A proposta preliminar que a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, apresentou para a reforma da Previdência é bem mais dura que a versão do governo Michel Temer e dificilmente passará ilesa pelo Congresso. Eis os principais pontos do documento, revelado pelo jornal “O Estado de S. Paulo”:
– Idade mínima de 65 anos para a aposentadoria de homens e mulheres, estabelecida gradualmente ao longo de um período de dez anos. As regras do setor privado passariam a valer para o público;
– Contribuição mínima de 40 anos para a obtenção do benefício integral. O parcial começaria com 60% para quem contribuísse por 20 anos, aumentando progressivamente;
– Período de transição de cinco anos, em que ainda será possível aposentar-se por tempo de contribuição. A regra de pontos em vigor hoje seria usada para definir quem estaria apto;
Leia mais de Helio Gurovitz:
Cargo de Guedes é mais político que econômico
Um começo atabalhoado
A alma do governo Bolsonaro
– A idade mínima seria de 60 anos para professores e trabalhadores rurais, 55 anos para policiais e militares. Para estes, seria criada uma alíquota previdenciária;
– Políticos também ficariam submetidos à aposentadoria aos 65 anos. Ficaria vedado a novos parlamentares o plano previdenciário dos congressistas;
– Uso dos recursos do FGTS num novo sistema em que cada beneficiário contribuirá para uma conta individual (capitalização). As regras seriam definidas por projeto de lei;
– Regras distintas para benefícios assistenciais para deficientes e idosos, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que deixaria de ficar vinculado ao salário mínimo. Ficaria vedado o acúmulo, e as regras seriam definidas por uma lei complementar;
– Estados e municípios ganhariam dois anos para editar leis resolvendo o próprio déficit. Contribuições extraordinárias entrariam em vigor caso se torne impossível bancar os benefícios futuros com as atuais;
A economia prevista pelo projeto ao longo de dez anos é estimada em R$ 1,3 trilhão, bem mais que os R$ 800 bilhões da proposta inicial do governo Temer, reduzidos pelo Congresso a menos de R$ 400 milhões, à medida que ela foi sendo desidratada pelos parlamentares.
A proposta de Guedes até supera as expectativas do mercado, que vinha falando em economias de US$ 1 trilhão em uma década. A dúvida é até que ponto ela resisitirá no Congresso. Vários dos pontos propostos já eram previstos no projeto encaminhado pelo governo Temer, mas acabaram dizimados nas negociações parlamentares.
Entre eles, estão a criação de uma idade mínima idêntica para homens e mulheres, a desvinculação do BPC do salário mínimo e regras duras de transição que acabaram suavizadas. A proposta de Guedes, ainda mais dura, vem obviamente com alguma gordura para a negociação.
+ Sebastião Ventura: O Senado sem nada
Um obstáculo será a articulação política diante de uma legislatura ainda novata, em que vários parlamentares foram eleitos graças à capacidade de mobilização nas redes sociais, mas estão desacostumados a lidar com temas impopulares que envolvem perdas para o eleitorado, como a reforma da Previdência.
O próprio Bolsonaro, autor de várias declarações ambíguas sobre o tema, não examinou o texto em detalhes. Seu endosso será essencial para garantir o apoio não apenas de deputados e senadores, mas também da população que acaba de elegê-lo e precisa ser convencida da necessidade do sacrifício em nome do futuro do país.
Cada grupo de pressão tentará garantir seu quinhão de concessões. Dependerá da capacidade de articulação dos governistas a manutenção da maior parte do texto intacta. Por ter ainda de enfrentar o roteiro de comissões e prazos constitucionais, tanto na Câmara quanto no Senado, não há como, numa perspectiva realista, imaginar a aprovação de nada antes do segundo semestre.
Há uma sabedoria estratégica em apresentar uma proposta mais dura ao Congresso. Como a pressão pela aprovação das mudanças é enorme, dificilmente as concessões implicarão um texto tão desidratado quanto o do governo Temer. O que passar deverá ser mais benéfico para as contas públicas e para o país. A primeira e mais importante batalha do governo Bolsonaro acaba de começar.
Fonte: “G1”, 05/02/2019