Em novembro de 2013, o governo federal leiloou o Aeroporto de Confins, na região metropolitana de Belo Horizonte. A licitação foi vencida pelo consórcio formado pela Zurich Airport e a CCR, que ficaram com 51% de participação no projeto. Os demais 49% pertencem à estatal Infraero. Pretendia-se transformar Confins num aeroporto de grande porte, ampliando significativamente a conectividade de BH.
Para surpresa dos sócios privados do BH Airport, no início deste ano a Infraero solicitou à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que o Aeroporto da Pampulha voltasse a receber jatos comerciais de grande porte. Desde 2007, esse aeroporto só recebe aviação executiva e regional, com jatos para até 70 lugares. A Infraero, que administra o Aeroporto da Pampulha, pretendia, com a liberação, reverter os prejuízos que vinha obtendo naquele aeródromo, especialmente após a Azul transferir seus voos regionais para Confins.
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A Anac autorizou o pedido, mas portaria assinada pelo ministro dos Transportes em 11/5, com base em parecer técnico da Secretaria de Aviação Civil (SAC), manteve o aeroporto restrito a voos regionais. Agora, em novembro, o Ministério dos Transportes voltou atrás e revogou a portaria de maio, autorizando a Pampulha a receber voos comerciais de grande porte. Diante da liberação, Gol, Azul, Avianca e Latam solicitaram dezenas de voos partindo da Pampulha. A expectativa é de que já em 2018 se amplie em mais de 2 milhões o número de passageiros que utilizam o terminal. Como Confins e Pampulha concorrem praticamente pelo mesmo público, Confins deve perder 2 milhões (ou ainda mais) de passageiros, cerca de 20% de seu fluxo.
A nota da SAC adverte que a volta dos voos comerciais de grande porte para a Pampulha é um erro. BH, ao contrário de Rio e São Paulo, não tem escala para dois aeroportos de grande porte. Confins se credenciou como o segundo hub da Azul, porque há passageiros de voos diretos em número suficiente para garantir a ocupação daqueles que utilizam o voo para conexão. Por exemplo, num voo Brasília-BH com 100 passageiros, 50 poderiam ter BH como destino final e os demais utilizariam Confins como conexão para outros destinos. Sem esses 50 que iriam para BH (pois vão preferir voar diretamente para a Pampulha), o voo para Confins deixa de ser viável.
O resultado final será a queda na oferta de voos, aumento nos preços e menor conectividade. Minas também perde por deixar de contar com um aeroporto de primeira linha. E, paradoxalmente, perde a Infraero, pois, no melhor estilo estatal, a receita adicional gerada pela Pampulha tenderá a ser absorvida com pessoal e outras despesas, não compensando a perda de rentabilidade em Confins (onde detém 49% do capital).
No curto prazo, contudo, o maior prejudicado é a concessionária. Quando o aeroporto foi arrematado no leilão, com base numa determinada expectativa de demanda, ela pagou R$ 1,8 bilhão pelo direito de outorga, valor 66% acima do lance mínimo. Também com base nessa estimativa foram investidos cerca de R$ 750 milhões para a construção de um terminal. Com a transferência de voos para a Pampulha, a queda no faturamento seria brutal: reduziria a receita com taxas de embarque, taxas de pouso e decolagem, aluguéis, estacionamento, etc. O resultado será o desbalanceamento da equação financeira do projeto.
Trata-se, pois, de clara situação que requer o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Mas, infelizmente, as agências de regulação têm se mostrado refratárias a isso, a exemplo da ANTT em relação às concessões de rodovias de 2013. Provavelmente, esse imbróglio será judicializado, havendo risco de devolução da concessão. No longo prazo, contudo, a consequência mais grave será afugentar investidores. Afinal, quem desejará investir numa concessão sabendo que o sócio estatal age para afundar o projeto e, mais grave, a Anac toma decisões que deterioram significativamente sua equação financeira? Quando será que nossos governantes entenderão que investimento em infraestrutura requer estabilidade de regras e respeito aos contratos?
Fonte: “O Estado de S. Paulo”, 09/11/2017.
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