Parlamentares governistas e de oposição fizeram andar no Congresso projetos que pressionam integrantes do Tribunal de Contas da União (TCU) às vésperas do julgamento das contas da presidente Dilma Rousseff. Desde o mês passado, voltaram à pauta de comissões da Câmara propostas que encurtam a permanência de ministros da corte nos cargos e a obrigam a abrir sua administração para fiscalização do Legislativo e do próprio governo. No Senado, o presidente Renan Calheiros (PMDB-AL) quer criar uma “autoridade fiscal” com atribuições semelhantes às do tribunal.
O TCU monitora a tramitação dos projetos, que constam em uma lista de 61 que têm impacto no seu funcionamento. Na semana passada, o tema foi tratado pelos ministros em reunião fechada e tem sido fonte de preocupação. A avaliação interna é que “essa movimentação repentina” das propostas “sugere que é para pressionar” a corte.
O TCU apontou no mês passado distorções de R$ 281 bilhões no Balanço Geral da União de 2014 e fixou prazo de 30 dias para a presidente apresentar defesa sobre 13 irregularidades, entre as quais as chamadas “pedaladas fiscais”. Com base nas explicações, o tribunal dará, possivelmente em agosto, parecer para embasar julgamento do Congresso sobre as contas. Os ministros podem recomendar que sejam rejeitadas, aprovadas ou se abster de uma opinião.
A oposição e setores da base aliada em conflito com o governo tentam influenciar os ministros a optar pela reprovação, o que abriria caminho para pedir o impeachment de Dilma por suposto crime de responsabilidade. O Palácio do Planalto, por sua vez, faz lobby em contrário e tenta evitar que um parecer adverso da corte chegue ao Congresso.
Fiscalização
Na Câmara dos Deputados, a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle incluiu na pauta de votação desde 17 de junho – dia em que o TCU abriu o prazo para Dilma responder – proposta que abre uma fiscalização “contábil, financeira, orçamentária e operacional” do Congresso sobre a área administrativa da corte.
O projeto original, do deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), põe o próprio governo, por meio da Controladoria-Geral da União (CGU), como auxiliar do Legislativo na tarefa de fazer o pente-fino. “O TCU chega na Câmara e dá todo tipo de pitaco. Acho estranho não querer ser fiscalizado. Nenhum órgão é soberano, acima do bem e do mal”, justifica o deputado.
A proposta foi apresentada em 2013 e, de lá para cá, tramitava em “banho-maria”. Na semana anterior ao julgamento no TCU, ela recebeu parecer favorável do deputado Hissa Abrahão (PPS-AM), da oposição. O presidente da comissão, Vicente Cândido (PT-SP), já o incluiu duas vezes na pauta, mas o colegiado recuou diante dos pedidos de integrantes do tribunal e de divergências na própria comissão sobre o texto a ser adotado.
O TCU faz auditorias em órgãos do governo, entre eles a própria Controladoria-Geral da União. Um dos principais problemas, para integrantes da corte, é que o projeto inverteria papéis, colocando um ente fiscalizado pelo tribunal para fiscalizá-lo. A CGU é um órgão de controle interno do governo e não tem, por lei, competência para inspecionar o tribunal, um órgão auxiliar do Legislativo.
No último dia 1.º, a proposta quase foi votada, mas, a pedido do TCU, o deputado Edinho Bez (PMDB-SC) pediu vista e apresentou um parecer em separado, que exclui a possibilidade de a CGU participar. Diante da polêmica, o relator também recuou e protocolou, na sexta-feira passada, um relatório com a mesma alteração. Vicente Cândido avisa que o projeto voltará à pauta no mês que vem, quando o TCU prevê julgar as contas de Dilma. “Vamos dizer que é uma coincidência. Não vejo nenhuma retaliação”, alega.
Reformulação
Ainda na Câmara, na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ), uma Proposta de Emenda à Constituição sugere uma ampla reformulação do TCU. Um dos artigos prevê que ministros da corte, que hoje ficam no cargo da nomeação até a aposentadoria compulsória, aos 75 anos, tenham mandato de três anos.
O texto foi apresentado em 2007 pela deputada Alice Portugal (PC do B-BA), foi arquivado no início do ano e desarquivado em seguida. Em 16 de junho, véspera da sessão no TCU que julgaria as contas do governo, ganhou parecer pela admissibilidade – o que significa que não fere aspectos da Constituição e está apto a tramitar nas demais comissões.
O relatório foi do deputado Veneziano do Rêgo (PMDB-PB), irmão do ministro do TCU Vital do Rêgo. O gabinete do deputado explica que o relatório não aborda o mérito da proposta, por não ser atribuição da CCJ, e que o peemedebista é até contra as alterações sugeridas.
Integrantes da oposição se mobilizam também para desenterrar uma proposta que pune o presidente do TCU por crime de responsabilidade se ele deixar de processar e julgar infração cometida por prefeitos. Em geral, presidente do TCU não relata nem julga. Em casos específicos, ele vota quando é necessário o desempate.
No Senado, Renan apresentou no fim de junho, dias após o início do julgamento no TCU, proposta para criar uma “autoridade independente” a fim de monitorar, avaliar e fazer alertas sobre a política fiscal do governo. O tribunal, no entanto, já faz trabalho semelhante.
Para integrantes da corte, trata-se de um órgão concorrente. Além disso, argumentam, o texto não deixa claro como será constituído seu corpo técnico, que estará sob o comando de um diretor escolhido, em lista tríplice, pelo presidente do Senado.
Renan diz que a ideia é “aprimorar os mecanismos de avaliação e controle da política fiscal”, em favor do “crescimento econômico”. Segundo sua assessoria, não há conflito com as atividades do TCU, pois o novo órgão não aplicará sanções nem terá função no julgamento das contas do governo.
Fonte: Estadão.
No Comment! Be the first one.