O próximo presidente começará seu mandato com um Orçamento apertado, no qual as despesas discricionárias (aquelas que podem ser cortadas) estarão no menor patamar em uma década. Cálculos da equipe econômica apontam que, em um cenário otimista, esses gastos ficarão em R$ 90 bilhões, o que já deixa a máquina pública muito próxima de uma paralisação. Mas o quadro pode se agravar em função de artigos que parlamentares incluíram na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019, que podem fazer as despesas discricionárias ficarem em torno de R$ 85 bilhões – bem abaixo dos R$ 124 bilhões projetados para este ano.
Para piorar, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) enviaram ao Congresso uma proposta para corrigir seus salários em 16,38%, o que terá efeito em cascata para o funcionalismo e pressionará as despesas obrigatórias, limitando ainda mais o restante do Orçamento. Antes da decisão do STF, no entanto, a equipe econômica já tentava minimizar estragos.
O ministro do Planejamento, Esteves Colnago, apresentou nesta quarta-feira ao presidente Michel Temer uma proposta para adiar o reajuste salarial dos servidores civis de 2019 para 2020. Segundo os cálculos do governo, a medida representa uma economia de R$ 6,9 bilhões para os cofres públicos. Também está nos planos sugerir o veto a trechos da LDO.
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Isso porque o mesmo Congresso que aprovou a criação de um teto para os gastos públicos tenta agora contornar as limitações impostas pela regra, segundo a qual as despesas não podem crescer acima da inflação. Integrantes da equipe econômica afirmam que será preciso recomendar o veto a uma série de artigos da LDO que foram incluídos pelos parlamentares enquanto tentavam preservar o orçamento de áreas específicas.
A maior preocupação é com o artigo 22 da LDO, que assegura que as despesas com educação em 2019 sejam iguais ao valor aprovado em 2018 mais a inflação. Segundo os técnicos, esse artigo foi uma forma de elevar os recursos para o Ministério da Educação, uma vez que ele assegura uma espécie de subteto para as despesas da pasta. O problema é que, se houver esse tipo de tratamento para a educação, o governo terá uma margem ainda menor para gerir as contas públicas e faltará dinheiro para outras áreas.
– Já estamos catando tampinha de garrafa. Com as discricionárias em R$ 90 bilhões já não se faz praticamente nada – disse um integrante da área econômica.
DISCUSSÃO FISCAL
Enquanto isso, as despesas com pessoal e encargos estão estimadas em R$ 322 bilhões no ano que vem. Já os desembolsos com o Regime Geral de Previdência somam R$ 635,4 bilhões.
No encontro com Temer, Colnago argumentou que o adiamento do reajuste dá ao governo fôlego para atender a demandas de ministérios como o da Educação. Uma possibilidade é fazer com que a educação receba, no ano que vem, o equivalente ao que conseguir economizar com o adiamento do reajuste de seus respectivos servidores. Já o restante dos recursos será distribuído para as demais áreas sociais e investimentos.
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Economistas ouvidos pelo “Globo” afirmam que o Congresso aprovou o teto, mas não está fazendo a discussão natural que deveria se seguir a esse tipo de medida: escolher prioridades dentro do Orçamento público.
– O teto foi uma medida para incentivar a melhor alocação de recursos. Mas o que está acontecendo é uma desvirtuação da regra, pois o próprio Executivo atua dentro do Congresso para preservar suas áreas de interesse de cortes – afirma a sócia da Oliver Wyman Ana Carla Abrão. – E o pior é que essa é uma proteção insustentável. Proteger áreas específicas só gera um engessamento maior do Orçamento, de forma que a gestão seja inviabilizada.
Para Ana Carla e o diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), Gabriel Leal de Barros, o próximo presidente terá de fazer uma ampla discussão sobre o arcabouço fiscal brasileiro, composto por várias âncoras fiscais que não têm condições que ser cumpridas até o fim do mandato.
– A gente não vai escapar de uma reforma da Previdência para conter as despesas obrigatórias, mas isso não é suficiente. É preciso uma ampla revisão das regras fiscais.
Para Barros, será necessário, por exemplo, discutir a vinculação do Orçamento ao salário mínimo. Hoje, quase 70% da Previdência são indexados ao salário mínimo. Também é o caso dos benefícios assistenciais, como Loas e abono salarial.
– Se não acabar com essa indexação, o próximo presidente não entregará todo o necessário – disse Barros.
Fonte: “O Globo”