* Por Lucas Adriano & Victor Oliveira
Desde os anos 90, a questão previdenciária vem se constituindo no grande desafio para os governos franceses. Em um país extremamente organizado e combativo quando o assunto envolve questões sociais, a tentativa de alterar o regime da previdenciário francês já deteriorou a popularidade de políticos de todas as esferas ideológicas, de socialistas a conservadores.
O sistema previdenciário da França possui algumas semelhanças com o do Brasil atual. Entre as semelhanças está o estreitamento da base da pirâmide etária, além da existência de diversos regimes de previdência “especiais” destinadas para algumas categorias profissionais com certos privilégios. Considerando o envelhecimento da população e o aumento da sobrevida – superior a 80 anos -, juntamente com os regimes previdenciários dotados de privilégios – em um país já tradicionalmente conhecido por subsidiar fortemente diversos setores de sua economia -, torna-se fácil entender o tamanho do problema que representa o sistema de previdência francês.
Sendo assim, a primeira grande tentativa de mudança na previdência francesa ocorreu em 1995, durante o governo de Jacques Chirac. A proposta de Chirac previa a alteração dos regimes de previdência especial, principalmente em relação às categorias que tinham acesso antecipado ao seguro social. Em contrapartida ao projeto, foram organizadas manifestações gigantescas – com direito a carros incendiados – que resultaram no recuo do governo ao projeto e consequentemente, jogou para frente a necessidade de reforma.
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Houveram novas tentativas em 2003 e 2007, novamente frustradas por manifestações populares, instigadas por movimentos sindicais organizados. Assim, apenas em 2010, no governo de Nicolas Sarkozy, realizou-se amplas reformas na previdência francesa. O preço pago por Sarkozy foi o derretimento da sua popularidade, algo que ficou bem claro nas eleições francesas pós reforma previdenciária.
Sarkozy aumentou a idade mínima para obtenção da aposentadoria para 62 anos e aumentou de 65 para 67 anos a idade para se ter direito ao benefício integral, e teve a Reforma complementada em 2013, quando o presidente François Hollande, do Partido Socialista, aumentou o tempo de contribuição mínimo para 43 anos. A regra vale apenas para os nascidos a partir de 1955. Evidentemente, a base social de Hollande não aprovou essa e outras reformas promovidas pelo seu governo, que acabou com popularidade inferior a 10%, com o candidato socialista à Presidência, Benoit Hammon, amealhando apenas 6% dos votos.
Atualmente é o governo de Emmanuel Macron que tem a árdua missão de promover alterações no sistema previdenciário francês. A proposta de Macron é revolucionária no contexto francês, pois pretende criar um regime único de Previdência para todas as categorias. Atualmente, a França possui 42 regimes diferenciados de aposentadoria, que acabam beneficiando setores do funcionalismo público e Forças Armadas, problema semelhante ao do Brasil. Em contraposição, Macron não pretende aumentar a idade mínima para aposentadoria.
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Por conta dessa reforma e outras, como a tributária e a trabalhista, o Presidente Macron enfrenta uma onda de protestos promovidos pelos coletes amarelos na França e viu sua popularidade despencar para apenas 23%, em contraste com os quase 65% do início de seu mandato, em meados de 2017. O histórico de proteção social francês, ainda herança da Revolução Francesa, faz com que o país enfrente turbulências sempre que tenta alterar as regras que beneficiam alguns privilegiados. Nesse quesito, estamos mais próximos dos franceses do que pensamos.
Semelhanças entre os regimes de Previdência francês e brasileiro
– Vêm passando por tentativas de reformas desde os anos 90
– Ainda necessitam de reformas urgentes
– São regimes extremamente difíceis de serem modificados – devido a grupos organizados contra qualquer tipo de mudança; relação espúria entre popularidade política e reformas; governos inaptos e fragilizados por outras questões… (casos de corrupção)
– Possuem certas “castas” de privilegiados
– Tendem a beneficiar mais a elite dos trabalhadores
O que deveria ser “copiado” das propostas de reformas francesas?
A questão do regime único (ou ao menos algo semelhante). Além de contribuir para a redução do déficit, esse tipo de medida daria maior legitimidade para medidas subsequentes.
* Lucas Adriano é editor do Terraço Econômico & Victor Oliveira é mestrando em Instituições, Organizações e Trabalho (DEP-UFSCar).
Fonte: “Terraço Econômico”, 06/02/2019