avaliados eram aqueles que dominavam o uso do Excel e traziam insights valiosos para auxiliar seus times na tomada de decisões.
Hoje, algumas grandes empresas de tecnologia já oferecem AI como serviço. Dependendo do perfil de uma determinada base de dados, um algoritmo recomenda qual a melhor técnica matemática para processar esse conjunto de dados. É tudo automático, sem interferência humana.
E se AI for uma commodity necessária e disponível para todos como um serviço automático, qual será a verdadeira vantagem competitiva? Acredito que será a mentalidade do usuário. A mente curiosa que está sempre em busca de uma forma diferente de melhorar as coisas, de fazer mais com menos. Pessoas que operam em modo de aprendizado contínuo. Justamente o modelo mental do cientista que está sempre em busca de uma nova descoberta. Ou do empreendedor que enxerga seu trabalho como um experimento científico sem fim. No método científico, o pesquisador desenvolve uma hipótese, testa-a por vários meios e, em seguida, modifica a hipótese com base nos resultados dos testes.
Organizações entenderão que o fracasso e o sucesso são igualmente importantes para o aprendizado. Não se trata de “run fast and break things”. Trata-se de evoluir rapidamente em direção a uma solução por meio de erros produtivos e controlados. Afinal, alguém já disse que quanto mais erramos mais próximos de uma solução estamos.
O papel da tecnologia na revolução da medicina
Essa mentalidade valoriza transparência radical que gera agilidade. Vê valor na integração para haver o compartilhamento de dados e inteligência. Toma decisões com base em fatos e dados. Fomenta o trabalho multidisciplinar entre equipes, fundamental na área da saúde, com múltiplas perspectivas: do paciente, dos colaboradores, dos médicos e da companhia.
Na área da saúde, acredito que as empresas vencedoras oferecerão soluções de engajamento personalizadas, em escala, para médicos e pacientes. Utilizarão AI em escala, de forma difundida. Tudo viabilizado por um modelo mental de aprendizado constante. AI não deve ser vista apenas como uma ferramenta, mas como uma mentalidade que pode salvar muitas vidas.
*Thomaz Srougi é fundador e executive chairman do dr. consulta, mestre em Políticas Públicas pela University of Chicago Harris School of Public Policy e Kauffman Fellow. Tem MBA pela University of Chicago Booth School of Business e concluiu o GMP da Harvard Business School
Fonte: “Época Negócios”, 09/07/2021
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