Em uma de suas cavalgadas, o incrível barão de Munchausen caiu com sua parelha num pântano. Ao perceber que lentamente submergia e que não havia nada e ninguém que pudesse socorrê-lo, teve a genial ideia de puxar-se pelo próprio cabelo, salvando a si e a sua montaria.
As dificuldades de reformar um sistema político imerso num pântano de corrupção e dominado por quadrilhas e clãs que se apropriam de recursos públicos para se perpetuarem no poder são semelhantes às agruras do barão de Munchausen.
Assim, como sair do atoleiro? Como resgatar a democracia do pântano em que foi metida? A resposta intuitiva é que precisamos contar com um elemento externo à política parlamentar para resgatar a democracia para os cidadãos. A Justiça vem fazendo a sua parte, desestabilizando o que aí está. Isso, porém, não será suficiente. É preciso que a própria política seja capaz de reformar os sistemas eleitoral e partidário, que estão na raiz de práticas predatórias e extrativistas de nossas instituições.
Uma solução, proposta por alguns, seria a convocação de uma constituinte exclusiva, limitada à reforma política, e composta por pessoas que não poderiam, terminado o trabalho, concorrer a cargos públicos. Dessa forma, conseguiríamos a imparcialidade desejável para levar a cabo a necessárias mudanças.
Essa solução, embora sedutora, apresenta uma série de dificuldades. A primeira é que depende da disposição do Congresso para cometer uma espécie de haraquiri político. Em segundo lugar, exige a obtenção de algum consenso sobre regras de convocação e deliberação, o que, no ambiente de profunda divisão que vivemos, também não parece plausível. Por fim, há uma dificuldade adicional. O resultado de uma constituinte exclusiva, descolada das reais forças políticas, por melhor que seja, corre o risco de ser boicotado por aqueles que ficaram de fora, gerando mais instabilidade e oportunismo.
Nesse contexto, o caminho mais prudente ainda parece ser o das reformas incrementais. Se o Supremo, com o auxílio das diversas operações anticorrupção, for capaz de levar a cabo a interdição das lideranças ligadas ao regime de corrupção multipartidária hoje vigente, abre-se espaço para que a sociedade imponha ao Congresso uma agenda básica de reforma, que dê seguimento a mudanças positivas já aprovadas nos últimos anos, como a Lei da Ficha Limpa e a limitação de doações empresariais para campanhas.
Esta agenda mínima, a ser aprovada até outubro de 2017, teria por objetivo a realização de uma eleição mais limpa e representativa em 2018. Seus pontos centrais seriam o fim das coligações e a adoção de uma cláusula de barreira. Com o fim das coligações para eleições parlamentares, reduziríamos esse perverso sistema pelo qual o eleitor vota em um candidato e elege outro, que nem sequer sabe quem é. Com a adoção de uma cláusula de barreira para as eleições congressuais, ao menos em âmbito nacional, seria criado um limite para proliferação disfuncional de partidos, que tem feito da corrupção uma ferramenta de governo.
Pode não ser tão incrível quanto a ideia do barão, mas certamente nos ajudará a começar tirar o pé do pântano.
Fonte: Folha de S.Paulo, 25/06/2016.
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