Das dez novas diretrizes da política externa brasileira anunciadas pelo ministro José Serra na semana passada, seis tratam de temas diretamente ligados à economia e ao comércio internacional. Destacam-se:
1. A retomada, já tardia, dos acordos bi e plurilaterais após o fracasso do multilateralismo da OMC;
2. A reestruturação do Mercosul, fortalecendo o livre-comércio intrabloco e construindo novas pontes para fora: Europa, países da Aliança para o Pacífico (Chile, Peru e México), EUA e Japão;
3. O foco na remoção das barreiras não tarifárias que dificultam o acesso dos nossos produtos ao mercado global. Esse ponto é crucial para o setor de alimentos e agronegócio, que responde por 46% das exportações brasileiras;
4. A ênfase na boa análise econômica, no aumento da produtividade e na ampliação da geometria das negociações para além do Sul-Sul, visando construir reciprocidades equilibradas nas concessões.
Em suma, economia e comércio finalmente ocuparão um espaço privilegiado na nova política externa.
Junto com as novas diretrizes, vem a necessária reestruturação da área de comércio exterior no governo: de um lado, a Camex, agora vinculada à Presidência da República, ganha estatura e potencial de coordenação; do outro, o vínculo da Apex ao Itamaraty permitirá explorar sinergias nas estruturas de promoção comercial das duas entidades, até aqui latentes.
Mas tão importante quanto a nova agenda é o entendimento das reais necessidades e estratégias do setor privado no exterior, por meio de suas empresas e associações. Comparativamente a outros países, a presença física do setor privado brasileiro no exterior é ínfima, seja em termos de empresas internacionalizadas, associações de classe, câmaras de comércio etc.
Na política comercial, o Brasil sempre teve imensa dificuldade para chegar a consensos, definir prioridades e coordenar ações público-privadas, principalmente em acesso a mercados. Autopromoção, corporativismo e dirigismo ainda são marcas registradas de alguns órgãos governamentais, talvez porque boa parte do setor privado não sabe direito aonde quer chegar e como.
Mais importante do que relançar grandes negociações comerciais que podem levar muitos anos para se concretizar, governo e setor privado deveriam priorizar atividades cotidianas que mesmo países menores que o Brasil executam com maestria. Exemplos são:
– Levantamento dinâmico das principais barreiras comerciais e de imagem que afetam o comércio em cada mercado relevante, concentrando ações no que for de fato relevante.
– Mapeamento e engajamento de stakeholders em cada país – governos, associações, formadores de opinião, mídia, ONGs etc.
– Defesa coordenada de interesses setoriais e campanhas de esclarecimento e comunicação institucional.
– Produção de material técnico de qualidade em diferentes formatos e idiomas, além da organização de workshops, missões e visitas.
– Construção de parcerias estratégicas de médio e longo prazo com países-chave, desenvolvendo ações que ampliem a integração internacional das cadeias de suprimento, com ganhos compartilhados de eficiência e sustentabilidade.
Temos à frente oportunidade única para rever objetivos, programas e ações do governo e do setor privado na área do comércio exterior. Estou convencido que, com um pouco mais de foco e gestão, obteremos ótimos resultados, no curto prazo.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 28 de maio de 2015.
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