Em poucos países do mundo economistas são tão criativos como no Brasil. Por isso mesmo, talvez, sejamos especialmente incompetentes na gestão econômica. Quem acompanha nossa história assistiu a sucessivos experimentos de laboratório destinados a controlar as principais variáveis econômicas: fórmulas matemáticas para as correções monetária, cambial e de salários, prefixação das variações do câmbio e da correção monetária, congelamento de preços e “tablitas”, sequestro da poupança, bandas cambiais e sua forma suprema de pajelança: a banda diagonal endógena, a “nova matriz econômica”, de Mantega e Rousseff etc. etc.
[su_quote]O encaminhamento de soluções deve ser conduzido por um governo dotado de plena legitimidade e apoio popular[/su_quote]
A exitosa criação da URV (inspirada no rentenmark alemão e adaptada por Gustavo Franco), que viabilizou o Plano Real, fica como a exceção que confirma a regra.
Na área microeconômica também não ficamos muito atrás na coleção de barbeiragens. Os exemplos maiores estão no estrago recente causado em todo o setor de petróleo e energia pelas políticas implementadas por nossos últimos governantes e na nunca esquecida “reserva de mercado para a informática”, do governo Geisel.
Agora, o tema da moda é a dominância fiscal, que ocorre quando a dívida pública atinge uma dinâmica tão perversa que passa a atar as mãos do Banco Central na manipulação dos juros para o combate à inflação. Afinal, juros altos são despesa para o governo e agravam o quadro para a evolução do déficit e da dívida pública.
Pois bem, constatado que estamos sofrendo de “dominância fiscal”, nossos economistas começam a exercitar a profícua criatividade que os caracteriza. Reinstalação de bandas cambiais, afrouxamento das metas inflacionárias, redução dos juros “na marra” conjugada a restrições nos fluxos financeiros etc. voltam a frequentar nossos laboratórios, em total descompasso com o enfrentamento das causas reais e primárias de nossos problemas.
Precisamos deixar de lado os expedientes e passar a focar na situação crítica do Estado, este sim um ente que, descontrolado, é a razão de nossos males maiores. Nada do que se cogita nos gabinetes será solução se o governo não conseguir passar para a sociedade confiança em instituições sólidas e num quadro dinâmico de estabilidade fiscal.
É certo que o encaminhamento de soluções deve ser conduzido por um governo dotado de plena legitimidade e apoio popular, o que talvez não tenhamos, no momento. Mas as discussões devem focar na limitação legal das despesas e do endividamento público. E numa reforma drástica da Previdência. Pois é no controle do Estado, e não no controle dos mercados, que encontraremos o caminho para o progresso sustentável.
Fonte: O Globo, 18/10/2015.
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