O combate à corrupção deve ser feito independente de ideologias político-partidárias de esquerda ou direita. É o que defende o consultor da Transparência Internacional Guilherme France, que avaliou as diretrizes anticorrupção dos planos de governos dos 13 candidatos à Presidência da República apresentadas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“O combate a corrupção é uma pauta de esquerda e direita, não é uma pauta de um campo ideológico só, mas percebemos diferença nos tratamentos”, opina France, advogado e consultor do Centro de Conhecimento Anticorrupção da Transparência Internacional. Ele analisou os documentos dos 13 candidatos à Presidência.
O consultor da Transparência Internacional avalia que há um tratamento diferenciado entre os candidatos sobre o combate à corrupção, que evidencia uma contaminação ideológica que é problemática.
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“Os candidatos a direita tendem a estar muito confortáveis com o uso do Direito Penal, uma abordagem mais preocupada com o lado da punição do que os candidatos de esquerda, que preferem uma abordagem mais de questões como transparência, participação social, elementos mais preocupados com a prevenção.”
Segundo ele, outro ponto é que “os candidatos a direita, que tendem a preferir um modelo de estado menor, usam o combate à corrupção como forma de alavancar essa preferência”. “Usam a redução do estado, a privatização, o enxugamento da máquina pública, a desburocratização, como formas de combater a corrupção. Quando na realidade, não existe esse vínculo automático.”
Ideal. O especialista no assunto diz que a observação de internacional mostra que “muitos dos estados que estão despontando como os estados com menor corrupção” não são máquinas enxutas. “São estados que têm melhor pontuação no índice de percepção da corrupção são estados compreendidos tradicionalmente como de bem estar social, máquinas públicas bastante grandes, como países da Escandinávia, Dinamarca, Suécia. Estados tradicionalmente grandes, mas que não enfrentam problemas da corrupção. Então essa vinculação de reduzir o tamanho do Estado e reduzir a corrupção, ela não é automática”, avalia.
Para France, a experiência mundial mostra que é preciso ver o compromisso do combate à corrupção em todas as suas frentes. “Tanto com controle social, aumentando a transparência, quanto estabelecendo formas de aprimorar o sistema judicial para reduzir a impunidade.”
A Transparência Internacional encabeçou este ano um pacote de 70 medidas contra a corrupção – versão ampliada do pacote das 10 Medidas Anticorrupção que foi enterrado no Congresso, em 2017. O plano contempla propostas tanto preventivas, mais afinadas ao discurso das esquerdas, como punitivas, recorrentes da direita.
Em geral, as propostas dos 13 candidatos para o tema corrupção são carregadas de generalidades e frases de efeito, as promessas são de “ética”, “austeridade”, “transparência” e “tolerância zero à corrupção”.
Espécie de carta de intenções do candidato para registro da candidatura, elas valem de compromisso formal do candidato. O documento é item obrigatório a ser apresentado à Justiça Eleitoral pelos postulantes aos cargos de presidente, governador e prefeito, segundo determina a lei 9504/1997.
Com maior ou menor ênfase dentro do quadro geral de propostas, o enfrentamento à corrupção é tópico em 11 das 13 propostas entregues aos TSE no ato do registro da candidatura. Maior transparência de atos e contratos do governo, menor burocracia do Estado, mudanças nas leis penais e eleitorais, são pontos comuns da maioria das propostas anticorrupção dos candidatos.
Para France, os candidatos deveriam apresentar propostas mais detalhadas sobre o tema corrupção e tentar superar essa divisão ideológica no tratamento do tema.
Risco. “O tema combate corrupção é inevitável, a Lava Jato tem a vantagem de mostrar a capilaridade da corrupção de uma forma que ninguém imaginava. Mas há um oportunismo eleitoral, um uso indevido do tema, sem critérios. A grande discussão de como esse combate está sendo e será feito”, afirmou o criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakai, um dos críticos dos excessos da Lava Jato.
Para ele, “a questão penal não pode ser o centro das discussões eleitorais”. “Se isso acontecer, há um desvio sério na sociedade.” Segundo o criminalista, as campanhas têm adotado um discurso “pró punitivismo”. “Falta seriedade no debate. É inacreditável que alguns políticos que tem como base de apoio uma série de pessoas investigadas façam proselitismo em torno disso.”
VEJA PRINCIPAIS PROPOSTAS DOS CANDIDATOS
Álvaro Dias (Podemos) – Coligação Mudança de Verdade (Podemos, PSC, PRP e PTC)
Tolerância zero com a corrupção
Uma medida de limpeza por dia até acabar a burocracia (365 medidas em 2019)
Apoiar medidas de combate à corrupção, inclusive o que foi proposto no pacote das 10 Medidas Contra a Corrupção do Ministério Público Federal
Informatização dos processos internos do governo, como licitações
Pacto federativo para que cofres municipais não sejam mais surrupiados para financiar a ineficiência e a corrupção do Governo Federal.
Cabo Daciolo (Patriota) – Sem coligação
Não trata do tema corrupção
Ciro Gomes (PDT) – Coligação Brasil Soberano (PDT e Avante)
Manual de decência e de responsabilidade com o dinheiro público para equipe
Afastamento voluntário de ministros e cargos de confiança acusados de desvios e apuração idenpendente
Redução dos entraves burocráticos aos acordos de leniência.
Aperfeiçoamento dos mecanismos de responsabilização e de combate à corrupção e ao mau uso dos recursos públicos.
Instituição de mecanismos de controle social ativo e integrado com relação às organizações que são responsáveis pela defesa do patrimônio público (Controladoria Geral da União, Polícia Federal, Tribunal de Contas da União, Ministério Público, etc.).
Criação de unidade de controladoria no Poder Legislativo.
Criação de unidades anticorrupção ad hoc em grandes obras, com controle social.
Geraldo Alckmin (PSDB) – Coligação Para Unir o Brasil (PSDB, PTB, PP, PR, DEM, Solidariedade, PPS, PRB e PSD)
Combater a corrupção, ‘tolerância zero’
Combater o desperdício, reduzindo o número de ministérios e cargos públicos e cortando despesas do Estado, bem como mordomias e privilégios
Criar mecanismos de avaliação e de mensuração da qualidade e da eficiência dos serviços públicos
Criar e desenvolver o ‘Projeto Cidadão’: menos regras, menos certidões, mais confiança na idoneidade dos cidadãos e punição rigorosa para quem fraudar
Guilherme Boulous (PSOL) – Coligação Vamos Sem Medo de Mudar o Brasil (PSOL e PCB)
Melhorar o controle público sobre a transparência em contratos com grandes grupos econômicos
Realizar acordos judiciais para transferência de ações das empresas controladoras de grandes negócios envolvidas em processos de corrupção, como do setor de petróleo e de defesa, para o setor público
Radicalizar a transparência de informações no setor público
Criar órgão fiscalizador dos processos eleitorais composto pelos partidos e organizações da sociedade civil, com dotação orçamentária própria
Fim da reeleição indefinida para os cargos do legislativo
Fim do sigilo fiscal dos gastos tributários no que envolve contratações públicas de serviços privados
Jair Bolsonaro (PSL) – Coligação Brasil Acima de Tudo, Deus Acima de Todos (PSL e PRTB)
Reduzir número de ministérios e acabar com o aparelhamento, o loteamento político, acabar com dinheiro carimbado para pessoas, grupos ou entidades
Acabar com a burocracia do Estado
Recuperar as 10 Medidas de Combate à Corrupção e reenvia-la ao Congresso
João Amoedo (Novo) – Sem coligação
Fim do fundo partidário, do fundo eleitolra e da propagandas eleitural gratuita
Redução do número de congressistas em um terço (ficariam 54 senadores e 342 deputados), de deputados estaduais e vereadores
Fim do voto obrigatório
Instituições independentes, com custo baixo, transparência total e resposta rápida às demandas do cidadão.
Fim definitivo dos privilégios e da impunidade aos políticos corruptos.
João Goulart Filho (PPL) – Sem coligação
Combate sistemático à corrupção e defesa efetiva da Operação Lava Jato e da Lei da Ficha Limpa
Realizar uma Reforma Política e Eleitoral que minimize a interferência do poder econômico na vida pública
Remoção de políticos e partidos inidôneos
Fim do foro privilegiado e do Fundo Eleitoral
José Maria Eymael (DC) – Sem coligação
Aplicar os artigos da Conferência Mundial contra Corrupção de Mérida
Punir toda e qualquer atitude de corrupção.
Aplicar na administração federal, na contratação de bens ou serviços, o Seguro Performance Bond, na forma que dispuser a legislação pertinente.
Aplicar na administração federal, no combate a todas as formas de corrupção a estratégia de Compliance, a qual pressupõe três ações fundamentais: prevenção, detecção e correção, para barrar ilicitudes.
Coligação O Povo Feliz de Novo (PT, PCdoB e PROS)
Fim do auxílio-moradia para magistrados, membros do Ministério Público e demais agentes públicos que possuam casa própria e residam no domicílio ou que usem imóvel funcional
Redução do período de férias de 60 para 30 dias para todas as carreiras que conservam esse privilégio
Instituir tempo de mandatos para os membros do STF e das Cortes Superiores de Justiça, não coincidente com a troca de governos e legislaturas
Rever texto de leis, como a Lei Anticorrupção e a Lei das Organizações Criminosas, para evitar que sejam usadas de forma desvirtuada contra a democracia, os direitos e garantias individuais. Cita mudanças nos acordos de leniências de empresas e nas delações premiadas
Maria Silva (Rede) – Coligação Unidos Para Transformar o Brasil (Rede e PV)
Valorização dos mecanismos de participação e controle social nas políticas públicas
Composição do governo com base em critérios de competência e idoneidade
Informatização e transparência dos serviços públicos, com uso tecnologias para ajudar a combater a corrupção e promover a desburocratização e o aumento do controle social
Fim da reeleição para cargos executivos, limitação de dois mandatos consecutivos para cargos legislativos, fixação de todos os mandatos em 5 anos, a partir de 2022 e o fim da suplência para o Senado
Defesa da revisão das regras de financiamento de campanhas e de distribuição do tempo de propaganda eleitoral
Blindar os órgãos de controle interno de nomeações políticas
Exigência de ficha limpa para ocupação de cargos no serviço público
Criminalização do caixa dois eleitoral e do enriquecimento ilícito de agentes públicos
Fim do foro privilegiado e da indicação política para órgãos de controle externo
Extinção da aposentadoria compulsória para juízes e procuradores como pena.
Henrique Meirelles (MDB) – Coligação Essa é a Solução (MDB e PHS)
Não trata diretamente do tema corrupção
Fala em fortalecer e ampliar os projetos de cooperação na área de segurança, voltado ao combate do crime transnacional, ao terrorismo, ao tráfico de pessoas e drogas
Vera Lúcia (PSTU) – Sem coligação
Prisão e o confisco dos bens de corruptos e corruptores
Tomar empresas envolvidas em corrupção e colocá-las sob o controle dos trabalhadores.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”