Muitos anos depois, por conta dos filhos e dos sobrinhos que a vida nos traz, vou a Disney, em Orlando. É uma experiência incrível: o encontro entre as classes C e D dos Estados Unidos e uma massa de estrangeiros.
Dois pontos unem a todos: a magia e a organização do lugar. A cada x minutos, o barquinho do Piratas do Caribe faz o seu passeio desde que eu tinha 15 anos! A Disney e o Brasil também têm pontos em comum: complexidade e encanto. Mas no que tange à organização, vamos muito mal.
Me impressiona andar anos após anos pela Florida Turnpike e o asfalto se manter igual há décadas, sem remendos nem buracos. O mesmo se pode dizer da I-95, outra estrada dos Estados Unidos. Os jardins e canteiros públicos são limpos e bem cuidados, como se fossem novos.
Outro dia, uma diretora de uma multinacional disse que seus diretores norte-americanos não entendem como o Brasil consegue crescer em um ambiente de desorganização, complexidade e imprevisibilidade. Para eles, o melhor dos mundos é aquele onde tudo é organizado, previsível e fácil de ser apreendido. Não é o nosso caso.
Matéria da revista “Piauí” com o cineasta Fernando Meirelles sobre fazer cinema no Brasil e nos Estados Unidos revela exatamente essas diferenças. Cidade de Deus foi produzido à brasileira: um processo conturbado em que o diretor tinha controle absoluto sobre tudo.
Nos Estados Unidos, o diretor é subordinado aos produtores. Meirelles conta que lá você tem de filmar todos os dias e mandar o material para eles (os produtores) opinarem.
A previsibilidade desejada pelos norte-americanos nos sufoca. Somos movidos pela “eventologia”, que significa mirar um objetivo e chegar lá. Sabe Deus como! É o caso do Carnaval, que, em sua aparência caótica, produz ordem, deslumbramento e encantamento. Ainda que por poucas horas.
Seria impossível fazer do Carnaval uma Disney, que abre e fecha apresentando as mesmas coisas a tempo e a hora, anos após ano. Não temos organização para tanto. Nem o Carnaval pode ser escravizado em uma estrutura tão enquadrada.
Curiosamente, o fato de termos a cultura dos eventos pode resultar em sucesso nos megaeventos que se aproximam. Por outro lado, quando a rotina voltar à normalidade, o asfalto continuará esburacado, as praças sujas e os serviços públicos precários.
Após os megaeventos que serão realizados no Brasil, o ideal é que ocorresse a quebra do círculo vicioso em que vivemos: desprezo às rotinas e exaltação aos eventos. O que, na prática, significa que devemos ser mais organizados para podermos elevar a qualidade de nossas rotinas. Sem deixar de lado a espontaneidade e o improviso que permeiam nossas soluções. Não é fácil.
A chave de nosso sucesso como nação vai estar na capacidade de unir improviso, criatividade, rotina, consistência e organização. Será um imenso desafio pois demanda que a motivação esteja muito elevada sempre e que não caiamos na tentação de deixarmos para o amanhã o que podemos fazer bem hoje. Vencida essa barreira cultural, o céu será o limite para o sucesso do Brasil.
Fonte: Brasil Econômico, 18/09/2012
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