*Leticia Moreto
A proposta de reforma tributária aprovada em 2023 representa uma mudança estrutural no modelo de arrecadação e repartição de tributos no Brasil. Um dos pontos centrais é a eliminação progressiva dos benefícios fiscais concedidos por estados e municípios, especialmente os vinculados ao ICMS. Com isso, surge uma dúvida legítima: se os incentivos fiscais eram usados como principal estratégia de atração de empresas, como os estados — especialmente os menos industrializados — poderam competir por novos investimentos em um cenário sem esse instrumento?
A guerra fiscal, alimentada ao longo de décadas por isenções e reduções tributárias locais, criou distorções profundas na economia brasileira. Empresas passaram a migrar de um estado para outro em busca do menor custo tributário, e não necessariamente da melhor infraestrutura, logística ou ambiente de negócios. Muitos governos estaduais transformaram os incentivos fiscais em moeda de troca, abrindo mão de critérios técnicos e sustentáveis para atrair empresas de forma imediatista. Embora isso gerasse alguns empregos pontuais, raramente consolidava cadeias produtivas locais ou impulsionava desenvolvimento de longo prazo.
Além disso, sob a ótica liberal, a concessão de benefícios fiscais seletivos representa uma distorção grave do papel do Estado na economia. O Estado não deve interferir diretamente no funcionamento do mercado, muito menos beneficiar setores específicos em detrimento de outros. Ao conceder isenções a determinados grupos, o governo acaba criando um ambiente artificial, onde a vantagem competitiva não está na eficiência ou inovação, mas no acesso privilegiado a políticas públicas. Isso fere o princípio da livre concorrência e desestimula a meritocracia empresarial. Do ponto de vista liberal, o ideal seria um ambiente de negócios com regras universais, sem privilégios e com baixa interferência do Estado, permitindo que as empresas prosperem por mérito próprio e não por incentivos governamentais negociados nos bastidores.
Nesse viés, Com o fim dessas isenções, os estados precisarão repensar suas estratégias de competitividade. E isso pode ser uma oportunidade. Atrair empresas por meio de melhorias reais — como infraestrutura logística, qualificação de mão de obra, desburocratização, acesso a crédito e segurança jurídica — é uma alternativa mais duradoura e menos dependente de renúncias fiscais se aproximando de uma realidade de mercado mais liberal. Um ambiente de negócios estável e transparente, onde regras valem para todos, tende a atrair investimentos mais sólidos e comprometidos.
Portanto, o fim dos incentivos fiscais estaduais exige uma mudança dos gestores públicos, ao sair do modelo de concessão pontual e desigual, e terem que adotar políticas estruturantes. O desenvolvimento econômico não pode estar atrelado a exceções tributárias, mas sim a condições reais de crescimento. Estados que investirem em educação, infraestrutura e ambiente empreendedor serão mais competitivos a médio e longo prazo do que aqueles que apenas reduziram impostos por negociação.
Letícia Porto Moreto é associada trainee do IBEF Academy, possui formação técnica em Administração pelo Instituto Federal do Espírito Santo (IFES) e graduanda em Administração de Empresas pela FUCAPE Business School.