O novo governo começa com um diagnóstico preciso do principal problema da economia brasileira: o descalabro fiscal que se implantou no Brasil desde 2008 minou a confiança dos investidores, colocou o país em uma recessão longa e aumentou substancialmente as incertezas quanto a nossa capacidade de crescer no médio prazo. A nova matriz econômica não apenas ignorou completamente a chamada “restrição orçamentária” com a qual todo governo deveria trabalhar, mas foi além. Interferiu até onde pode no livre funcionamento dos mercados, prejudicou a concorrência empresarial, destruiu o ambiente regulatório, criou uma enorme gama de subsídios para setores escolhidos e impostos para setores preteridos, além de isolar o país do resto do mundo em termos econômicos e geopolíticos. Enfim, enterramos o que é mais fundamental para o investimento: a previsibilidade.
Temer assumiu com o discurso da necessidade de reformas que recuperem o crescimento de forma consistente, escolhendo uma equipe econômica que goza da mais alta confiança nos mercados doméstico e externo. No entanto, os economistas estão bastante céticos em relação à capacidade do Brasil de ir além de uma mera recuperação cíclica em 2017. As expectativas do mercado para o PIB do ano que vem estão perto de 1,0%, depois de uma queda acumulada próxima de 7% entre 2015 e 2016. Porém o mais preocupante é que, para os vários anos seguintes, as expectativas estão entre 1,0% e 1,5%. O pessimismo acerca do nosso crescimento de médio prazo tem diversos motivos: fim do “boom” de commodities, má alocação do capital feita nos últimos anos em setores beneficiários das políticas setoriais, alto endividamento dos consumidores e alavancagem das empresas, queda significativa da massa salarial que tende a ter recuperação lenta, ajuste fiscal contracionista que não poderá ser revertido tão cedo, elevada capacidade ociosa da indústria e do setor de serviços e, para completar, um ambiente global de baixíssimo crescimento.
Apesar dos fatores acima serem os mais debatidos, o que mais pesa na baixa expectativa em torno do nosso crescimento potencial é a ausência de uma agenda de reformas microeconômicas.
A ênfase do atual governo no ajuste fiscal está corretíssima no sentido de trazer de volta a confiança na sustentabilidade das contas públicas. Sem tal ajuste, não diminuiremos nosso prêmio de risco, nosso custo de financiamento e não seremos capazes de atrair o investimento. Ficaremos eternamente condenados a discutir o risco de default da dívida doméstica e se estamos ou não em dominância fiscal. Passar dessa página é fundamental para podermos discutir como voltar a crescer e chegar a um nível de renda per capita mais alto.
Encaminhado o ajuste fiscal, precisamos avançar urgentemente em alguns aspectos microeconômicos muito relevantes para o crescimento, como a simplificação tributária, o fortalecimento das agências reguladoras, a flexibilização da legislação trabalhista e a diminuição do processo de judicialização das relações tributárias e trabalhistas. Precisamos urgentemente de um Estado e de um poder Judiciário que atuem de forma mais horizontal e menos intervencionista. O empresário brasileiro, além de se deparar com um custo de capital extremamente alto, possui hoje um risco jurídico enorme decorrente da nossa legislação tributária e trabalhista sem paralelo nos demais países emergentes. Para piorar a situação, o Estado atua de forma excessivamente discricionária na condução dos mais diversos setores.
Reformas no Brasil só são factíveis em momentos de crise aguda. Isso é fato recorrente em nossa história. Mas dessa vez o pessimismo com o médio prazo do Brasil é maior. A lógica é coerente: o fato de o Brasil escapar da bancarrota não significa que podemos voltar ao padrão de crescimento passado quando a China crescia em torno de 10%. Não poupamos quando fomos sorteados na loteria, não investimos em educação e qualificação da nossa mão-de-obra e agora não podemos nem mais contar com o crescimento populacional.
No meio da crise política, conseguimos dar alguns passos relevantes que passaram despercebidos pelos investidores como a aprovação da Lei de Responsabilidade das Estatais, o andamento do projeto do fim da participação obrigatória da Petrobras nas camadas do Pré-Sal e a discussão da governança dos fundos de pensão. Colocamos novamente na pauta as privatizações e já estamos testando o apetite de estrangeiros por várias empresas estatais.
É certo que o trabalho da nova equipe econômica é árduo e difícil, pois exige mudar direitos constitucionais e reduzir benefícios sociais. Mais difícil ainda é fazer isso em um governo novo que não foi recém-eleito e que não conta com a aprovação popular na sua largada. Mais difícil ainda é fazer isso em um ano de eleições municipais, tendo em vista também que a corrida pelas eleições presidenciais irá começar no ano que vem. Mais difícil ainda é conseguir apoio político em meio a revelações de novos implicados nos escândalos de corrupção. Só não podemos perder de vista que o estrago feito nos últimos anos é extremamente grande, tornando o começo do rearranjo bastante atrativo e que a história do Brasil é repleta de alguns avanços importantes após retrocessos gigantescos.
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