O ministro Joaquim Levy tem capitaneado um forte ajuste fiscal. Os números demorarão alguns trimestres para melhorar, mas melhorarão. Tema que tem sido debatido é se o ajuste fiscal brasileiro agravará a recessão. Não seria melhor fazer política anticíclica, como em 2009? Infelizmente, não podemos fazer política anticíclica. Não há espaço fiscal para isso. Felizmente, ela não é indicada para a situação corrente. A fortíssima desaceleração da economia, desde o pico, em 2010, de 7,6%, até o péssimo resultado de 0,1%, no ano passado, ocorreu com a demanda agregada, a soma do consumo com o investimento público e privado, com exceção do último trimestre de 2014, sempre crescendo além da oferta agregada.
Ou seja, a desaceleração da economia não foi produto de uma política de contenção da demanda agregada com vistas, por exemplo, ao combate da inflação. Pelo contrário. Ao longo desse período, a inflação elevou-se. Houve uma profunda desorganização da oferta, em parte em razão do choque climático, mas, principalmente, por causa dos efeitos desastrosos da nova matriz econômica, regime que vigorou entre 2009 e 2014, sobre o funcionamento da economia.
A retração da oferta em razão da perda de eficiência da economia resultou no freio do crescimento em conjunto da pressão inflacionária. Na atual situação, a política fiscal contracionista deve em curto intervalo de tempo ter efeitos expansionistas. A queda da demanda promovida pela redução do impulso fiscal abrirá espaço para rápida redução dos juros reais. Essa queda dos juros, por sua vez, promoverá a elevação da demanda privada, compensando a desaceleração do gasto público.
Evidentemente o efeito líquido de todos esses movimentos tem que ser na direção de reduzir a demanda, pois temos que trazer a inflação para a meta. O ponto a reter é que todos os analistas que avaliam os efeitos da política fiscal contracionista em curso no Brasil a partir dos efeitos dessas políticas na Europa e nos EUA entre 2011 e 2014 erram ao não considerar que as circunstâncias são totalmente diversas. Aqui temos juros elevados e inflação idem; lá temos juros nulos e inflação idem. Há inúmeros trabalhos que mostram que os impactos contracionistas ou expansionistas de uma contração fiscal dependem do regime de funcionamento da economia, isto é, se há ou não carência estrutural de demanda agregada. No nosso caso, além das evidências de excesso de demanda agregada, há um segundo motivo para acreditarmos que a contração fiscal será expansionista.
A elevação do superavit primário, ao eliminar a expectativa de perda de grau de investimento, terá forte impacto sobre as expectativas e assim alavancará um novo ciclo de investimento. Estamos pagando o preço de seis anos de uma política econômica que foi desastrosa. É importante que a sociedade consiga atribuir corretamente as responsabilidades. As dificuldades que enfrentaremos nos próximos dois ou três anos devem ser colocadas na conta da nova matriz econômica, e não de Levy.
Fonte: Folha de São Paulo, 2/5/2015
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